DOM PAULO JACKSON, SEGUNDO VICE-PRESIDENTE DA CNBB, PRESIDE MISSA EM MEMÓRIA DA PÁSCOA DE DOM HELDER CAMARA

O arcebispo de Olinda e Recife e segundo vice-presidente da CNBB, dom Paulo Jackson, presidiu missa em ação de graças na Catedral Metropolitana, em Olinda, no domingo, 25 de agosto, por ocasião dos 25 anos da páscoa de dom Helder Camara.

Foto: Walli Fontenele/Folha de Pernambuco

A missa reuniu membros do Instituto Dom Helder Camara (IDHeC), autoridades, movimentos e pastorais da arquidiocese e outros fiéis admiradores do arcebispo que esteve à frente da arquidiocese de Olinda e Recife de 1964 a 1985, e que faleceu em 1999, aos 90 anos, em Recife. A Rádio Olinda FM 105,3 transmitiu a missa ao vivo.

De fato, temos muito a agradecer. Vieram muitos fiéis, religiosos, leigos, de pessoas que inclusive conviveram e trabalharam com dom Helder, que hoje vieram para rezar por ele e com ele pedindo a paz para a humanidade. Nós agradecemos imensamente por essa celebração tão bela, que foi um momento bonito de congregação de tantos fiéis que guardam esse legado defendido por dom Helder Camara”, afirmou o arcebispo.

Solenidade

Foto: Walli Fontenele/Folha de Pernambuco

A missa reforça a memória de um pastor pequeno no tamanho, mas que realizou um governo marcante na história da arquidiocese de Olinda e Recife.

“Do mesmo jeito que celebramos a chegada de uma criança, seu nascimento e aniversários, devemos marcar também os anos de vida na Casa do Pai. Como dizia dom Helder, chega o momento em que nós mudamos de endereço, deixando a vida na terra e continuando a vida no céu”, disse a religiosa vicentina, irmã Wanda Araújo. Ela conviveu anos com dom Helder e contribuiu para a elaboração do processo de sua beatificação.

Segundo dom Paulo Jackson, dom Helder foi “um dos grandes exponentes pela graça de Deus” no Brasil. Para o arcebispo de Olinda e Recife, o legado de dom Helder foi muito importante no período entre a década de 1960 e 1970 porque “ele se tornou o grande porta-voz dos direitos humanos, da justiça e da fraternidade quando nós vivíamos no país aquele momento tão doloroso da ditadura militar’.

“Aquilo que ele não podia dizer dentro do país ele dizia na França, na ONU, em Nova York, onde ele estivesse. Então a voz de dom Helder ganhou um uma potência enorme, sendo a grande voz da defesa da vida e dos direitos humanos no nosso país. Não é à toa que ele foi indicado quatro vezes para o Prêmio Nobel da Paz”, concluiu o arcebispo.

Ao final da celebração, dom Paulo Jackson realizou com os fiéis um momento de oração aos pés do túmulo de dom Helder Camara e abençoou o local de descanso do religioso.

“Dom da Paz”

Dom Helder, conhecido como “Dom da Paz”, foi ordenado sacerdote cedo, aos 22 anos de idade. Ainda no Ceará, envolveu-se com grupos de trabalhadores e trabalhadoras, como lavadeiras, passadeiras e empregadas domésticas. Na época, também esteve próximo de questões relacionadas à educação. Em 1936 foi enviado ao Rio de Janeiro para aprofundar os estudos. Na então capital da república, aproximou se da Ação Integralista Brasileira, da qual se afastou mais tarde. Em artigo publicado no Correio Braziliense, em 1989, ano da celebração dos seus 80 anos, o membro da Academia Brasileira de Letras Marcos Vilaça escreveu: “As dificuldades em nada o entibiaram. Frágil por fora, siderúrgico por dentro. Acho até que o tempo de integralista serviu para que compreendesse as diferenças entre radicalizar e compreender; em vez do integralismo, o enlace; no lugar da luta, a convergência”.

Foi no Rio de Janeiro que nasceu o projeto da CNBB. Ali, Helder estava também com a incumbência de instalar o Secretariado Nacional da Ação Católica Brasileira, sendo a precursora da conferência episcopal. Em dezembro de 1950, ele apresentou sua ideia da CNBB ao então integrante da secretaria de Estado do Vaticano, monsenhor Giovanni Battista Montini, que seria eleito papa Paulo VI. Em menos de três meses, após a eleição do pontífice, foi fundada a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil.

Dom Helder foi secretário-geral da entidade em duas oportunidades: ele foi o primeiro, de 14 de outubro de 1952 até 10 de julho de 1958. Na quarta assembleia ordinária da Conferência, houve a reeleição para o cargo, que ocupou até o dia 27 de outubro de 1964.

