Vatican News
“Boa noite e muito obrigado por esta experiência. Hoje, há um aniversário. Parabéns, depois chegará o bolo!”
Essas foram as primeiras palavras dirigidas aos jornalistas presentes no voo papal de regresso a Roma na tradicional coletiva de imprensa no avião. O aniversário anunciado pelo Pontífice era o de Rita Cruz.
A primeira pergunta foi feita pela veterana das viagens pontifícias, Aura Miguel, da Rádio Renascença.
Santidade, antes de tudo obrigado por sua visita a Portugal. Todos já a consideravam um sucesso. Todos muito contentes. Obrigado por ter vindo. Encontrei um alto chefe da polícia, que me disse que nunca tinha visto uma multidão assim obediente e pacífica. Foi belíssimo. A minha pergunta diz respeito a Fátima. Nós sabemos que o senhor foi ali e rezou em silêncio na capelinha. Porém, havia uma grande expectativa, no local justamente onde Nossa Senhora fez um pedido para rezar pelo fim da guerra (e estamos em guerra neste momento infelizmente) de uma renovação da parte do Santo Padre, publicamente, de uma oração pela paz. Os olhos de tudo o mundo estavam fixados sobre o senhor ontem pela manhã, em Fátima. Por que não o fez?
Rezei, rezei. Rezei a Nossa Senhora e rezei pela paz. Não fiz propaganda. Mas rezei. E devemos continuamente repetir esta oração pela paz. Ela, na Primeira Guerra Mundial, tinha pedido isto. E eu, desta vez, isto pedi a Nossa Senhora. Rezei. Não fiz publicidade.
Pergunta 2 – Joao Francesco Gomez – Observador
Em fevereiro deste ano, foi publicado um relatório sobre a realidade dos abusos em Portugal, quase 5000 crianças foram vítimas nas últimas décadas. E eu pergunto: o senhor foi informado sobre este relatório entregue aos bispos? Que pensa deveria acontecer com os bispos que sabiam dos casos de abusos e não os comunicaram às autoridades?
Como sabem, de modo muito reservado, recebi um grupo de pessoas que foram abusas. Como sempre faço nesses casos, dialogamos sobre esta peste, esta peste terrível. Na Igreja, se seguia mais ou menos a mesma conduta que se segue atualmente nas famílias e nos bairros…se encobre. Pensemos que 42 % dos abusos acontecem nas famílias ou nos bairros. Ainda devemos amadurecer e ajudar a descobrir essas coisas. Desde o escândalo de Boston, a Igreja se conscientizou que não podia seguir caminhos aleatórios, mas se deveria segurar o “touro pelo chifre”. Dois anos e meio atrás, houve uma reunião dos presidentes das Conferências Episcopais, onde foram fornecidas também estatísticas oficiais sobre os abusos. E é grave, a situação é muito grave. Na Igrrja, há uma frase que estamos usando continuamente: tolerância zero, tolerância zero. E os pastores, que de alguma maneira não assumiram sua responsabilidade, devem arcar com esta irresponsabilidade. O mundo dos abusos é muito duro e, por isto, exorto a serem muito abertos sobre tudo isso. O que me perguntaram como está indo o processo na Igreja portuguesa, está indo bem. Está indo bem e com serenidade se busca a seriedade nos casos de abusos. Os números, às vezes, se revelam exagerados, um pouco pelos comentários que sempre gostamos de fazer, mas a realidade é que está indo bem e isto me dá certa tranquilidade. Gostaria de tocar em um ponto e gostaria de pedir a colaboração de vocês, jornalistas. Vocês têm um telefone hoje? Um telefone. Bem, em qualquer um desses telefones, a pagamento ou com uma senha, se tem acesso a abuso sexual contra menore. Isso entra em nossas casas e o abuso sexual contra menores é filmado ao vivo. Onde é filmado? Quem são os responsáveis? Esta é uma das pragas mais graves, ao lado de todo o mundo (…) mas quero sublinhar isso porque, às vezes, não nos damos conta de que as coisas são assim tão radicais. Quando se usa uma criança para fazer espetáculo de um abuso, se chama a atenção. O abuso é como “comer” a vítima, né?, ou pior, machucá-la e deixá-la viva. Conversar com pessoas abusadas é uma experiência muito dolorosa, o que também me faz bem, não porque em agrada ouvir, mas porque me ajuda a assumir esse drama. Ou seja, para a sua pergunta eu diria o que eu disse: o processo está andando bem, estou informado de como estão as coisas. As notícias podem ter ampliado a situação, mas as coisas estão andando bem a esse respeito. Mas também, com isso, digo a vocês, de alguma forma, ajudem, ajudem para que todos os tipos de abusos possam ser resolvidos, o abuso sexual, mas não é o único. Existem também outros tipos de abuso que clamam aos céus: o abuso do trabalho infantil, o abuso do trabalho com crianças e é usado; o abuso das mulheres, certo? Ainda hoje, em muitos países, fazem-se cirurgias nas meninas: retira-se-lhes o clitóris, e isto é hoje, e faz-se com uma navalha, e adeus… Crueldade… E o abuso do trabalho, isto é, dentro do abuso sexual, que é grave, e tudo isso: existe uma cultura do abuso que a humanidade deve rever e converter.
