Jesus e o zelo pela casa de Deus

    A narrativa de São João sobre a expulsão dos vendilhões do templo de Jerusalém tem sido interpretada através dos tempos a partir de sua aplicação a vários contextos históricos (Jo 2,13-25). Em suas teses historiadores, hermeneutas analisam o comentário de consagrados teólogos feitos de acordo com os vários ângulos que o texto joanino oferece. De muita atualidade, entretanto, é o que escreveu no século oitavo o monge inglês Beda, o Venerável. Dentro dos principais fundamentos da reflexão medieval aparece o respeito a este lugar do culto onde se acha a presença eucarística, onde se celebrar a renovação incruenta do sacrifício do Calvário, onde se escuta a Palavra de Deus diretamente da Escritura e da transmissão da mesma pelos sacerdotes. Daí o respeito ao edifício construído para o louvor a Deus. Este edifício evoca a Igreja feita de pedras vivas que são todos os batizados. O templo de Jerusalém foi chamado por Jesus casa do Pai e, por isto, ele fez um chicote de cordas e expulsou a todos que profanavam o recinto santo.  Muito maior respeito merece, porém, as Igrejas da Nova Aliança nas quais Ele se faz presente, contemporâneo de todas as gerações cristãs. Eis por que na alheta de Beda normas foram sendo estabelecidas concernentes à conduta nos lugares dedicados ao culto divino. Tudo isto inspirado no gesto de Cristo que deixou clara ser uma profanação atividades ilícitas dentro do local consagrado à divindade. Jesus não suportou a violação e as desonras infligidas no espaço sagrado. A atitude do Filho de Deus se tornou uma referência para se pensar na sacralidade do lugar do culto. A Igreja é o lugar de silêncio, reflexão e, isto supõe a quietude e uma postura que se coadune com esta realidade.  Além deste aspecto, as palavras de São Paulo devem ser lembradas ao ensejo do episódio da profanação do templo tão veementemente combatida por Cristo. Assim se expressou o Apóstolo, falando aos Coríntios: “Não sabeis vós que sois o templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós?” (1 Cor 3,16).  Cumpre, pois, ao cristão ter consciência de que é um templo espiritual. É de dentro deste templo que é preciso também expulsar tudo que profana esta casa santa de Deus. Jesus foi claro, como lemos no Evangelho de São Marcos: “É do interior dos homens que saem os maus pensamentos, fornicações, furtos, homicídios, adultérios, ambições, malvadezas, fraudes, impudicícias, inveja, maledicência, soberba, impiedade” (Mc 7,21-23).  Tudo isto deve ser banido para que a alma espiritualize todo o corpo. Mais cada um assim age, mais a Igreja se torna forte no Espírito Santo. Eis por que é necessário vencer o espírito do mal. É deste modo que não se profana o templo do Senhor que mora em cada alma em estado de graça. Adite-se que é preciso também reconhecer em cada um o templo de Deus que nele faz sua morada ou deseja nele morar. Daí o acatamento, o respeito para com o próximo. É necessário sempre revisar nossa relação com os outros, sendo para com eles atentos, cordatos, polidos. Deixemo-nos, portanto habitar pelo Espírito de Jesus, Ele que é o verdadeiro, único e eterno Templo do amor de Deus para com o ser humano. A tudo isto se acrescente a preparação cuidadosa para se receber o Corpo de Cristo na Eucaristia, pois o Corpo ressuscitado de Jesus nele “habita corporalmente a divindade” (Col 2,9). Nem se pode deixar de lembrar que não se entra numa Igreja com trajes inconvenientes, indecentes. Cabe a cada um, com tato e delicadeza, solicitar a quem assim profana a Casa de Deus para vir até ela com vestimentas condignas de um lugar sagrado. Por vezes falta bom senso às pessoas que entram numa Igreja como se estivessem indo para um lugar de diversão, profanando com sua imodéstia o templo santo de Deus. Nele não se entra nunca de short ou qualquer tipo de bermuda e similares. Assim sendo, são inúmeras as interpelações que a atitude de Cristo, expulsando os vendilhões do Templo de Jerusalém, faz a cada um. Reflitamos nelas!

    Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.