Ainda envolta nas alegrias do Natal, a Igreja celebra neste domingo a Sagrada Família de Nazaré. O Verbo de Deus, que se encarnou e nasceu da Virgem Maria, realmente habitou entre os homens. Tomou então conhecimento de todas as vicissitudes do ser racional, vivendo concretamente as relações humanas. Sua infância, sua juventude, não foram um simples parênteses entre seu nascimento e sua morte redentora no Calvário. Ele se enraizou na nossa humanidade. Viveu os costumes de seu país, de seu povo, numa cidade dentro de uma família. O Evangelista Lucas registrou que em Nazaré “ele crescia, em sabedoria, em estatura e em graça diante de Deus e dos homens” (Lc 3, 52). Quis assim colocar em relevo a vocação e a missão da família em suas dimensões humana e espiritual. Hoje mais do que nunca cumpre se apreenda a importância deste grupo social primário. De tanto repetida, mas nem sempre compreendida, a expressão “família célula mater da sociedade” perdeu seu significado profundo. É preciso que não se perca de vista nunca que a família é o lugar do amor em todo seu esplendor e verdade. Nela é que se transmitem os valores essenciais para que a criança possa se tornar um adulto verdadeiramente prestativo à sociedade e um cristão, autêntico discípulo de Jesus. O episódio vivido pela Sagrada Família narrado no Evangelho oferece lições preciosas (Lc 2,41-52). Estas mostram como cada membro de uma família deve procurar descobrir o outro mesmo nos momentos de aflições. No retorno a Nazaré após a festa da Páscoa, as caravanas se formavam e os meninos tinham liberdade de circular entre os parentes e vizinhos. Maria e José pensavam que isto tinha acontecido com Jesus. Após um dia de viagem, passaram a procura-lo e, não o encontrando, imediatamente regressaram a Jerusalém. As palavras de Maria, quando O localizaram no Templo entre os doutores, mostram o drama vivido por aqueles pais amargurados: “Filho, porque procedeste assim conosco? Eis que teu pai e eu andávamos angustiados á tua procura”. A resposta de Jesus os deixou ainda mais desconcertados: “Por que me procuráveis, Não sabíeis que eu devo me encontrar na casa de meu Pai”? O primeiro ensinamento que nos revela esta página do Evangelho é que, não obstante os liames afetivos os mais estreitos, cada um nem sempre percebe as diferenças que há entre as pessoas e então a adaptação se torna difícil, se um quiser enquadrar o outro nos seus moldes mentais. Esposos, pais e filhos devem dia a dia crescer no conhecimento mútuo para que nada possa afetar o amor, a comunhão entre aqueles que vivem sob o mesmo teto. O mistério interior do ser humano, resultante de seu perfil caracterológico, longe de ser um obstáculo é um verdadeiro tesouro que leva ao crescimento recíproco. O fundamento da comunhão familiar é o amor divino que não conduz à uniformidade, mas à universalidade na aceitação do outro como ele é. Sendo, porém, a família uma escola de virtudes nela uns ajudam os outros a corrigir os erros e a crescer na prática do bem e no desenvolvimento dos dons e carismas pessoais. Em segundo lugar, exatamente por isto. Maria legou um ensinamento precioso. Não recriminou a Jesus, mas, diz São Lucas, “guardava todas estas coisas em seu coração”. Procurava entender a perda do filho amado e sua misteriosa resposta que patenteava sua origem divina e sua independência em ralação aos pais terrenos. Ele tinha uma missão redentora a cumprir. Maria e José aceitaram por amor a explicação de Jesus e compreenderam que deveriam participar, eles também, da vida e da missão daquele que o Pai Celeste lhes havia confiado. Passaram a amar ainda mais o filho dileto apesar de não vislumbrarem o que aconteceria no futuro. José e Maria, porém, curtiam então a companhia de Jesus em Nazaré mostrando como se deve bem usufruir as descobertas maravilhosas do momento presente sem se preocupar com as dificuldades que o porvir possa reservar. A fé e o amor de Deus são o segredo para tranquilidade no lar. Aí está o cerne das preces que devem ser feitas por todas as famílias, sobretudo quando passam por provações. Estas orações são o sustentáculo do liame que precisa sempre prender os esposos, os pais e os filhos arraigados numa confiança absoluta naquele que é o Doador de todas as graças. A Sagrada Família de Nazaré se tornou um modelo porque se caracterizou pela sua simplicidade, sua humildade diante os planos divinos, sua doçura e sua paciência durante trinta anos. Que todas as famílias imitem este exemplo.* Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.