AMIZADE E FRATERNIDADE

                Parece-me um tanto forçado o termo Amizade Social num contexto de fraternidade cristã. Porque a boa notícia que nos trouxe os Evangelhos é exatamente o desafio de uma fraternidade universal, que vai muito mais além do que as aparências de uma convivência social pura e simples. Na sociedade ainda imperam as normas do procedimento ético, das boas maneiras, do farisaísmo social que as relações humanas fazem questão de preservar como lei de conduta e maturidade nas relações interpessoais. Qualquer manual de etiqueta é capaz de nos apontar essa falsidade comportamental. Mas a verdadeira convivência fraterna, desejada e praticada pelo mestre de Nazaré, rasgou toda e qualquer cartilha de comportamento social para valorizar por primeiro a beleza das relações humanas, deixando de lado suas normas e etiquetas excessivamente inibidoras e constrangedoras. Numa verdadeira relação fraterna predominam gestos de espontaneidade, pureza e autenticidade.

                Para os construtores do Reino de Deus entre os homens não pode haver meia verdade. Ou tudo, ou nada. Ou você aceita o desafio de uma relação pessoal além das aparências que a tentação demoníaca tenta construir na vida social, ou nossas amizades nunca passarão de falsa diplomacia plasmada pelas normas e exigências do mundo, nunca de Deus. Essa é uma exigência puramente humana, mundana, que não penetra no âmago do verdadeiro espírito de fraternidade universal. Melhor então agir como Jesus, que se afastou da convivência social para viver entre os animais selvagens, onde os anjos desciam dos céus para o servir (Mc 1, 13)? Felizmente, isso só durou quarenta dias! Pelo menos ali, no deserto e na quietude das falsas relações sociais, a plenitude do amor divino era mais evidente! Mas essa não era a missão cristã, pois o tempo e a ação evangelizadora se cumprem no aqui, no hoje, na realidade do tempo presente. Não podemos fugir dessa nossa necessidade de inserção na realidade do mundo. Por isso nossa fé segue os passos do Cristo, que nos convida à conversão imediata, seguindo seus exemplos, seu Evangelho de fraternidade universal: “Vós sois todos irmãos e irmãs” (Mt 23,8).

                Penetrar nesse desafio de fé e coerência evangélica nos leva a construir uma relação muito além das aparências sociais. O mundo político tem nos dificultado a construção de um mundo novo conforme os parâmetros do ensinamento cristão. Direita ou esquerda nunca foram situações simpáticas ao bom senso que só o meio termo, o diálogo, as concessões de um e as renúncias do outro são capazes de solidificar fraternalmente, sem a tentação da vitória de um sobre a derrota do outro. Não é guerreando que se constrói a Paz. Esse é um conceito diabólico, que muitos abraçam como bandeira de ação e não enxergam o sarcasmo do Diabo por detrás dessa bandeira institucionalizada. Não é por aí. Com o Diabo não existe diálogo. Papa Francisco já nos alertou em um de suas falas do Angelus (2021): “Quando o sedutor se aproxima, começa a seduzir-nos: “Mas pensa isso, faz aquilo…”, a tentação é entrar em diálogo com ele, como fez Eva; e se entrarmos em diálogo com o Diabo, seremos derrotados”. Só o diálogo com Deus, com sua Palavra, pode restaurar o diálogo entre nós.

                Fica pois a pureza evangélica como único e melhor caminho para a paz fraternal que desejamos alcançar. Esqueçam essa amizade social. Melhor caminho é a amizade cristã. Busquem primeiramente o diálogo fraternal, sem divisões, sem tendências, sem radicalismos políticos ou sociais. O verdadeiro cristão não negocia com o Inimigo, o Pai das falsas ilusões, da mentira institucionalizada. Não é por aí o caminho da evangelização sonhada e almejada por Cristo. A boa nova da salvação não negocia com doutrinas meramente transitórias. Um único caminho nos promete as alegrias do Reino de Deus entre nós, o diálogo com Deus e os irmãos. Portanto, “convertei-vos e crede no Evangelho”.

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