Felipe Herrera-Espaliat de Lima, Peru
O Papa Francisco fez um forte chamado à responsabilidade todos aqueles que usam a inteligência artificial, expressando mais uma vez o desejo de fortalecer a proteção de menores contra o abuso sexual e, assim, “erradicar esse câncer da sociedade”, disse o Pontífice. O Santo Padre falou com particular severidade sobre as ameaças representadas por algumas áreas do desenvolvimento tecnológico, e o fez enviando uma mensagem às mais de quinhentas pessoas em Lima, Peru, que estão participando do IV Congresso Latino-americano do CEPROME, de 25 a 27 de fevereiro. Essa entidade foi pioneira na formação de centenas de agentes que promovem ambientes saudáveis na Igreja e fortalecem uma cultura de prevenção desses crimes.
Sensação de impunidade
O Papa começou argumentando que a Internet, ao tornar tudo visível por meio de uma janela, cria uma sensação de impunidade, pois torna mais fácil para as pessoas se esquivarem da responsabilidade por sua participação no universo paralelo da web. No entanto, para Francisco, com a inteligência artificial, essa impunidade aumenta não apenas pela visualização, coleta ou disseminação de material inadequado, mas também pela criação de conteúdos aparentemente novos, mas sintéticos, ou seja, composto de material que já existe no ciberespaço.
“Não tendo nossa mão na produção desses materiais se poderia criar a falsa ilusão de que não somos nós que estamos ‘fazendo’ algo de vergonhoso: atacando uma pessoa, roubando uma imagem, usando o conceito ou a ideia de outra pessoa, expondo algo íntimo que deveria permanecer na esfera privada da pessoa. Mas isso não é verdade, a máquina executa nossas ordens, realiza, não toma as decisões, mas está programada para fazê-lo”, denunciou o Pontífice.
Os danos do uso malicioso da inteligência artificial
A mensagem de Francisco, lida por um sacerdote, listou os danos que podem resultar do uso doloso e irresponsável da inteligência artificial: “danos àqueles que, vendo o que produzimos, querem imitá-lo; danos por causa do enorme fluxo de materiais inadequados que poluem o ambiente; danos por causa da dificuldade encontrada pelas autoridades em discernir entre material real e sintético para garantir a segurança de possíveis vítimas, etc.”. De acordo com o Papa, os responsáveis por tornar essas tecnologias mais seguras são tanto aqueles que as utilizam quanto aqueles que as projetaram.
Dar voz a Deus e às vítimas
Diante dos desafios que a inteligência artificial representa para a luta contra o abuso na Igreja, o Santo Padre disse que há duas tarefas fundamentais: a primeira é dar “voz a Deus e às vítimas que o imploram, para que haja consciência do mal que está sendo feito” e, ao mesmo tempo, “desvendar a mentira de se esconder atrás da tecnologia para libertar a nossa consciência”. Por essa razão, Francisco exortou a “convocar os indivíduos, os projetistas dessas tecnologias e as autoridades competentes a impor limites e normas claras e concretamente mensuráveis para perseguir seu uso nocivo ou criminoso”.
Gratidão ao Santo Padre
A diretora do CEPROME, María Inés Franck, apreciou muito a mensagem do Papa Francisco, especialmente porque ela chega em um momento em que sua saúde está muito frágil. “O Santo Padre tem constantemente incentivado e confirmado nossos esforços para criar uma cultura de prevenção na Igreja. Suas reflexões aprofundam nossa compreensão dessa nova realidade e iluminam o caminho para continuarmos a lutar contra o abuso e criar espaços eclesiais que favoreçam a proteção de todos, especialmente das crianças e adolescentes em toda a América Latina”, comentou com gratidão a advogada argentina.
O 4º Congresso CEPROME é intitulado “Inteligência artificial e abuso sexual: um novo desafio para a prevenção” e foi organizado em conjunto com a Pontifícia Comissão para a Proteção de Menores da Santa Sé. O evento de três dias contará com a presença de especialistas internacionais que trabalharam com vítimas de abuso em seu processo de cura e busca por justiça.