Pergunta 3 – Jean-Marie Guénois – LE FIGARO
Santo Padre, como está a sua saúde, como prossegue a convalescência? O senhor não leu ou leu somente pequenos trechos de cinco discursos. É sem precedentes nas viagens: por quê? Teve problema nos olhos, cansaço? Textos demasiados longos? Como se sente? E se me permite uma pequena pergunta sobre a França. O senhor irá a Marselha, mas nunca visita a França. A população não entende, talvez muito pequena ou o senhor tem algo contra a França?
A minha saúde vai bem. Os pontos foram tirados, levo uma vida normal, uso uma faixa por dois ou três meses para evitar uma (…incompreensível..) até que os músculos estarão mais fortes. A vista. Naquela paróquia, cortei o discurso porque havia uma luz na frente e não conseguia ler, vinha a luz e por isso cortei. Algumas pessoas, através do Matteo, perguntaram por que eu abreviei as homilias que vocês têm. Quando falo, não as homilias acadêmicas, busco fazê-lo de maneira mais clara. Quando falo, sempre busco a comunicação. Vocês viram que mesmo na homilia acadêmica, alguma brincadeira, alguma risada faço para controlar a comunicação. Com os jovens, os discursos longos tinham o essencial da mensagem, o essencial da mensagem, e eu agia ali segundo sentia a comunicação. Vocês viram que fiz algumas perguntas e logo o eco me indicava para onde ia a coisa, se estava errado ou não. Os jovens não mantêm muito tempo de atenção. Imagine que se você faz um discurso claro com uma ideia, uma imagem, um afeto, podem acompanhar por oito minutos. Entre parêntesis, na Evangelii Gaudium, a primeira exortação que fiz, escrevi um longo, longo capítulo sobre a homilia. Porque aqui está um pároco (referindo-se ao Pe. Benito Giorgetta, pároco de Termoli, ndr), que sabe que as homilias às vezes são uma tortura, uma tortura, que falam blá, bl[a, e as pessoas… Em alguma cidadezinha, não sei se em Termoli, os homens saem para fumar e voltam. A Igreja deve se converter neste aspecto da homilia: breve, clara, com uma mensagem clara e afetuosa. Por isso, eu controlo como vai com os jovens e os faço dizer. Mas eu abreviei porque me interessa a ideia com os jovens. E passemos à França. Fui a Estrasburgo, irei a Marselha, mas na França não. Há um problema que me preocupa, que é o problema Mediterrâneo. Por isso, vou à França. É criminoso a exploração dos migrantes. Aqui na Europa não, porque somos mais cultos, mas nos lager do norte da África… eu recomendo uma leitura. Há um pequeno livro, pequeno, que escreveu um migrante que para ir da Guiné à Espanha levou creio três anos porque foi capturado, torturado, escravizado. Os migrantes naqueles lagers do norte: é terrível. Neste momento – semana passada – a associação Mediterranea Saving Human estava fazendo um trabalho para resgatar os migrantes que estavam no deserto entre a Tunísia e a Líbia, porque os haviam abandonado ali para morrer. Aquele livro de chama “Hermanito” – em italiano “Fratellino” (Irmãozinho) – mas se lê em duas horas, vale a pena. Leiam e verão o drama dos migrantes ao se aventurarem. Os bispos do Mediterrâneo farão este encontro, também com algum político, para refletir seriamente sobre o drama dos migrantes. O Mediterrâneo é um cemitério, mas não é o maior cemitério. O maior cemitério é o norte da África. É terrível isto, leiam. Vou a Marselha por isto. Na semana passada, o presidente Macron disse que tem intenção de ir a Marselha e estarei ali um dia e meio: chegarei à tarde e terei o dia seguinte inteiro.
(O senhor não tem nada contra a França – afirma Matteo Bruni, repetindo a pergunta):
Não. Não, a respeito disto é uma política. Estou visitando os pequenos países europeus. Os grandes países, Espanha, França, Inglaterra, deixo para depois, no final. Mas como opção comecei pela Albânia e assim os menores. Não há nada. A França, duas cidades: Estrasburgo e Marselha.
Pergunta 4 – Emma Elisabeth Hirschbeck – ARD ROMA
O Santo Padre em Lisboa disse-nos que na Igreja há lugar para todos, todos, todos. A Igreja está aberta a todos, mas ao mesmo tempo nem todos têm os mesmos direitos, oportunidades, no sentido de que, por exemplo, mulheres e homossexuais não podem receber todos os sacramentos. Santo Padre, como explica esta incoerência entre uma Igreja aberta e uma Igreja que não é igual para todos? Obrigada.
