Na segunda-feira, 12 de novembro, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso defendeu que o debate sobre o aborto deve ser feito nesta Corte Suprema, ao que o Bispo de Palmares (PE), Dom Henrique Soares da Costa, rebateu indicando que não cabe a esta instância judicial “querer legislar”.
O ministro Barroso participou do I Congresso Internacional de Direito e Gênero, promovido pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), no Rio de Janeiro, tendo se pronunciado no painel sobre Direitos Reprodutivos.
Nesta ocasião, o ministro do STF defendeu que a questão do aborto se trata de debate sobre direitos fundamentais da mulher. “Nenhuma emenda constitucional pode impedir o desfrute de um direito fundamental porque, no caso brasileiro, seria violação de cláusula pétrea. Os direitos fundamentais têm aplicabilidade direta e imediata e, quando eles entram em rota de colisão, é o Poder Judiciário que deve dirimir a questão”, afirmou.
Para ele, em relação a este tema do aborto, uma das colisões de direitos fundamentais se dá entre o da mulher e, “para quem acha que existe vida desde o momento da concepção, também os direitos fundamentais do feto”.
“Estão em jogo direitos fundamentais da mulher e do feto. Resta fazer uma ponderação de qual deve prevalecer. Esse é um papel típico do judiciário. A característica dos direitos fundamentais é que independem de legislador e da aprovação da maioria. A autonomia individual da mulher é um direito fundamental em jogo”, expressou.
O ministro ainda afirmou que “a mulher não é um útero a serviço da sociedade. Se os homens engravidassem, esse problema já teria sido resolvido. O ponto é que a criminalização se tornou uma má política”.
Frente a tais comentários de Barroso, Dom Henrique Soares fez uma publicação em sua página no Facebook intitulada “Suprema leviandade”. Conforme manifestou o Bispo de Palmares, “é impressionante como um juiz da Suprema Corte da República pode ter uma visão tão míope e um pensamento tão raso e cínico num tema moralmente tão relevante”.
“Direito fundamental da mulher não tem nada a ver com assassinato de embriões! Para o Excelentíssimo togado, qual o estatuto do embrião? Qual o direito do ser humano no ventre materno? Qual seria o direito do feto?”, questionou.
Nesse sentido, ressaltou que “é preciso que o Supremo cumpra a Constituição e deixe de lado a impostura de querer legislar”. “Esperamos que a próxima legislatura, na Câmara e no Senado, ponha fim a isto”, expressou.
Além disso, indicou “o Povo deve sempre recordar que os ministros do Supremo podem sofrer impeachment, quando não são dignos da função ou, exorbitam nas suas atribuições constitucionais”.
“O Povo poderia pressionar o Congresso no sentido de uma limpeza de alguns senhores que se colocam acima da Constituição, dos demais Poderes da República e do Povo brasileiro…”, completou.
A questão do aborto no STF
Esta não foi a primeira vez que o ministro Luís Roberto Barroso se manifestou sobre o aborto. O magistrado já havia demonstrado posição semelhante em 2016, quando a maioria da primeira Turma do STF declarou que o aborto até o terceiro mês de gestação não é crime.
A decisão se deu quando os ministros analisavam o pedido de habeas corpus cinco funcionários de uma clínica clandestina de aborto de Duque de Caxias (RJ). Na ocasião, votaram no sentido de não considerar o aborto um crime os ministros Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Edson Fachin.
Em seu voto, Barroso declarou que os artigos do Código Penal que criminalizam o aborto nos três primeiros meses de gestação violam os direitos fundamentais da mulher, entre os quais listou: autonomia da mulher, integridade física e psíquica, direitos sexuais e reprodutivos e igualdade de gênero.
Para o ministro, “na medida em que é a mulher que suporta o ônus integral da gravidez, e que o homem não engravida, somente haverá igualdade plena se a ela for reconhecido o direito de decidir acerca da sua manutenção ou não”.
Recentemente, a questão do aborto voltou à pauta do Supremo, devido à Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 442/2017 (ADPF 442), apresentada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL).
Esta ADPF 442 questiona os artigos 124 e 126 do Código Penal, que tipificam o crime de aborto, alegando a sua inconstitucionalidade. Assim, propõe a descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação.
Em agosto deste ano, a questão foi tema de uma audiência pública no STF, convocada pela ministra Rosa Weber, relatora do caso.
Diante disso, movimentos pró-vida e diversos Bispos alertaram nos últimos meses sobre tentativas de aprovar pela via do STF a prática do aborto no Brasil, no que denunciaram como um ativismo do judiciário.
Em uma nota publicada em julho deste ano, às vésperas da audiência pública no STF, a Comissão Episcopal Pastoral para a Vida e a Família da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e Comissão Nacional da Pastoral Familiar assinalaram que “cabe, de fato, ao Congresso Nacional colocar limites a toda e qualquer espécie de ativismo judiciário”.