Um tema que faz parte de nosso testemunho eclesial e que nos chama muito atenção e é de suma importância para nós, cristãos católicos, é o da unidade. A unidade espiritual da Igreja é uma obra exclusiva de Deus. Não podemos produzir unidade, mas pedi-la e mantê-la. Todos aqueles que creem em Cristo, em qualquer lugar, em qualquer tempo fazem parte da família de Deus e estão ligados ao corpo de Cristo pelo Espírito. Aqui, em nossa amada Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro, a busca unidade arquidiocesana será celebrada no último sábado do ano litúrgico, dia 01 de dezembro de 2018, abrindo o Ano Vocacional Arquidiocesano. As atividades começarão às 8hs, na Catedral Metropolitana de São Sebastião, na Avenida Chile, com várias atividades. Às 1030hs presidirei a missa solene da unidade diocesana.
Só existe um Corpo de Cristo, uma igreja, um rebanho, uma noiva. Todos aqueles que nasceram de novo e foram lavados no sangue do cordeiro fazem parte dessa bem-aventurada família de Deus.
Esta unidade é construída sobre o fundamento da verdade (Ef 4,1-6). Não há unidade cristã fora da verdade.
O teólogo Karl Rahner diz que o perigo que ameaçava a Igreja de Filipos e ainda ameaça todas as igrejas saudáveis é a desunião. Os negócios internos da Igreja não iam tão bem quanto os negócios externos. São Paulo exorta a Igreja de Filipos a tapar as brechas que estavam comprometendo a unidade da Igreja, como já havia exortado a Igreja de Éfeso (Ef 4,3).
O Apóstolo Paulo recorre a este tema, depois de tê-lo abordado no capítulo anterior (1,27). Ninguém pode destruir o fato de que pessoas que creram em Cristo, foram adotadas na família de Deus, nasceram do Espírito, foram seladas pelo Espírito e batizadas no corpo de Cristo pelo Espírito são um em Cristo Jesus. Porém, essas mesmas pessoas podem quebrar essa comunhão como os membros de uma família que em vez de viver em amor, vivem brigando entre si, deixando de desfrutar a alegria de uma convivência harmoniosa. Quando os cristãos vivem desunidos, brigando e falando mal uns dos outros, isso é um espetáculo lamentável e vergonhoso diante do mundo que desonra a Cristo e a própria Mãe Igreja. É o grito de ecoa da Sagrada Escritura, “para que o mundo creia, que todos sejam um”!
O Apóstolo dos gentios faz uma transição dos inimigos externos (1,28), para os perigos internos (2,1-4). O teólogo protestante Ralph Martin diz que esta transição que a palavra grega oun “pois” demarca, presume que Paulo está deixando a ameaça de um mundo hostil, para tratar de um problema igualmente ameaçador, o da comunidade dividida. São Paulo alerta para o fato de que uma Igreja dividida é uma presa fácil no caso de um ataque frontal da sociedade externa. Assim, não basta apenas ficar firme contra os perigos que vêm de fora, é preciso acautelar-se contra o perigo de esboroar-se por causa das divisões intestinas. Rahner diz que, para Paulo “uma santa e una Igreja” não era apenas um artigo de fé.
O Espírito Santo é o princípio unificador na Igreja local (1Co 12.4-11). Somente ele pode dar ordem ao caos e preservar a harmonia no corpo de Cristo. A não ser que o Espírito Santo reine, haverá na Igreja confusão. Sem o Espírito Santo não há vida nem poder na Igreja. Onde reina o Espírito Santo, existe amor, porque o amor é fruto do Espírito.
A Igreja de Filipos tinha muitas virtudes, a ponto de São Paulo considerá-la sua alegria e coroa. Mas esta Igreja estava ameaçada por alguns sérios perigos na área da unidade. Havia tensões dentro da Igreja. A comunhão estava sendo atacada. A palavra grega eritheia traduzida por “partidarismo” é o resultado do egoísmo. Depois de Paulo mencionar a atitude mesquinha de alguns batizados de Roma que, movidos por inveja pregavam a Cristo para despertar nele ciúmes, pensando que o seu trabalho apostólico era uma espécie de campeonato em busca de prestígio, volta, agora, suas baterias para apontar os perigos que estavam afetando, também, a unidade na Igreja de Filipos.
Em primeiro lugar, o perigo de trabalhar sem unidade. Nada debilita mais a unidade do que os cristãos estarem engajados no serviço de Deus sem unidade. A obra de Deus não pode avançar quando cada um puxa para um lado, quando cada um busca mais seus interesses do que a glória de Cristo, e ainda pior, quando se combatem entre si. Na Igreja de Filipos havia ações desordenadas. Eles estavam todos lutando pelo Evangelho, mas não juntos.
Em segundo lugar, o perigo de líderes buscarem seus próprios interesses: Paulo ao enviar Timóteo à Igreja de Filipos e dar bom testemunho acerca dele, denuncia, ao mesmo tempo, alguns líderes que buscavam seus próprios interesses. Esses líderes eram amantes dos holofotes; eles não buscavam a glória de Deus nem a edificação da Igreja, mas a construção de monumentos aos seus próprios nomes.
