Caminhar é preciso.
O sol nasce aqui, mas sua trajetória é iluminar outras terras. Nos universos de Deus tudo se move, tudo se transforma e tudo se expande. As pessoas também têm como característica inerente a mobilidade. Existem ditados que servem para explicar situações e acontecimentos ligados aos movimentos e às migrações. É o que conhecemos por “sabedoria popular”. Com frequência ouvimos: “Tudo o que começa, um dia acaba; tudo é transitório neste mundo; ninguém fica aqui para sempre; partir é morrer um pouco; migram as andorinhas e migram as pessoas”. Muitos outros ditos formam o repertório relacionado com as mudanças e partidas. Para o missionário isso é normal, mas o que sempre permanece é a Visão de construir o Reino de Deus, sem fronteiras, no qual participem todas as nações com suas diferenças culturais e religiosas. O missionário parte, mas a Visão com a missão de realizar o projeto de Cristo, em qualquer parte do mundo, está enraizada na sua pessoa.Depois de nove anos de missão com migrantes de línguas portuguesa, espanhola e inglesa, no Japão, parto para outras terras, sem saber quais ainda. De início, irei ao Brasil para me recuperar de alguns desgastes inevitáveis e “recarregar as baterias” que se debilitaram nos entraves da vida e do trabalho. Afinal, Cristo também, em certa ocasião, reuniu seus discípulos num lugar apartado para que pudessem descansar e meditar. As constantes viagens para diversas comunidades de culturas e línguas diferentes, em contato com igrejas japonesas com suas estruturas burocráticas típicas acarretaram muito estresse e exaustão de energias. Mas valeu a pena. Pude exercitar e fazer crescer as virtudes da paciência e do respeito além de praticar a flexibilidade e despertar a criatividade que, para alguém da minha idade, poderia estar em declínio. Felizmente aceitando o desafio de vir ao Japão, próximo aos 60 anos de vida, foi uma vacina contra a tentação de me acomodar. Sair daqui e aceitar um novo desafio em novas terras, com certeza, será uma oportunidade para descobrir alguns dons que ainda não conheço ou que não exercitei.Minha gratidão de coração vai, em primeiro lugar, a Deus que nestes nove anos me enviou aos grupos de migrantes de muitos lugares da Terra do Sol Nascente. .
Sendo eu mesmo descendente de migrantes que há 135 anos fizeram do Brasil a sua nova pátria, desde adolescente alimentei o espírito solidário para com as pessoas que deixam sua terra de origem. Aos migrantes de Narashino, Katsutadai, Narita e Ichikawa na província de Chiba; aos migrantes na cidade de Tóquio, Yotsuya, Meguro e Hachioji no distrito de Tóquio; àqueles de Tsuchiura, Ishige e Mitsukaido, mais tarde unificadas sob o nome de Joso, que deram origem à construção de uma nova igreja quando ainda trabalhava com elas; aos brasileiros e peruanos de Moka e Oyama, na província de Tochigi; aos membros das comunidades Maebashi, Isesaki e Ota na província de Gunma e finalmente àqueles de Honjo, em Saitama, meu apreço e agradecimento pela sua acolhida e dedicação ao serviço do Povo de Deus. Não pretendi fazer tudo certo e nem fui à procura de reconhecimentos. Uma coisa digo com tranquilidade: esmerei-me para servi-los com todas as forças que Deus me deu. Terão percebido que sou limitado. Isso não é novidade para mim. Contudo, confesso que tentei amar a todos, procurando ser um irmão, servindo-os como sacerdote para os migrantes.
Seria injusto se eu não mencionasse a gratificação profunda por ter exercido a missão marcada pela solidariedade para com os migrantes presidiários da severíssima Prisão de Kurobane, na cidade de Otawara, na Província de Tochigi, e os detentos de muitas nacionalidades nos centros de Imigração de Tóquio, Ibaraki e Yokohama. Tinha a impressão que, durante os encontros e nas minhas orações e meditações posteriores, as letras da expressão “Eu estava na prisão e vocês me foram ver”, se desgrudavam das páginas de Evangelho para assumirem vida.
Reconheço do fundo do coração a abertura da Arquidiocese de Tóquio, cujo braço pastoral para atender os migrantes é o Centro Católico Internacional e à vizinha Diocese de Saitama com a qual tive a oportunidade de colaborar, dando continuidade a diversas comunidades já existentes e formando outras cinco, sendo que da união de duas delas surgiu a nova Igreja de Joso, na Província de Ibaraki.
Saio do Japão feliz depois ter tentado dar o melhor de mim mesmo e gratificado pelo carinho e acolhida dos irmãos migrantes.
“Minha alma engrandece o Senhor!”.
Fonte: Missionário Pe. Olmes Milani CS.
Local: Tóquio- Japão.