Cada mestre, guru ou líder religioso, ou mesmo político, conquista seu público com uma proposta de mudanças. Principalmente se essas mudanças vierem acompanhadas de uma nova perspectiva de vida. Assim também a fé cristã, que tem em seu bojo uma dessas promessas, quiçá a mais audaciosa de todas que a história humana já ouviu da boca de um semelhante, ou seja: a vida eterna.
Dá para imaginar o alvoroço que essas promessas causaram. Seu público começou a se dissolver exatamente nesse momento. “Essa palavra é dura. Quem consegue escutá-la?”, foi a primeira reação de seus ouvintes, que, murmurando entre si, afastaram-se um a um.
Nisso resulta nosso demasiado apego à vida, à realidade que nos cerca. Nossos olhos carnais e nossa sensibilidade animal nos impedem de enxergar a realidade da vida espiritual, aquela da qual viemos e para a qual retornaremos purificados e agraciados pelo dom da vida, da vida em plenitude. Esse é o centro dos ensinamentos de Cristo, cuja missão foi exatamente a de nos abrir os olhos para nossa realidade espiritual. “O Espírito é que dá a vida, a carne não adianta nada. As palavras que vos falei são espírito e vida” (Jo 6,63).
Naquela debandada geral sobraram os doze, ainda inseguros mas esperançosos de algo mais, um esclarecimento maior, uma palavra que lhes devolvesse a certeza do caminho a seguir. Jesus percebe esse momento de dúvida e os deixa livres. “Vós também vos quereis ir embora?”. A reação foi de um silêncio geral, como se os passos daqueles que deram as costas ao mestre nazareno fosse a atitude mais razoável no momento. Então Pedro, o mais velho do grupo, o que não tinha muito a perder, responde por todos: “A quem iremos, Senhor, se só tu tens palavras de vida eterna”. Perdido por perdido, ficaremos aqui mesmo; poderíamos assim entender… Mas não. A resposta de Pedro foi muito além da expectativa dos doze, pois tornou-se uma profissão de fé, uma proclamação clara e suscinta da verdade messiânica presente na pessoa de Jesus, “o santo de Deus”.
Doravante, a pergunta é nossa. A quem iremos, se só Jesus fala de eternidade? O princípio basilar de uma fé genuína, autêntica, que supera toda e qualquer esperança da falácia de vida que aqui experimentamos, tem que ir além dessa vida transitória, sem maiores perspectivas. Não há melhor referência neste mundo factível, falível, cujo ponto final é a dissolução de tudo que aqui conquistamos, amealhamos com muito trabalho ou expertise, para não dizer malandragem. A quem iremos? A porta estreita é passagem dos fracos, dos pequenos, dos famintos… por um mundo melhor. Eis a chave: “Ninguém vai ao Pai senão por mim”! “Eu sou a porta”! Abrir essa porta é vislumbrar um mundo novo, – uma nova Canaã como vislumbrou Moisés no topo do monte Nebo, mas não conquistou nesta vida. Ou seja, plenitude de vida, de eternidade na conquista que sonhamos, não acaba na contemplação de uma promessa apenas, uma ilusão deste mundo, mas no esforço dispensado para merecê-la um dia, em sua plenitude. Verdade! Moisés não tomou posse da Terra Prometida, mas seu povo testemunhou essa vitória ao longo de sua história. Também nós, herdeiros da Promessa, haveremos de ultrapassar os umbrais dessa vida com a certeza de que só Jesus é o próprio Pão da Vida, fonte da Eternidade que ainda sonhamos merecer. Só Ele faz de suas palavras uma promessa de vida Eterna. De plenitude.