Nesta segunda-feira, é celebrado o Dia Internacional das Pessoas com Deficiência. A Igreja tem sido presença marcante no trabalho voltado a estas pessoas que, no Brasil, são mais de 45 milhões com algum tipo de deficiência. No âmbito da catequese, há uma atenção especial com iniciativas de formação e integração com a comunidade, em vista da preparação para os sacramentos.
Os bispos do Brasil garantem, no Diretório Nacional de Catequese, que as pessoas com deficiência têm o mesmo direito à catequese, à vida comunitária e sacramental que o restante da comunidade. As pistas de ação deste documento da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), bem como as indicações do Documento 107, “Iniciação à vida cristã: itinerário para formar discípulos missionários”, fundamentam iniciativas promovidas Brasil afora para uma catequese inclusiva.
Em Cascavel (PR), uma equipe de cerca de 10 pessoas está envolvida em um projeto arquidiocesano de Catequese Inclusiva, entendida como “o direito de toda pessoa com deficiência na participação da vida da Igreja e o dever da comunidade eclesial de envolver estes irmãos como sujeitos no processo de transmissão da fé”, explica Angelita da Cunha, que faz parte desta equipe de catequese inclusiva arquidiocesana. Ela ressalta o compromisso coletivo com envolvimento do clero, de catequistas, catequizandos, familiares e comunidade.
“A partir de uma profunda vivência espiritual da Palavra de Deus, fruto de sua oração e reflexão pessoal diária, e acrescida de todo o conhecimento sistematizado, o catequista estará apto a levar a catequese inclusiva para aqueles que até o momento estiveram ou estão à margem da catequese. A formação continuada e permanente dará suporte ao catequista, fortalecendo-o diante dos muitos desafios inerentes ao seu trabalho na sua paróquia”, comenta Angelita, reforçando o trabalho de formação para os catequistas em vista da atuação inclusiva.
A ação em Cascavel está em sintonia com a preocupação do regional Sul 2 da CNBB com a formação dos catequistas que atuam junto à pessoa com deficiência. Desde 2015 realiza-se, anualmente, um encontro formativo que conta com a participação de catequistas das mais diversas áreas e também alguns com deficiência, em sua maioria com deficiência auditiva.
A coordenadora regional da Animação Bíblico Catequética, Débora Regina Pupo, conta que os encontros no Paraná abordam temáticas como legislação, psicologia (conhecimento das várias deficiências), práticas catequéticas, desenvolvimento e partilha de materiais adaptados.
“Em 2017 iniciou-se uma experiência diferente: incluir um grupo de catequistas da catequese inclusiva na escola do regional. Esses catequistas foram indicados pelas dioceses para o início de um trabalho de organização da catequese inclusiva onde a mesma ainda não está organizada ou precisa ser fortalecida”, explica.
Neste ano, recorda, Débora, os catequistas pediram ajudam mais específica do regional na formação de catequistas, na organização da catequese inclusiva nas dioceses e com diretrizes para o trabalho. “Para 2019, temos previsto um novo encontro com os catequistas para traçar um plano de ação nos próximos anos”, revela.
Na arquidiocese do Rio de Janeiro (RJ), há um serviço de “catequese especial” há cerca de 40 anos. Dentro do processo de iniciação cristã, é coordenado por Rosali Villa Real e Fátima Lopes Martins. Elas são responsáveis por 35 núcleos já instalados em paróquias da arquidiocese e pelo curso de capacitação, que acontece em dois períodos de três meses a cada ano. A Catequese Especial atende pessoas com deficiência cognitiva, com síndromes com comprometimento cognitivo e com transtornos mentais. Também está estruturada a Pastoral para Pessoas com Deficiência (PASPED) com outros trabalhos de evangelização neste campo. Há ainda uma colaboração da catequese especial com o Instituto Nacional de Educação de Surdos (Ines).
“A catequese especial existe para preparar os catequizandos para acompanhar este movimento se for o caso de inclusão”, explica Rosali. Ela chama atenção para o fato de que há muita gente que acha que a catequese especial se prepara como um “gueto”, no qual se separa as crianças e adolescentes com deficiência dos demais, mas não é bem assim. Para a coordenadora, é possível uma inclusão realmente verdadeira.
Para isso, deve ter uma preparação tanto da comunidade paroquial – “para receber, enxergar, acreditar, aceitar” – quanto do catequizando. “Temos caso de pessoas que mudam de banco quando percebem que tem um ‘especial’ do lado”, lamenta Rosali.
Este é um entre os vários desafios. Rosali conta que para muitos não é possível acompanhar a metodologia da catequese regular; em turmas com muitas crianças, sendo duas com algum tipo de deficiência, o catequista pode ter dificuldades de desempenhar o trabalho de forma satisfatória. Outro ponto é o “tempo de concentração”, que para as pessoas com deficiência é muito menor que na catequese regular.
