Inauguração da salvação humana

    Como homem e cabeça do Corpo Místico dos que creem, ao ir de Corpo e Alma para o céu no dia de sua Ascensão, Jesus inaugura oficialmente a salvação humana. Trata-se do acabamento de uma obra admirável a favor daqueles que Ele veio redimir. Momento sublime no qual nossa pobre humanidade vai para o mais alto do céu. Na Carta aos Colossenses São Paulo mostra que Ele é “o primogênito dentre os mortos” e que “foi do agrado  do Pai que nele residisse toda plenitude” (Col 1, 18-19). Eis aí a essência do mistério da Ascensão (Lc 24,46-53). A oração desta solenidade mostra que este acontecimento é já nossa própria vitória, pois é a humanidade que é introduzida na glória da Trindade e temos então um intercessor junto do Pai. É o que, aliás, diz a Carta aos Hebreus: “Cristo não entrou num santuário feito por mãos humanas, cópia do verdadeiro, mas no próprio céu, para conservar-se agora em vista da presença de Deus em nosso favor” (Hb 9,24). Ele partindo para o céu, mostra o homem partilhando da vida trinitária, tendo Ele aberto a porta para todos os que, por Ele, deparam a comunhão com o Pai. Ele veio a este mundo, fez-se homem semelhante a nós e retornou glorificando definitivamente a humanidade que  assumira. Ressuscitado, seu corpo glorioso não estava mais sujeito à corrupção. Ele já havia passado a uma outra dimensão da realidade terrena e a morte e as degradações inerentes à matéria não mais o atingiriam. Eis porque a Ascensão vem lembrar que não é  no mundo material que se pode encontrar Jesus. A Ascensão dele  aos céus, como bem se expressou o Pe. Armand Veilleux, “foi uma passagem do tempo  à eternidade, do visível ao invisível, da imanência à transcendência, da opacidade de nosso mundo à luz divina”. Sua presença se insere, assim, na ordem da fé e daí o motivo pelo qual Ele enviaria o Espírito Santo que nos faz penetrar  profundamente nesta esfera espiritual. Assim sendo, a ida de Jesus para junto do Pai não significou uma separação dele com relação a seus seguidores e a sua Igreja. Ele continua sempre presente no coração dos fiéis. Além disto, Ele na Eucaristia é contemporâneo de todas as gerações cristãs e seu seguidor o contempla sempre na figura do próximo.  Os Apóstolos, segundo São Lucas,  enquanto Jesus ia se elevando para os céus, o adoraram e, depois, voltaram para Jerusalém. A festa da Ascensão se, realmente, lança nossos pensamentos e nosso coração para o Alto, lembra-nos também que é preciso retornar às ocupações habituais, preparando-se cada um para um dia estar junto do Mestre divino na sua glória. O cristão não vive nas nuvens para estar com Jesus, mas o reencontra nos acontecimentos cotidianos, no contexto pessoal e coletivo, nas provações, nas dificuldades, como também nas alegrias e na esperança. Eis porque o cristão  jamais se torna cúmplice das misérias das paixões desordenadas e de tudo que signifique sua ruptura com Aquele que o aguarda além túmulo. Um dia Ele voltará e, até lá, é o tempo da conversão, de uma contínua ascensão na prática do bem.  As incoerências, as contradições naturais a um exílio terreno, as feridas na luta contra o  mal fazem parte de uma preparação para a felicidade sem fim e sem ocaso que Jesus nos prepara na Casa do Pai. O paradoxo de nossa fé reside no fato de que por Cristo, o Verbo de Deus, a cruz que cada um deve carregar não é um ponto final, como não foi para Jesus sua morte no Calvário.  A cruz se tornou para Ele uma passagem, uma Páscoa que resultou na sua Ressurreição a qual Lhe abriu o caminho para sua Ascensão. Ele traçou um itinerário para seus seguidores e os convida a seguir o mesmo dinamismo que Ele, a nos libertar do que São Paulo chamou de “velho homem” para se tornar assim nele e por Ele homens novos à sua imagem.   O mistério da Ascensão de Jesus com todas estas consequências não se impõe, mas leva o cristão a crer e a esperar. Ele não está  visível a seus discípulos, mas os engaja em outro plano, a saber o da total confiança nele. Sua Ascensão nos introduz  assim  na ação dinâmica que nos responsabiliza e nos faz crescer e enraizar nossa vida numa fé profunda nele em quem podemos confiar. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.                    

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