Por ocasião dos 25 anos da CNBB, dom Helder escreveu um depoimento que foi publicado no jornal O São Paulo. “Os homens se movem e Deus os conduz: eis o resumo das minhas impressões ao recordar o surgimento da CNBB e sua caminhada”, afirmou dom Helder no texto. Confira alguns trechos:

[…] “Um dia (sou fraco em datas), vi-me nomeado assistente geral da Ação Católica Brasileira. Em uma célebre Assembleia Geral da Ação Católica, os bispos presentes (recordo-me, entre outros, de d. Antonio Cabral, d. Fernando Gomes e de d. José Delgado) exigiram a criação de um Secretariado Nacional da Ação Católica. Lançaram até um desafio fraterno: se o Secretariado fosse fundado, depois de seis meses de funcionamento, os bispos do Brasil se encarregariam de mantê-lo. […]

 

O Secretariado Geral da Ação Católica Brasileira, com o apoio de núncios apostólicos, como d. Carlos Chiarlo e d. Armando Lombardi, e a alta proteção de d. Jaime e de d. Carlos Carmelo de Vasconcelos Mota, começou inclusive a promover Encontros Regionais de Bispos, como o dos prelados da Amazônia e o dos prelados do Vale do São Francisco.

 

Estava madura a ideia da CNBB. Em um País de dimensões continentais, impunha-se um secretariado que ajudasse os bispos a equacionar com segurança os problemas locais, regionais e nacionais, em face dos quais a Igreja não pode ser indiferente.

Aproveitando um bom pretexto para uma primeira viagem a Roma, fui expor o sonho da CNBB ao então subsecretário de Estado do Santo Padre Pio XII, S. Exa. Mons. Montini. Ia como representante dos anseios de numerosos bispos, e viajei com o apoio precioso do senhor núncio e dos senhores cardeais do Rio (d. Jaime) e de São Paulo (d. Carlos Carmelo de Vasconcelos Mota). […]

Dom Helder ressaltou em seu depoimento o papel dos leigos na missão da CNBB, os quais chamou de “extraordinários”. Como na atualidade, “a CNBB, com as bênçãos de Deus, revela-se sempre mais, à altura da hora difícil vivida pelo nosso país e pelo mundo”.

Em seu ministério episcopal, após ser bispo auxiliar do Rio de Janeiro entre 1952 e 1964, foi nomeado o sexto arcebispo de Olinda e Recife (PE) até 1985, quanto teve seu pedido de renúncia aceito pelo papa João Paulo II. Manteve forte atuação e publicações de livros após tornar-se emérito.

Ainda no texto de Marcos Vilaça para o Correio, encontra-se a reflexão: “Dom Helder e Madre Teresa são as mais aliciantes figuras deste século no catolicismo do mundo pobre. Suplicaram sempre pelo infinito mesmo que só recebessem o Mundo. Como se não bastasse ele é nordestino, portanto diluído, pela origem, uma contingência inarredável de religiosidade, daí agir não apenas pelo que leu, acreditou ou viu, mas também pelo que experimentou”.

Além da criação da CNBB, dom Helder é lembrado por sua atuação em favor da defesa da liberdade e dos mais necessitados. Durante o período de ditadura militar no Brasil, após ser empossado como arcebispo de Recife e Olinda, dom Helder e mais 17 bispos do Nordeste pediram a liberdade das pessoas e da Igreja. Em 1969, ele criticou a situação de miséria dos agricultores nordestinos. Na ocasião, foi chamado de demagogo e comunista.

Situações semelhantes o levaram a pronunciar a memorial frase “Quando dou comida aos pobres, me chamam de santo. Quando pergunto porque eles são pobres, chamam-me de comunista”. Outros fatos remetem às represálias que sofreu, inclusive com sua casa metralhada, assessores presos e assassinados. Dom Helder ainda foi signatário do Pacto das Catacumbas, durante o Concílio Vaticano II.

Às vésperas de completar 80 anos, em fevereiro de 1989, dom Helder ainda manifestava suas preocupações com a descrença na política, a questão da liberdade, a reforma agrária, violência e economia. Em entrevista ao Correio Braziliense, afirmou: “A mensagem de Cristo não muda, é eterna, mas os tempos mudam, e por isso surgiu o Concílio Ecumênico, um grande esforço dos bispos do mundo inteiro para aplicar ao nosso tempo as mensagens eternas de Cristo”.

O Dom da Paz faleceu em sua casa, no Recife, em 27 de agosto de 1999, devido a uma insuficiência respiratória decorrente de uma pneumonia.

Em 2015, a arquidiocese de Olinda e Recife (PE) deu início à fase diocesana do processo de beatificação de dom Helder, já considerado Servo de Deus pela Santa Sé.

Com informações da Folha de Pernambuco. Foto de capa: Walli Fontenele/Folha de Pernambuco

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