Na bonita e frutuosa convivência de Bispos que temos todos os anos no “Curso para Bispos” aqui no Rio de Janeiro, no Centro de Estudos e Formação do Sumaré, sempre é um bom momento para refletirmos sobre a nossa missão enquanto aprofundamos alguns assuntos ligados ao Concílio Vaticano II, que completa o seu jubileu de ouro. As reflexões sobre os documentos “Inter Mirifica”, “Nostra Aetate” e “Dignitatis humanae” foram importantes nessa conclusão da comemoração do Concílio. Nestes últimos 5 anos tivemos a oportunidade de aprofundar os temas dos documentos conciliares. É um desafio para nós, Bispos, nesse tempo de tantas contestações, violências, decadências e incertezas.
Vivemos numa época de profundas e sucessivas mudanças. A Igreja é chamada com coragem, entusiasmo e criatividade a proclamar a mensagem do Evangelho para que nossos povos tenham vida e a tenham em plenitude, pois o Reino de Jesus é um Reino de Vida. Nós somos conscientes de nossos limites, mas não esmorecemos, porque somos animados pelo mesmo Espírito que impeliu os apóstolos à missão.
O Diretório para o Ministério Pastoral dos Bispos “APOSTOLORUM SUCCESSORES” já nos mostrava a identidade e real missão do Bispo, que deve estar inserido no Mistério do Cristo. Na Igreja Católica, o bispo é sucessor dos Apóstolos, com a tarefa de se colocar a serviço de uma determinada porção do povo de Deus e, em unidade com o Papa, fazer suas “as preocupações por todas as Igrejas”, como dizia de si mesmo São Paulo (2Cor 11,28). O Papa Bento XVI recordou que somos sinais do Cristo Rei crucificado e que vai ao encontro dos desfigurados para levar a verdadeira ressurreição. Por isso mesmo, o Bispo deve ser visível princípio de unidade e de comunhão, principalmente com seus presbíteros e diáconos, que são os seus primeiros colaboradores, proporcionando os verdadeiros fundamentos da Igreja no mundo de hoje, numa continuidade da missão dos Doze no Colégio Episcopal, agindo, portanto, sempre em comunhão e participação.
A difusão do individualismo e do crescimento do poder dos grandes grupos econômicos têm enfraquecido a política, com riscos para a democracia. Para esse mundo cansado, somos chamados a ser sinais de esperança. E já nos preparando para a Campanha da Fraternidade, que nos foca na missão da Igreja na sociedade, também promovendo vida na consciência de nosso povo, para que se exija melhorias e um esforço do Estado nos campos da saúde, educação, segurança alimentar, previdência social, acesso à terra e à moradia digna, criação de emprego e apoio a organizações solidárias.
O Bispo é o Promotor da Paz em sua Diocese, porção do Povo de Deus que lhe é confiada; deve ser elo de paz e unidade, frente a tantas violências que banalizam a vida, tanto nas periferias das grandes cidades como no campo. Recordo um trecho da Epístola de Santo Inácio de Antioquia aos Filadélfios: “Tende uma só Eucaristia, pois é una a Carne de Nosso Senhor Jesus Cristo, uno o cálice da unidade de Seu Sangue, uno o altar e uno o Bispo com o presbitério e os diáconos”. Poderíamos aprofundar esse tema no Ano da Paz que ora vivemos em nosso país, convocado pela CNBB. Entre as causas da violência estão a exclusão, a idolatria do dinheiro, o individualismo e o utilitarismo, a deteriorização do tecido social, a corrupção no setor público e privado, o tráfico de armas, drogas e pessoas, paraísos fiscais e lavagem de dinheiro; fator agravante é a falência do sistema penal e da saúde.
Bispo é aquele que leva a esperança frente a toda desesperança que se apresenta. Enfim, o serviço-diálogo-anúncio-comunhão expressa a pedagogia da evangelização e da missão do Bispo hoje. O serviço, que pressupõe o conhecimento dos problemas, anseios, frustrações, alegrias e tristezas dos interlocutores consiste na inserção social, em vista da libertação integral e da reconciliação. “Um cristão não é dono de si mesmo, e sim está entregue ao serviço de Deus” (Santo Inácio de Antioquia). O diálogo consiste na abertura e escuta do outro, sempre portador de “sementes do Verbo”. Já o anúncio trata-se da explicitação do testemunho cristão enquanto proclamação clara da Boa Nova de Jesus Cristo. E a comunhão é o resultado da fé em Jesus Cristo, suscitada, acolhida e partilhada, dando origem a uma comunidade de discípulos missionários. “Tem cuidado pela unidade, pois nada há de melhor” (Santo Inácio de Antioquia).
Hoje, ser bispo é testemunhar a fé ao extremo, como pai que ouve com carinho e atenção os seus filhos e os corrige se necessário, mas os corrige com caridade e para a vida. Vale lembrar as palavras do Papa Francisco, aos 19 de setembro de 2013, quando fala do relacionamento dos Bispos e Padres: “Quero lembrar-lhes a amizade com os sacerdotes. Eles são as pessoas mais próximas, os primeiros onde buscar conselho e ajuda e os primeiros a quem acompanhar como pais, irmãos e amigos. Uma das tarefas primordiais de vocês deve ser o cuidado espiritual do presbitério e a atenção às necessidades humanas de cada sacerdote, sobretudo nos momentos mais delicados e importantes de seus ministérios e de suas vidas”. Ser Bispo é ser Bom Pastor, mestre da fé, guia do seu povo pelo caminho, que é Jesus. Nas palavras de Santo Inácio de Antioquia “Onde quer que se apresente o Bispo, aí esteja também a comunidade, assim como a presença de Cristo Jesus nos assegura a presença da Igreja”. (Aos Esmirnenses 8, 2). Em suma, ser Bispo é lembrar-se do antigo provérbio, sempre visto como critério para a escolha de quem deve dirigir uma Diocese: “Seja santo para rezar, sábio para ensinar e prudente para governar”.
Nestes dias em que compartilhamos a reflexão e amizade no 24º Curso para os Bispos, peço a Deus para que o enfoque sobre a comunicação, diálogo com as religiões e a liberdade de crença nos ajudem ainda mais nessa comunhão e serviço à Igreja em todo o nosso país. E que tenhamos sempre a oração de intercessão do nosso povo, para que “sejamos santos para rezar, sábios para ensinar e prudentes para governar”.