No 29º. Domingo do Tempo Comum a Mãe Igreja nos convida a uma reflexão muito importante: como é a nossa relação entre as realidades divinas e as realidades do mundo. A liturgia pode ser resumida na seguinte premissa: que Deus é a nossa prioridade e que é a Ele que devemos subordinar toda a nossa existência. A Igreja, entretanto, nos adverte, também, que Deus nos convoca a um compromisso efetivo com a construção do mundo.
O Evangelho(cf. Mt 22,15-21) ensina que o homem, sem deixar de cumprir as suas obrigações com a comunidade em que está inserido, pertence a Deus e deve entregar toda a sua existência nas mãos de Deus. Tudo o resto deve ser relativizado, inclusive a submissão ao poder político.
As sagradas escrituras narram que o povo judeu estava sob o domínio romano, e o pagamento do tributo era prova de sujeição ao imperador. Jesus confrontado pelos fariseus, para ser pego em uma palavra deveria responder a seguinte pergunta: “Mestre, sabemos que és verdadeiro e que, de fato, ensinas o caminho de Deus. Não te deixas influenciar pela opinião dos outros, pois não julgas um homem pelas aparências. Dize-nos, pois, o que pensas: É lícito ou não pagar imposto a César?”(cf. Mt 22,16-17) Se Jesus respondesse que o povo deveria pagar o imposto, seria acusado de trair sua nação e perderia qualquer pretensão messiânica. Caso respondesse que não deveria pagar o imposto, seria acusado de rebelião contra o império e preso. Qualquer que fosse a resposta, Jesus estaria em perigo. Mas ele ultrapassa a questão do lícito(visão legalista) ou ilícito(visão não legalista) e conduz seus interlocutores a uma reflexão mais profunda: a autoridade política não pode tomar o lugar de Deus. Para Israel, só Deus podia reinar sobre o povo, mediante um representante tirado de uma das tribos. Por isso, a sujeição ao imperador romano era sinal de idolatria. Além disso, essa situação se agravou quando o imperador se proclamou divino.
Jesus inverte a armadilha dos fariseus. Aqui está a grande novidade da liturgia deste domingo: quando Jesus pergunta de quem é a figura e a inscrição na moeda, entra no âmago da questão. Os judeus usavam a moeda romana e, por isso, não tinham por que se opor ao pagamento do imposto. Mas Jesus acrescenta que se deve dar a Deus o que é de Deus, reafirmando a soberania do Senhor sobre Israel e as nações. No grego, a palavra “dar” também significa “devolver”. E já que a imagem de Deus está gravada em nós, devemos “devolver” nossa vida em adoração a ele, cumprindo a sua soberana vontade. Assim, a prática de devolver a Deus o que é de Deus destrói toda idolatria.
A autoridade política deve ser respeitada, porque está a serviço do bem comum, mas nunca terá o poder de exigir o que é devido somente a Deus, cuja imagem está impressa em nós.
A primeira leitura(cf. Is 45,1.4-6) sugere que Deus é o verdadeiro Senhor da história e que é Ele quem conduz a caminhada do seu Povo rumo à felicidade e à realização plena. Os homens que atuam e intervêm na história são apenas os instrumentos de que Deus se serve para concretizar os seus projetos de salvação. Ciro, rei da Pérsia, aonde estavam exilados os judeus, foi escolhido por Deus para fazer o povo judeu entrar na terra prometida. Deus é sumamente fiel e ama os filhos de Israel; ele os tirou da escravidão do Egito, levou-os para a terra prometida e para lá os faz retornar. Ciro não passa de um instrumento de Deus para executar uma tarefa. O imperador não é uma divindade; ao contrário, é como uma criança conduzida por um adulto para fazer algo que ela nem tem consciência do que seja. Ciro é tomado pela mão e levado pelo Senhor para libertar os judeus. Nenhuma autoridade é eterna ou absoluta: há um único Deus, e tudo está submetido a ele e ao seu plano. Nada nem ninguém podem impedir a realização do projeto divino. O livre-arbítrio humano pode apenas escolher entre colaborar ou não com Deus. A história da humanidade está imersa no projeto de Deus.
A segunda leitura(cf. 1Ts 1,1-5b) nos apresenta o exemplo de uma comunidade cristã que colocou Deus no centro do seu caminho e que, apesar das dificuldades, se comprometeu de forma corajosa com os valores e os esquemas de Deus. Eleita por Deus para ser sua testemunha no meio do mundo, vive ancorada numa fé ativa, numa caridade esforçada e numa esperança inabalável. São Paulo lembra da “ação da fé” dos tessalonicenses. Trata-se da fé dos tessalonicenses que é um modo de viver, é a vida em ação colaborando com Deus. Colaborar significa “trabalhar com”. Assim, a fé é mais que um sentimento: é uma tarefa, um ofício, um trabalho, uma missão. O plano de Deus se realiza independentemente da fé do ser humano, mas os que vivem a fé assumem consciente e livremente esse plano como um objetivo de vida a ser realizado e trabalham com Deus na efetivação desse projeto, até chegar à plenitude.
Dando a César o que é de César e a Deus o que é de Deus nós celebramos, neste domingo, o dia mundial das missões. Todos nós, pelo batismo e pela crisma, somos chamados a evangelizar a todas as gentes. Sejamos comprometidos com o anúncio do Evangelho e com o testemunho cristão. Testemunho pela coerência de vida, mais também, efetivamente pela nossa ajuda para as terras de missão, concretamente dando a nossa generosa coleta em favor das missões. Lembremos, como São Paulo deu graças a Deus pela ação dos cristãos de Tessalônica, que “a atuação da vossa fé, o esforço da vossa caridade e a firmeza da vossa esperança em nosso Senhor Jesus Cristo”(1Ts, 3) nos faz corresponsáveis pelo querigma cristão e para que todos aqueles e aquelas que ainda não conhecem o Cristo sejam evangelizados. Vamos ajudar a construir a cidade terrestre, que é um fermento nos meios temporais para anunciar os meios da salvação, a Cidade do Alto, a Jerusalém Celeste, colocando a nossa confiança sempre e acima de tudo em Deus, que ama os homens e as mulheres e querem que sejam testemunhas que fermentam e transformem o mundo na escola do Evangelho. Que todos nós, também, rezemos com alegria por todos os missionários que deixaram tudo para trás para anunciar, viver e testemunhar o Evangelho, amém!