Conseguencias da Traição de Judas

    Uma das conseqüências da traição de Judas, anunciada por Cristo um de vós vai me trairá  ( Mt 26, 21, foi a flagelação de Jesus. Os soldados da guarda levam Jesus para o átrio do Pretório e chamam toda a corte. Todos são tomados de um delírio coletivo, sem dúvida fora das previsões de Pilatos. Despem a Jesus e o amarram numa coluna. Os braços esticados para cima e os punhos amarrados no alto da coluna. Uma barbaridade o que se seguiu. A extremidade das correias com que açoitam o Cristo, além de ter bolas de chumbo, contornavam o corpo sagrado do Filho de Deus e o marcavam com sulcos profundos. Dois desalmados carrascos batem com afinco. Aos golpes formam-se riscos azuis da equimose subcutânea. Em seguida, a pele mais sensível, mais dilacerada por novos golpes, não só se cobre de sangue, como pedaços da mesma ficam pendentes. Em toda parte  chagas mais profundas ocasionadas pelas bolas de chumbo. Cada pancada provoca novas dores horrípilas. Eis Jesus num mar da dor  mais terrível. Assim sofre um Deus para deificar os homens, para dar aos mortais sua imortalidade, aos humilhados a glorificação. Fineza de um Ser admirável! Cristo preso a uma coluna, por entre tantos sofrimentos, estava a quebrar os grilhões que prendiam os homens à servidão do pecado. Outrora os hebreus não temiam o poder de seus inimigos protegidos por aquela coluna de fogo que derramava o terror entre os egípcios perseguidores. Guiados por ela atravessaram as  águas do Mar Vermelho e escaparam da escravidão e da morte.  Aos pés desta coluna do Pretório homens valorosos  têm inspirado, buscado forças e, a exemplo do Mestre divino, se sacrificam pela causa do Evangelho salvador. Séquito imenso de heróis do cristianismo que na mortificação, na renúncia, no martírio cotidiano contribuem pela conversão de milhares de pecadores. Santificam-se, purificam-se no sofrimento e oferecem todo padecimento, voluntário ou não, pela regeneração das ovelhas desgarradas. A tortura  no Pretório chega ao auge quando um verdadeiro capacete de penetrantes espinhos é colocado  sobre a cabeça de Jesus. Ao penetrarem no couro cabeludo jorrou o sangue que corre na face do mártir divino. O crânio ficou logo pegajoso com inúmeros coágulos. Naquele momento Cristo reparava todo orgulho humano, desde a primeira manifestação edênica. Lá no jardim do Éden o homem queria ser como Deus. Através dos tempos a sabedoria infinita do Criador continuaria afrontada por aqueles que se julgam os donos da verdade, mais sábios que o Ser Supremo. A ciência a criar a arrogância daqueles que chegam a proclamar o fim da religião, a morte de Deus. O ateísmo petulante a negar o Criador do universo. As artimanhas arquitetadas por  inteligências criadas que deveriam louvar e agradecer ao seu Senhor, mas que parturejam os maiores crimes no desprezo audacioso dos Mandamentos eternos. Ali no Pretório a tantas dores físicas se ajuntou o escárnio mais deprimente: colocam sobre Jesus um manto escarlate e na mão um caniço e ajoelhando-se diante dele,  diziam-lhe, caçoando: Salve, Rei dos Judeus! (Mt 27,29).
    Com aquelas vestes da irrisão Jesus é levado a Pilatos e este disse aos judeus: Eis o homem (Jô 19,5). Sem atinar com o significado de suas palavras Pilatos apresentava não àquela turba sanguinária, mas a toda a humanidade a maior personagem da História. Ali estava alguém perante quem todos haveriam de se pronunciar. Ele arrebataria o coração de milhares de seguidores que encontrariam a ventura se submetendo a Ele, Caminho, Verdade e Vida. Na negação daquele homem todas as desgraças pessoais e da própria sociedade, pois longe dele só campearia a desordem e a morte. Sim! Eis o homem que verdadeiramente amou, o Bom Pastor que dá a vida pelas suas ovelhas. Eis o homem anunciado pelos Profetas, esperado por todos os justos do Antigo Testamento. Eis o homem  que oferece a salvação, a paz, um reino de delícias sem fim. Doravante todo ser racional só encontraria respostas às suas indagações mais profundas,  solução para seus problemas existenciais, se viesse até este homem coroado de espinhos que tomará uma cruz, mas que havia dito a seus discípulos que se alguém quisesse vir após ele que renunciasse a si mesmo, tomasse sua própria cruz e o seguisse.

    * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.