Em terceiro lugar, o perigo de falsos mestres se infiltrando na Igreja. Os falsos mestres, os maus líderes e a heresia são sempre uma ameaça à Igreja. Os lobos sempre buscarão uma brecha para entrarem no meio do rebanho (At 20,29). Paulo está alertando a Igreja de Filipos sobre os judaizantes que tentavam desacreditar seu apostolado, ensinando que os gentios precisavam ser circuncidados caso desejassem ser salvos. Assim, eles negavam a suficiência da fé em Cristo e acrescentavam ritos judaicos como condição indispensável para a salvação.
Em quarto lugar, o perigo do mundanismo na Igreja, o qual sempre o Papa Francisco tem combatido. A unidade da Igreja de Filipos estava sendo ameaçada por homens mundanos, libertinos e imorais. Essas pessoas fizeram Paulo sofrer de tal modo, que o levaram às lágrimas. São Paulo os chama de inimigos da cruz de Cristo. Essas pessoas eram mundanas, pois só se preocupavam com as coisas terrenas. Eram comilões, beberrões e imorais, com uma visão muito liberal da fé cristã, do tipo que está sempre dizendo: “isso não é pecado, não tem problema”. Em vez de a igreja seguir a vida escandalosa desses libertinos, deveria imitar o seu exemplo (2,17).
Em quinto lugar, o perigo dos cristãos viverem em conflito dentro da Igreja. Aqui o Apóstolo está trabalhando com a questão do conflito entre lideranças da Igreja local, pessoas que disputam entre si a atenção e os espaços de atuação na Igreja, pois quando o trabalho era dirigido pela família de Evódia, o pessoal de Síntique não participava, e quando era promovido por Síntique quem não participava era o pessoal de Evódia.
A unidade de pensamento não é uma coisa fácil de alcançar, especialmente onde as pessoas têm uma mente ativa e um espírito independente. Se todos “pensarem” da maneira como Jesus Cristo também pensou, como ele morreu por pecadores, não poderão se separar; hão de apegar-se aos irmãos.
A Igreja precisa necessita de ser unida. Jesus orou para que todos aqueles que creem possam ser um como Ele e o Pai são Um (Jo 17,22-24). Essa frase significa dois corações batendo como se fosse um só. Na Igreja de Deus não há espaço para disputas pessoais. A Igreja não é um concurso de projeção pessoal nem um campeonato de desempenhos pessoais. A Igreja é um corpo onde cada membro da Igreja precisa ser ter o mesmo sentimento. A Igreja é como um coro que deve cantar no mesmo tom. Os cristãos não são competidores, mas cooperadores. Eles não são rivais, mas parceiros. Eles não estão lutando por causas pessoais, mas todos buscando a glória de Deus. Na Igreja de Deus não devem existir disputas políticas, briga por cargos, ciúmes e invejas. O espírito de Diótrefes que buscava primazia e desprezava os outros, não deve ser cultivado na igreja de Deus (Jo 9-11). A verdadeira unidade e o serviço autenticamente eclesial coopera com o outro, visando a edificação de todos.
Na minha Carta Pastoral a todos os fiéis leigos e leigas (cujo ano estamos concluindo neste Domingo de Cristo Rei), aos religiosos e religiosas, consagrados e consagradas, ao clero, aos irmãos bispos auxiliares, na amada Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro, tive a ocasião de assinalar: “A participação na Igreja, Corpo Místico de Cristo, é fruto da Fé e gera no discípulo o entusiasmo que impulsiona à missão. Em comunhão com os pastores, representantes de Cristo, de quem recebem os bens espirituais da Igreja, sobretudo o auxílio da palavra de Deus e dos sacramentos, os fiéis leigos e leigas colaborem, segundo o seu saber, conhecimento e lugar que ocupam na sociedade, em tudo aquilo que se refere ao bem da Igreja[1]. Ser membro de uma comunidade é fundamental para a caminhada e fortalece o indispensável testemunho no dia a dia, o qual, guiado pelo Espírito Santo, torna visível o amor incondicional de Deus pela humanidade. O lema do Ano do Laicato, “Sal da Terra e Luz do Mundo” (Mt 5,13-14), remete à vocação batismal que nos chama a dar um testemunho de autênticos discípulos de Jesus: “Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros” (Jo 13,35).”(cf. número 4).
Por isso mesmo quero conclamar a todo a nossa Arquidiocese que vivamos e testemunhamos a unidade arquidiocesana anunciando Cristo Ressuscitado, que morreu e ressuscitou para nos salvar, e nos envia em missão permanente para que o mundo atraído pelo Evangelho da Vida seja cada vez mais transformado pelo perdão, pela acolhida, pela misericórdia, pela caridade e pela paz! “Que todos nós sejamos um” como Cristo em favor da nova Evangelização e da santificação de toda a humanidade!
[1] Cf. LG, n. 37