No momento em que milhões de seres racionais se concentram para acompanhar, analisar, discutir partidas de futebol, se emocionando diante das jogadas de vinte e dois atletas, é bem o momento de se perguntar como se posiciona um cientista social perante este fenômeno humano.
Trata-se de um capítulo da filosofia da arte, pois o futebol é uma realidade artístico-estética.que lhe é peculiar ou em conformidade com a idéia nele entranhada, alcançando assim sua plasmação ideal. A beleza é uma propriedade transcendental de todo ente racional.
O futebol apresenta a beleza com os mais variados matizes. Quem bem observa a movimentação dos jogadores em campo, sobretudo em nossos dias com os recursos cada vez mais sofisticados da televisão, nota que há um verdadeiro balé executado com refinada arte.
É o ritmo do futebol que atrai, que fascina.
Há uma harmonia em torno de um objetivo que é fazer chegar a bola até as redes adversárias, mas, até lá, a inteligência do jogador, seu malabarismo, a graça com que toca na esfera é algo verdadeiramente sublime.
A partida de futebol vai assumindo no decorrer dos minutos que se escoam evoluções que se assemelham a passos de uma verdadeira epopéia.
A tudo isto se acrescente que o futebol arma uma verdadeira disputa entre entes dotados de razão e alimenta a imaginação a qual conduz o assistente aos páramos do delírio.
Não se trata de uma mensagem via ações imaginadas por um artista, mas criada, de fato, por vinte e dois protagonistas de cenas imprevisíveis, mas todas elas dotadas de seqüências de gestos bem combinados, associados, que exprimem perfeição e beleza.
Tudo que acontece numa partida de futebol é irrepetível, é uma situação única. Eis por que quando o artista da bola é genial ele fixa cenas que para sempre ficam incrustadas na memória dos pósteros. É que uma jogada da mais refinada arte estética produzida por um gênio do futebol é fruto de um juízo prático intuitivo, mas sumamente criativo, só possível a um ser dotado de intelecto,
O futebol, por outra, é uma linguagem que é entendida pelos homens de todos os lugares e de todas as etnias.
Quando então se realiza a chamada Copa do Mundo os homens se sentem ainda mais irmãos, o planeta terra fica mais valorizado, há uma percepção maior do lado espiritual do ser racional Tudo isto mostra que o futebol, como arte, tem por causa deste aspecto filosófico uma função humana de profundas repercussões, tanto mais que a arte é mensageira da esperança.
Pena que a comercialização e a corrupção estejam maculando este esporte e os protestos contra os gastos astronômicos da Copa do Mundo no Brasil são justificáveis, pois as verbas deveriam ser destinadas para a Saúde, a Educação, para os serviços essenciais da população.
A construção de estádios faraônicos, com razão, revoltou a população brasileira.
No total, segundo foi noticiado nos meios de comunicação social, o governo federal e o governo estadual das doze sedes já gastaram oito bilhões de cruzeiros.
As necessidades básicas do país são postas em segundo plano. Isto numa nação de profundas desigualdades sociais e na qual a corrupção gangrena a classe política. Justas, portanto, as ondas de protestos, sinal do “mau humor” generalizado de um povo sofrido.. Por outro lado, a classe média já está diante do fantasma da inflação.
É, porém, de pasmar a declaração dos organizadores da Copa de que, com o início dos jogos o futebol será, por algumas semanas o ópio do povo.
Será esquecida por uns dias a trágica condição das crianças. A situação de milhares de meninos pobres e abandonados sendo levados pelo desespero a toda sorte de comportamentos anti-sociais.
Eles são desprezados, muitas vezes jogados nos institutos de correção sem nenhum procedimento jurídico que lhes faculte a defesa. Entretanto, que as manifestações populares sejam pacíficas e sem violência!
Apesar dos pesares vamos torcer pelo Brasil ser hexa campeão!
* Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.