A liturgia do 25.º Domingo do Tempo Comum convida-nos a escolher entre a “sabedoria do mundo” e a “sabedoria de Deus”. A “sabedoria do mundo” talvez nos torne importantes, humanamente falando; mas apenas nos proporciona uma felicidade efémera. A “sabedoria de Deus”, por outro lado, não nos assegura glórias e triunfos humanos; mas leva-nos ao encontro de algo infinitamente mais valioso: a Vida verdadeira e eterna.
No Evangelho – Mc 9,30-37 – Jesus, imbuído da lógica de Deus, apresenta aos discípulos o caminho que se dispõe a percorrer: é o caminho do dom da vida, do amor até ao extremo, da entrega na Cruz. Jesus está plenamente convencido de que esse caminho é o caminho que conduz à Vida plena. Mas os discípulos, impregnados da lógica do mundo, têm dificuldade em comprometerem-se com essa opção: preferem as honras, os privilégios, o poder. Jesus, no entanto, não está disposto a baixar a fasquia; e avisa-os de que quem não estiver disponível para abraçar a “loucura da cruz”, não terá lugar na comunidade do Reino.
Estamos na primeira parte do Evangelho diante do segundo anúncio da Paixão de Jesus: sofrimento, morte e Ressurreição. Como nos anúncios anterior e posterior, a moldura é de incompreensão por parte dos discípulos. É difícil para os seguidores de Jesus entenderem a Cruz como caminho de vida e de salvação.
Na segunda parte do Evangelho, estabelece-se um antagonismo: o Senhor anuncia-lhes o caminho da Cruz – que é sinal de serviço, despojamento e entrega –; em contrapartida, os discípulos especulam quem seria o maior do grupo – sinônimo de suas ambições, em busca de poder e status. Jesus ratifica a posição daquele que deseja ser seu seguidor: “se alguém quiser ser o primeiro, que seja o último de todos e aquele que serve a todos”. A criança torna-se protótipo daqueles que entenderam a dinâmica do Reino e do seguimento a Jesus: a humildade, amor generoso, serviço gratuito e acolhida dos mais vulneráveis e sofridos.
Na segunda leitura – Tg 3,16-4,3 –, um “mestre” cristão do primeiro século exorta os discípulos de Jesus a viverem de acordo com a “sabedoria do alto”, que é fonte de paz, de misericórdia e de frutos bons. A recusa em viver de acordo com a “sabedoria do alto” gera divisões, conflitos, ciúmes, discórdias, que causam sofrimento pessoal e impedem a comunhão dos irmãos. Os frutos da verdadeira sabedoria, paz e bondade mostram-se superiores à inveja e à ambição. Sábio é aquele que sabe manter uma “boa conduta”, mesmo diante das adversidades, e sabe construir relações fraternas. A verdadeira justiça proporciona a paz e a harmonia entre as pessoas. Ambição, orgulho e inveja são como um câncer que corrói as relações comunitárias e também a sociedade.
A primeira leitura – Sb 2,12.17-20 – desvenda a estratégia dos “ímpios” para lidarem com os “justos” que os incomodam. Os “justos”, incompreendidos, desprezados, hostilizados a cada passo pelos “ímpios”, não terão uma vida fácil e indolor; mas, coerentes com a sua fé, viverão com o coração cheio de paz e saberão que Deus está do lado deles. A lógica do mundo é levar vantagem em tudo, e os que se opõem a isso não são aceitos. Sempre houve perseguição aos que desejam construir uma sociedade mais justa, fraterna e solidária. Muitos morreram por essa causa, e muitos continuarão a morrer.
Neste domingo peçamos a Deus a graça da humildade. Não é fácil “descer do pedestal” e abandonar os privilégios para a exemplo do Mestre, pôr-se a serviço. Quem acolhe o pequeno – aquele que é pouco valorizado pela sociedade –, acolhe o próprio Jesus, e quem acolhe Jesus, acolhe seu Pai. Uma criança, desprovida de ambição e poder, é apresentada como modelo do Reino. A ambição e a vaidade desviam os corações daquilo que é o mais importante: o amor e a doação. Jesus abraça os pequeninos, e não os poderosos. Não é fácil abraçar o projeto de Jesus; é mais fácil abraçar a autopromoção e o desejo de ser o primeiro, sem se importar com os outros. Somos convidados a fazer a diferença em gestos concretos que consiste em servir e em se doar. Vivamos a sabedoria de Deus: servir e se doar!
+ Anuar Battisti
Arcebispo Emérito de Maringá, PR