Um dos desafios pode ter se tornado potencialidade no trabalho de catequese especial no Rio de Janeiro. Neste ano, o grupo conseguiu incluir na formação dos padres uma intervenção em relação à catequese especial. “Agora, é feita uma demonstração da catequese especial nos seminários. Nós temos um grande desafio de mostrar aos nossos sacerdotes a importância da catequese especial, espaços físicos acessíveis, salas reservadas”, enumera Rosali.
Iniciativa interessante foi realizada pela irmã Lúcia Imaculada, das Irmãs de Belém: “Ela dividiu os seminaristas que ela acompanha em grupos de 10 e fez com que eles visitassem as pastorais e todos os grupos visitaram a catequese especial, foi muito interessante, muito proveitoso”, comemora Rosali Vila Real.
Caminhos apontados pelos bispos
A Igreja reconhece em documentos catequéticos a necessidade de dar a devida atenção às pessoas com deficiências e fazer esforços para superar todo tipo de discriminação. Também é lembrada a presença destas pessoas nas comunidades, onde há os que se sentem chamados a trabalhar junto àqueles com deficiência, que também estão envolvidas nas atividades da catequese ou de pastorais.
Já em 2005, quando foi aprovado o Diretório Nacional de Catequese, os bispos já percebiam o aumento do número de voluntários neste trabalho inclusivo, além da organização e da presença de organismos e movimentos representativos. Os bispos, naquela ocasião, buscaram a superação de ideias preconceituosas e de atitudes que dificultam o protagonismo social e eclesial. Também apontaram para a importância da família como parte fundamental na primeira experiência de comunidade das pessoas com deficiência.
“Esta catequese supõe uma preparação específica dos catequistas, pois cada necessidade diferente exige uma pedagogia adequada”, afirmaram os bispos reunidos na 43ª Assembleia Geral da CNBB. Uma indicação foi para contar com o apoio de profissionais, como médicos, fonoaudiólogos, professores, fisioterapeutas, psicólogos e intérpretes em língua de sinais “sem que se perca o objetivo da catequese”.
Mais recentemente, com novo impulso a uma catequese catecumenal, o episcopado brasileiro aprovou o Documento 107 da CNBB, que também propõe um caminho de acolhida à pessoa com deficiência, por meio da escuta e da compreensão de sua realidade. O texto orienta que não deve ocorrer a formação de grupos apenas com pessoas com deficiência, “pois o melhor para elas e para a comunidades é estarem incluídas nos grupos existentes”.
A comunidade paroquial também deve estar preparada neste processo, de acordo com o documento da CNBB, considerando questões referentes “a acessibilidade atitudinal, comunicacional, arquitetônica, à locomoção, à adaptação do mobiliário” a fim de garantir o bem-estar de todos, especialmente das pessoas com deficiência.
As indicações dos bispos motivaram a fonoaudióloga Francielly Guimarães de Oliveira Lippel a se aprofundar na temática da catequese inclusiva. Com 14 anos de experiência, atendendo pessoas com deficiência auditiva em suas diversas classificações, a profissional buscou se especializar em uma pós-graduação em Iniciação a vida cristã, pela Faculdade Católica de Santa Catarina (Facasc). Seu trabalho na catequese e o Documento 107 da CNBB a incentivara a mostrar um olhar diferenciado para as pessoas com deficiência. Assim, ela propôs como título de seu trabalho de conclusão de curso “Catequese inclusiva a serviço da Iniciação à Vida Cristã: um novo olhar para as pessoas com deficiência auditiva”.
“É necessário acolhermos todas as pessoas em suas diversidades e suas deficiências. Para isso é necessário estudo, dedicação por parte do clero e de toda comunidade que estará à frente deste projeto. É necessário entender a forma de comunicação, para que se possa anunciar o Cristo Jesus que a IVC propõe”, comenta.
Francielly é catequista há 20 anos e tem percebido a necessidade de acolhida: “Em diversas situações as crianças e ou jovens com algum tipo de deficiência foram a mim destinados. Sempre é necessário encontrar a forma como se comunicar com essas pessoas para que a evangelização, o querigma, seja anunciado de forma mística”.
E este tem sido um dos trabalhos de inúmeros catequistas Brasil afora: encontrar métodos para o anúncio às pessoas com deficiência.
Em Cascavel, Angelita Cunha aplica atividades que convidam seus catequizandos a manusear materiais confeccionados por ela e a interagir com outros catequizandos sem deficiência. “A catequese acontece de uma maneira tranquila e de fácil compreensão para todos os com deficiência e os sem deficiência. O segredo é amor e acolhimento, o resto acontece naturalmente”, conta.
Como frutos, ela partilha a conclusão da preparação para o Crisma de uma jovem com paralisia cerebral. Outros quatro catequizandos fizeram a Primeira Eucaristia: dois com TDAH, um com paralisia cerebral e outro autista.
No Rio de Janeiro, também são vários relatos e imagens que registram o ápice do trabalho com crianças e jovens que podem participar dos sacramentos, principalmente a Eucaristia e a Unção do Crisma.