FALAR E ENSINAR

                Pela terceira vez em 68 anos de Campanha da Fraternidade, a Igreja Católica vai refletir sobre a questão educacional. Desta feita em plena pandemia. Desta feita confrontando uma realidade de ensino totalmente inimaginável em tempos passados. Usa uma tradução ecumênica da Bíblia que, no livro de Provérbios (31,26) nos diz textualmente: “Com sabedoria, abre sua boca e sua língua ensina amavelmente”. Esse é o lema proposto: falar e ensinar com sabedoria e amor.

                Aqui começa nosso desafio. Para falar e ensinar há que se ter um público. Para reunir um público razoável é preciso motivação. Para se ter essa motivação é preciso ouvintes que respeitem e ou admirem seus mestres. Foi mais ou menos isso que aconteceu a Jesus quando ocupou a tribuna do Templo de Jerusalém para falar aos mestres e doutores de sua época. Como chegou até eles? Foi preciso motivação, respeito, admiração. E isso se deu diante de uma necessidade: julgar o procedimento adúltero de uma pobre mulher. A sociedade exigia um veredicto sobre a questão, mas escondia a verdade, a motivação da falta cometida, o outro lado daquela história de infidelidade. Faltava o corruptor, aquele que induziu a mulher ao pecado. Nesse processo canhoto, onde uma das partes não se submetia ao julgamento do mestre, não poderia haver ensino algum, nem julgamento perfeito.

                Assim os donos da verdade, os “doutores da lei”, conscientes da imperfeição de seus ensinamentos, fugiram, se omitiram, ocultaram-se por detrás de suas imperfeições. “Onde estão eles? Ninguém te condenou?” (Jo 8,10). Essa é a maior falha educacional dos nossos dias: a falta de clareza no ensino da verdade.

                Nosso texto-base nos diz que “os que se arrogam o poder de julgar porque sabem ler o que está escrito” são os fariseus e escribas dos tempos atuais. Daí os desvios da verdade no ensino moderno, as tendenciosas manipulações político-partidárias, as distorções ideológicas nas questões de gênero, os direcionamentos vocacionais voltados única e exclusivamente para as necessidades de mercado, os interesses profissionais e sociais, o banimento das virtudes religiosas, os direcionamentos de credo conforme a predominância e o controle estatal, a ditadura dos guetos fundamentalistas, etc. “Na história da mulher adúltera (a sociedade, poder-se-ia dizer) opõem-se duas pedagogias, duas formas de educar, a daqueles que se restringem ao que está escrito, sem levar em conta a pessoa e suas circunstâncias, e daqueles que olham para a pessoa com sabedoria e amor, como fez Jesus” (TB 18).

                Ao confrontar essa nova realidade educacional, onde, além do desnível de oportunidades que a pandemia bem evidenciou e o selecionismo elitista que se criou, a Igreja põe a mão numa ferida social a ser pensada com urgência. Pensada nos dois sentidos, curativo e refletivo. Grita a quem tem ouvidos: “Educação não é condicionamento ou adestramento” (22). Diz às famílias que “a disciplina não pode ser confundida com um regulamento rígido, anônimo e uniforme” (23), pois “a obediência, saber ouvir, deve ser naturalmente acompanhada de respeito e amor”. Simplesmente porque “não se pode reduzir a educação apenas à transmissão de conhecimentos” (24). Isso tudo e muito mais veremos nas próximas semanas, durante esse tempo quaresmal que nos coloca mais presentes na escola de Cristo, o Mestre dos Mestres que por primeiro dignificava a pessoa, para só então corrigi-la e lhe apontar o caminho a seguir. Com sabedoria e amor.

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