Liberar não é subjugar

    A vida em grupo sempre exigiu a mão forte de um líder, com sua capacidade de condução e clareza de objetivos. Um grupo coeso, mas sem liderança, não chega a lugar algum. Já uma liderança opressora, sem diálogo ou capacidade de aglutinação de idéias também se perde ao longo do caminho. A comunhão desses bens e a confiança em torno de um líder são os segredos de sucesso de qualquer grupo que deseje alcançar ou seguir um ideal, uma meta qualquer. Isso vale também para a vida religiosa, grupos, movimentos, ações pastorais, catequéticas ou missionárias.
    Esse princípio de unidade é bem conhecido no meio político. Tudo vai bem enquanto se respeita e se é fiel ao comando de uma liderança. Qualquer divergência, pronto! Novo grupo se forma ou aquele se desfaz por completo. Na vida eclesial não é diferente. Quantos grupos, tendências e movimentos com carismas próprios e santa competição entre si; todos centrados num objetivo comum: evangelizar! Os instrumentos são diversos, mas o conjunto da obra constrói uma música perfeita, a harmonia do ideal de Cristo. Porque, de uma forma ou de outra, todos se deixam guiar pela obediência a um líder sem ambições de poder, mas de unidade. “Que todos sejam um!” – era sua voz de comando.
    Exemplo clássico do poder de uma liderança positiva nós encontramos na história da vida franciscana. Quando o pobrezinho de Assis resolveu promover o primeiro capítulo de sua nova ordem religiosa assustou-se com a enormidade de seus seguidores. Mais de cinco mil homens, de todas as classes e dos mais diversos rincões, se dispunham a imitá-lo na vida de pobreza e dedicação evangélica. Muitos, todavia, desejavam um abrandamento das normas franciscanas, em especial aquelas que exigiam despojamento de tudo. Falou-lhes com autoridade: “O Senhor me chamou pelo caminho da humildade e simplicidade. Esta será a senda dos que me seguem”. Estava clara a meta de um grupo que se propunha a uma vida diferente dos demais, porém a regra da Ordem não era imposta, mas oferecida a quem livremente se submetesse a ela. Não era questão de intransigência pessoal, mas de obediência pura e simples.
    ‘    “ Não me interessa muito a disciplina – disse Francisco –  mas a obediência. A disciplina é para escolas, soldados. Aqui cada um de vós se achega como voluntário, submissos à vontade de Deus”. Após essa postura pública de uma opção clara, muitos seguiram outros caminhos, outras instituições. Mesmo assim, Francisco ainda ouviu de seu cardeal uma reprimenda sutil: “Não podeis exigir que os cinco mil sejam como vós”. Ou seja, num grupo há diferentes funções, sem necessariamente se perder o ponto de unidade, o princípio primeiro que caracteriza seu espírito, sua razão de ser. A regra de um grupo não é seu ponto vital. Foi isso o que Francisco ouviu de seu cardeal: “A severidade de um regra é boa em si e possível de ser praticada por doze homens, pode ser pior e praticável para cinco mil”… O que fez Francisco? Penitenciou-se diante dos irmãos e aceitou a flexibilização de suas normas; os franciscanos tornaram-se rapidamente o maior grupo de evangelizadores do mundo, sem com isso perder seu carisma maior.
    Uma liderança comunitária não pode nunca ser ponto de discórdia e divisões dentro de um grupo. Quando esta se estabelece é hora do diálogo, da poda de arestas. As divergências são sempre construtivas, desde que trabalhadas em vista do bem comum, sem nunca perder a razão de ser do grupo. O sentido de poder presente na pessoa de um líder comunitário só é justificável quando este o usa em prol da unidade de objetivos, nunca do objetivo pessoal. Porque obedecendo a Deus, qualquer que seja nossa função eclesial, estamos apenas nos submetendo ao serviço daquele que nos ensinou: o maior é aquele que serve. Porque liderança é também serviço…

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