O milagre da transformação

    Um dos anseios mais perseguidos pelo gênero humano é seu desejo de transformação. Transformação não somente da matéria, dos recursos que a natureza lhe dá, dos bens de consumo – a arte, o trabalho -, dos sabores que o alimentam – os prazeres da culinária -, das invenções que lhe facilitam a vida, como também as transformações que se processam em seu estado de espírito, personalidade e qualquer sentimento, desde o ódio até sua capacidade de amar. Tudo o que nossas mãos e nossas mentes tocam ou visualizam, submetem-se à nossa capacidade de transformação. Mas como transformar água em vinho, vinho em sangue, pão em carne? Isso só Jesus foi capaz.
    Mais que simples transformação, esse milagre ganhou uma dimensão maior, uma denominação única, diferencial acima dum simples milagre: transubstanciação. Só a este milagre se encaixa tão estranho substantivo. Ou seja: fez do vinho e do pão seu próprio corpo, sua pessoa viva, visível pela fé, invisível aos olhos. Transformou-se por inteiro, corpo e alma, matéria e espírito. Deu-se como alimento, o maior, o mais substancial, completo, essencial à vida plena, à saúde humana. “Coragem, sou eu!”. “Eu sou Aquele que é”. “Isto sou eu, meu corpo, meu sangue”. “Eu sou o pão vivo que desceu do céu”. “Vinde a mim, vós todos que estais aflitos…” “Eu sou a verdadeira videira…”. “Quem comer a minha carne e beber o meu sangue, terá a vida eterna”. Em síntese, ao se dar como alimento, Jesus complementa sua missão terrena, se dá por inteiro, corpo e alma. O mistério da presença Eucarística é o que define o Amor pleno, sem limites, sem as amarras da finitude humana. Ele permanece entre nós, em nós, através dessa nova aliança divina. “Eu lhes digo: de hoje em diante não beberei desse fruto da videira, até o dia em que, com vocês, beberei o vinho novo no reino do meu Pai” (Mt 26, 29). Enquanto isso, fartemos nossas almas e brindemos nossas vidas com o cálice da redenção e o pão da vida que só a mesa eucarística pode nos oferecer.
    A presença eucarística de Jesus é o grande mistério da fé católica. É seu centro, sua razão de ser. Tanto que a Santa Missa não pode nunca ser considerada uma reunião apenas, um culto puro e simples, mas sim a repetição daquela misteriosa ceia pascal, transformada por Jesus em celebração de sua memória. Tanto que (aqui repito a fala de um sacerdote amigo) missa sem comunhão “é banho sem sabão”. Não resolve, não purifica, não refrigera a alma, não dessedenta o coração… Mesmo assim, é preciso respeito às regras. Comunhão não é um simples ritual, gesto mecânico, impensado, irrefletido, de alguém que toma a hóstia, bebe o vinho, mas não está em comunhão com Deus. Incorre num erro maior. Profana o que lhe parece sagrado.
    É preciso melhor discernir e tomar para si a afirmativa de Zaqueu ao descer de seu pedestal (a árvore que lhe dava a visão de tudo, menos de sua indignidade). “Senhor eu não sou digno que entreis em minha casa”. Assim pensando, todos deixaríamos de participar dessa mesa. Mas um mínimo de carência humana nos coloca na fila do banquete. O que mais nos purifica é a “comunhão”. De espírito, de concordância, de abnegação, de renúncia, de desejo… Sim, até por uma situação contraditória. Mas no coração misericordioso do Pai há espaço também para os últimos, aqueles que se reconhecem indignos. A esses a comunhão do desejo os torna dignos de participação, reserva a mais pura das comunhões. Na mesa de Cristo cabem todos. Até eu. Até você!

     

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