Desde que assumiu o comando da Igreja Católica em março deste ano, o Papa Francisco tem demonstrado que o seu pontificado será dedicado a um tempo de reformas na Igreja Católica. A Exortação Apostólica Evangelii Gandium, o primeiro documento oficial do seu pontificado, lançado nesta semana, dá o tom desta reforma.
A renovação começa dentro das estruturas da própria Igreja. Através de uma saudável descentralização, a começar de seu próprio poder, papa Francisco sonha com uma Igreja de maior comunhão eclesial, e com a colegialidade, isto é, ter os bispos no governo da Igreja, como já apontou o Concilio Vaticano II.
Tudo isso significa que as conferências episcopais de cada país terão mais participação nas decisões da Igreja e também mais autonomia para resolver as situações problemáticas de cada uma. No documento o papa manifesta preocupação com uma Igreja menos Europeia, e que assim possa acolher outras vivências culturais de tantas regiões onde ela se faz presente.
Francisco deseja ainda que essa renovação passe por uma mudança de postura nos métodos e meios da Igreja evangelizar. Ele pede para a Igreja, a começar dos seus próprios pastores, descer do pedestal e ir ao encontro das realidades em que vive o nosso povo. Uma Igreja mais comprometida com os sofrimentos e os dramas da humanidade nos dias de hoje.
Diferente do que muita gente fora do contexto eclesial podia imaginar, o papa não defende nenhuma mudança na visão da Igreja sobre o aborto, a ordenação de mulheres ou a comunhão para os casais em segunda união. Mas, deixa claro que se a doutrina da Igreja é a mesma, a prática pastoral precisa ser diferente. Não se pode fazer uma nova evangelização sem que a Igreja propicie os meios para ela mesma estar mais perto do povo. Neste sentido, a Exortação Apostólica fala de uma Igreja menos clerical e que possa sobretudo ouvir mais as mulheres e os jovens.
Francisco deu o recado à sociedade, aos governantes e às autoridades em geral. Condenou o modelo econômico capitalista atual, por gerar profundas desigualdades sociais e enfatizou que, enquanto não forem resolvidos os problemas dos mais pobres, não se resolverão os problemas do mundo. Denunciou a perversidade do sistema que se preocupa mais com os lucros do que com a pessoa humana.
É importante lembrar que este documento não tem caráter doutrinário e nem dogmático. Ele é um referencial para a ação pastoral e evangelizadora da Igreja, pois não define os rumos da Igreja, mas aponta o caminho e a direção na qual Francisco deseja que ela caminhe.
* Padre Roger Araújo é jornalista e membro da Comunidade Canção Nova. É autor do livro “João Paulo II – Uma vida de Santidade” (Editora Canção Nova). Twitter: padreroger