Você me faz uma pergunta sobre dois pontos de vista diferentes. A Igreja é aberta a todos, depois existem leis que regulam a vida dentro da Igreja. Alguém que está dentro está de acordo com a legislação, o que você diz é uma simplificação: “Não pode receber os sacramentos”. Isso não significa que a Igreja seja fechada, cada um encontra Deus pelo próprio caminho dentro da Igreja, e a Igreja é mãe e guia cada um pelo seu caminho. Por isso não gosto de dizer: venham todos, mas tu, este, mas o outro… Todos, cada um na oração, no diálogo interior, no diálogo pastoral, procura uma forma de seguir em frente. Para isso, fazer uma pergunta: por que os homossexuais não… Todos! E o Senhor é claro: doentes. Saudáveis, velhos e jovens, feios e bonitos… bons e maus! Há como um olhar que não entende essa inserção da Igreja como mãe e pensa nela como uma espécie de empresa que para entrar tem que fazer isso, fazer desta forma e não de outra… Outra coisa é a ministerialidade da Igreja, que é o modo para levar em frente o rebanho e uma das coisas importantes é a paciência, na ministerialidade: acompanhar as pessoas passo a passo em seu caminho de amadurecimento. Cada um de nós tem esta experiência: que a Igreja mãe nos acompanhou e nos acompanha no seu próprio caminho de amadurecimento. Não gosto da redução, isso não é eclesial, isso é gnóstico. É como uma heresia gnóstica que está um pouco na moda hoje. Um certo gnosticismo que reduz a realidade eclesial e isso não ajuda. A Igreja é mãe, acolhe todos, e cada um faz o próprio caminho dentro da igreja, sem publicidade, e isso é muito importante. Obrigado pela coragem de fazer esta pergunta. Obrigado.
O Papa deseja compartilhar uma opinião sobre a JMJ, fala Matteo Bruni, diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé
Como vivi a JMJ. Esta é a quarta que vivo. A primeira foi no Rio de Janeiro, que era monumental, a la brasileña, bela. A segunda em Cracóvia, a terceira no Panamá, esta é a quarta. Esta é a mais numerosa. Os dados concretos, verdadeiros, eram mais de um milhão. Antes ainda, na vigília à noite calculava-se um milhão e quatrocentos e um milhões e seiscentos mil. Impressionante a quantidade. Bem preparada! Esta é aquela que eu vi melhor preparada.
E os jovens são uma surpresa. Os jovens são jovens. Aprontam, a vida é assim. Mas procuram seguir em frente. E eles são o futuro. A questão é acompanhá-los. O problema é saber acompanhar. E é que não se separem das raízes. Por isso insisto tanto no diálogo entre velhos e jovens, os avós com os netos. Esse diálogo é importante, mais importante do que o diálogo entre pais e filhos. Os avós, as raízes. Depois, os jovens são religiosos, eles buscam fé, não artificial. …eles procuram um encontro com Jesus e issso não é fácil… Alguns dizem, mas os jovens nem sempre seguem uma vida segundo a moral. Mas quem de nós não cometeu um erro moral na própria vida? Todos! Com qualquer dos mandamentos. Cada um de nós tem as próprias quedas na própria história. A vida é assim. Mas o Senhor sempre nos espera porque é misericordioso , é pai. E a misericórdia supera tudo……Isso queria dizer sobre a JMJ.
Pergunta 6 – Justin Scott Clellan – CNS
Falando de JMJ. Ouvimos nestes dias talguns estemunhos de jovens que lutaram pela saúde mental, com a depressão. O senhor já lutou com isso? E se alguém decidir cometer suicídio, o que diria à família dessa pessoa que sofre com o ensinamento católico sobre o suicídio, pensando que tenha ido para o inferno?
Hoje o suicídio juvenil é importante, importante em número. A mídia não fala tanto, porque não é informado às mídias. Fiquei – não a confissão, não – em diálogo com os jovens, porque aproveitei para dialogar. Um bravo jovem me disse: posso lhe fazer uma pergunta? O que o senhor pensa sobre o suicídio? Ele não falava a nossa língua, mas eu entendi bem e começamos a conversar sobre o suicídio. E no final ele me disse: obrigado, porque ano passado estava indeciso se cometia ou não. Tantos jovens angustiados, deprimidos, mas não só psicologicamente… depois em alguns países que são muito, muito exigentes na universidade, os jovens que não conseguem se formar ou encontrar aquele trabalho se suicidam, porque sentem uma vergonha muito grande. Não digo que seja uma coisa de todos os dias, mas é um problema, um problema atual, uma coisa que acontece.
Bruni: Obrigado Sua Santidade por suas respostas
O Papa: obrigado a vocês pelo que fizeram e não se esqueças hein… ‘Hermanito’, ‘Fratellino’, o livro do migrante. Obrigado!