Curiosamente, substituindo capítulos ou etapas de um texto, a CFE 2021 propõe “paradas” aos leitores de seu texto-base. Além da polêmica desnecessária que vemos até aqui, há algo de desafiador nesse trabalho de diálogo ecumênico que não podemos ignorar ou desprestigiar. Dizer-se fora dessa discussão, sem ao menos solidificar biblicamente suas razões, é, no mínimo, uma atitude infantil, uma birra de criança prepotente. Pronto, já disse o que penso!
Mas, vamos lá. A atitude farisaica dos judeus perante os questionamentos da pregação de Jesus está bem evidente nessas críticas beligerantes. “Como pode o filho de Deus sentar-se à mesa ou misturar-se ao bando de pecadores que o seguem?” Seria essa a nossa questão. Os acontecimentos mais recentes, que enfraquecem o poderio humano e põem à prova nossa ciência e sabedoria, bem como prostra por terra todo e qualquer projeto ou desejo de “vida longa ao rei”, pois que já não sabemos até onde vai nossa pretensa longevidade e nosso reinado neste mundo, não são tão ou mais desastrosos do que a falta de diálogo entre semelhantes. O que se dirá dessa falta entre cristãos? Especialmente em dias como os atuais?
Exatamente essas são as questões fundamentais propostas pela Primeira parada da atual Campanha. “No Brasil, surgiram discursos religiosos que associavam a pandemia ao fim do mundo e à volta de Jesus. Foi possível assistir cenas de pessoas ajoelhadas nas ruas orando e pedindo que muitos se convertessem porque a pandemia seria um sinal de que ‘Jesus está voltando’ (27)”. De fato, está, sempre esteve, pois “Ele está no meio de nós”. O Senhor da História continua presente em nossa caminhada, como esteve na estrada de Emaús, naquele agradável diálogo entre seguidores que não compreendiam o momento atual. Esse é nosso momento, razão do nosso diálogo, da nossa busca de compreensão dos fatos. “No entanto, não podemos ignorar que as instituições religiosas, suas lideranças e as pessoas que frequentam as comunidades de fé estão separadas do mundo em crise… Os momentos de comunhão podem ser afetados pelas polarizações da sociedade” (43). Lembrou bem a redatora desse texto.
Mas não paramos aqui. “Em tempo de crise, (é preciso) contemplar a realidade com agilidade de coração”. Esse é um dos subtítulos, que cita o poeta português, Cardeal José Tolentino e sua oração de clamor: “Livra-nos, Senhor, deste vírus, mas também de todos os outros que se escondem dentro dele”. Livra-nos, Senhor, do pior dos vírus, aquele que mata nossa capacidade de “fraternidade e diálogo, compromisso de amor”. Sem a aceitação plena dos desafios presentes nessa proposta, de nada vale o rótulo de uma campanha que pretendemos e sonhamos como instrumento construtor da verdadeira paz. Antes, aceitemos o peso de nossas cruzes separatistas, cuja rigidez e repugnância não fornecem as respostas positivas para a paz que almejamos. Antes, construamos pontes; muros nunca mais!
“Os dados nos mostram quem são as pessoas atingidas pelo sistema de violência (67)”. Não podemos ir contra dados estatísticos, fatos aterradores, que afetam mais diretamente este ou aquele grupo, esta ou aquela classe social. “Uma das falsas notícias que fortalece a violência é a retórica de que direitos humanos servem apenas para defender “bandidos” (69). Se continuarmos rotulando pessoas e privilegiando nossos atos de caridades de acordo com nossa empatia ou interesses, ora, ora, estaremos rasgando ou rasurando nossas páginas bíblicas, nossa constituição de fé. Então, abraçamos ou não nossa causa comum? Nosso sonho de unidade? Nosso orgulho cristão? Essa parada eu topo.