A liturgia do 22º Domingo do Tempo Comum propõe-nos uma reflexão sobre a “Lei”. Deus quer a realização e a vida plena para o homem e, nesse sentido, propõe-lhe a sua “Lei”. A “Lei” de Deus indica ao homem o caminho a seguir. Contudo, esse caminho não se esgota num mero cumprimento de ritos ou de práticas vazias de significado, mas num processo de conversão que leve o homem a comprometer-se cada vez mais com o amor a Deus e aos irmãos.
A primeira leitura(Js 24,1-2a.15-17.18b) garante-nos que as “leis” e preceitos de Deus são um caminho seguro para a felicidade e para a vida em plenitude. Por isso, o autor dessa catequese recomenda insistentemente ao seu Povo que acolha a Palavra de Deus e se deixe guiar por ela.
No Evangelho(Jo 6,60-69), Jesus denuncia a atitude daqueles que fizeram do cumprimento externo e superficial da “lei” um valor absoluto, esquecendo que a “lei” é apenas um caminho para chegar a um compromisso efetivo com o projeto de Deus. Na perspectiva de Jesus, a verdadeira religião não se centra no cumprimento formal das “leis”, mas num processo de conversão que leve o homem à comunhão com Deus e a viver numa real partilha de amor com os irmãos.
A segunda leitura(Ef 5,21-32) convida os batizados a escutarem e acolherem a Palavra de Deus; mas avisa que essa Palavra escutada e acolhida no coração tem de tornar-se um compromisso de amor, de partilha, de solidariedade com o mundo e com os homens.
Os discípulos de Jesus são desafiados hoje a uma decisão de fé. Havia uma multidão seguindo Jesus, vendo todos os sinais que ele fazia(Jo 6,2). Todos presenciaram o sinal da multiplicação dos pães e se alimentaram desse sinal(Jo 6,5-13). Estavam muito dispostos a seguir Jesus: ao perceberem que ele os deixara, tomaram providências, atravessaram o mar e foram procura-lo em Cafarnaum(Jo 6,22-25). Encontrando ali, Jesus os ensina e põe às claras a disposição de sua fé, falando-lhes acerca do verdadeiro pão do céu, que é o dom de sua vida, sua carne, entregue pela vida do mundo(Jo 6,30-58). O que ouvimos hoje é a resposta desta multidão ao ensinamento de Jesus: “Esta palavra é dura. Quem consegue escutá-la?”(Jo 6,60); e a sua consequente decisão: “A partir daquele momento, muitos discípulos voltaram atrás e não andavam mais com ele”(Jo 6,66). Graças ao Pai – “ninguém pode vir a mim a não ser que lhe seja concedido pelo Pai”(Jo 6,65) – também houve que deram o passo da fé: “A quem iremos, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna”(Jo 6,68). A fé nem sempre é fácil. A mensagem de Jesus por vezes choca e sempre exige uma decisão comprometida com sua Palavra. Tal passo não é dado sem um impulso do céu. Mas não é por ser um dom que exige menos. Tal como é a totalidade e gratuidade do dom, assim deverá ser a totalidade e gratuidade de nossa resposta a esse dom. Jesus dá-se totalmente a nós na Eucaristia. Acolher o dom de sua vida requer de nós uma adesão a ele que não custa menos do que do dom total de nós mesmos. Só aqueles que acolheram esse dom e responderam a ele poderão dizer: “cremos firmemente e reconhecemos que tu és o Santo de Deus”(Jo 6,69).
O Reino de Deus que começa aqui na terra e alcança sua plenitude no céu, tem suas exigências. Nosso esforço precisa ser o de acolher e de decidir diante da proposta de Jesus. Nada é fácil, mas se torna possível, e mesmo suave, com a graça de Deus, e em virtude de um amor que não prova ninguém além de suas próprias forças.
Estamos sempre diante de uma escolha: queremos ou não queremos servir a Deus, Pai de Jesus Cristo, que nos deu o seu Filho para que tenhamos vida nele? Afirmar e reafirmar essa decisão de fé só é possível pela força que nos vem do Pão que o Pai nos providenciou.