Com a Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo, encerramos o Ano Litúrgico. Neste ano viveremos pela segunda vez a Jornada Diocesana da Juventude nesse domingo (transferida do Domingo de Ramos) com o tema: «Maria levantou-se e partiu apressadamente» (Lc 1, 39) que é também o tema da Jornada Mundial da Juventude em Lisboa em agosto de 2023. Além disso comemoramos nesse último domingo do ano litúrgico o dia do Cristão Leigo, data herdada das comemorações de Ação Católica, porém com a ênfase na presença do leigo/a na sociedade como sal da terra e luz do mundo. Neste final de semana também iniciamos com a Igreja do Brasil o 3º ano vocacional com o tema: “Vocação Graça e Missão” e lema: “Corações ardentes, pés caminho”. Aqui em nossa Arquidiocese o iniciaremos no sábado a tarde aos pés do Cristo Redentor. A nossa Conferência Episcopal propõe também a abertura da “Campanha para a Evangelização” que terá a coleta nessa intenção no terceiro domingo do advento. O tema deste ano da Campanha para Evangelização a ser trabalhado nas 4 semanas é: “Evangelizar: graça e missão que se dá no encontro”. É um final de ano litúrgico bem concorrido. Aqui em nossa arquidiocese, no sábado, antes do Advento, viveremos a 10ª Festa da Unidade em nossa Catedral Metropolitana: “Vocacionados e enviados para a missão”. Assim concluiremos o ano litúrgico com o apelo à comunhão e um olhar para a missão em nossa grande cidade para a qual somos vocacionados.
No próximo domingo, dia 27 de novembro, será o primeiro domingo do Advento, um novo Ano Litúrgico, início da preparação para o Natal. Ainda que as festas da Epifania, Páscoa e Ascensão sejam também festas de Cristo Rei e Senhor de todas as coisas criadas, a festa deste domingo foi especialmente instituída para nos mostrar Jesus como único soberano de uma sociedade que parece querer viver de costas para Deus. Tudo deve convergir para que Cristo reine. A solenidade de Cristo Rei foi instituída no Ano Jubilar de 1925 pelo Papa Pio XI com a Carta Encíclica “Quas Primas” (QP), com o qual coincidiu o 16º centenário do Concílio de Nicéia, que proclamara a divindade do Filho de Deus; este Concílio inseriu também em sua fórmula de fé as palavras: “cujo reino não terá fim”, afirmando assim a dignidade real de Cristo (cf. QP 2). Agora que estamos nos preparando para o 17º Centenário do Concílio de Nicéia é bom recordar esses passos.
Quando nós cristãos confessamos que Cristo é Rei, de que reinado estamos falando? A que Reino estamos nos referindo? Nós realmente acreditamos com todo o coração e confessamos com toda convicção que Jesus Cristo – e só ele! – é Rei: Rei do universo, Rei da história, Rei da humanidade, Rei da vida de cada pessoa humana, cristã ou não-cristã. Ele é Rei porque é Deus feito homem, é, como diz a Escritura, aquele “através de quem e para quem todas as coisas foram criadas, no céu e na terra… Tudo foi criado através dele e para ele… Ele é o Primogênito dentre os mortos” (Cl 1,1518).
Jesus veio ao mundo para buscar e salvar o que estava perdido; veio em busca dos homens dispersos e afastados de Deus pelo pecado. E como estavam feridos e doentes, curou-os as feridas. Tanto os amou que deu a vida por eles. Como Rei, vem para revelar o amor de Deus, para ser o Mediador da Nova Aliança, o Redentor do homem. No Prefácio da Missa fala-se de Jesus que ofereceu ao Pai “um reino de verdade e de vida, de santidade e de graça, de justiça, de amor e de paz”.
No Evangelho (Lc 23,35-43), se percebe esse desejo a través da conjunção “se”: “se é o Cristo, o escolhido de Deus!” – manifestam os príncipes dos sacerdotes; “se és o rei dos judeus” – dizem os soldados; “se és o Cristo” – diz um dos malfeitores crucificados com Jesus. Parece existir uma dúvida que no fundo é um “grito silencioso” que poderia ser traduzido dessa maneira: “Por favor, Senhor, se manifesta; por favor, me diz quem é você. Não aconteça que pela minha ignorância, venha eu a perecer. Se você é o Cristo, me salva”. Frequentemente, diante da aparente indiferença em relação à escuta do Evangelho, devemos escutar esse apelo oculto, silencioso, um grito suplantado.
O chamado “bom ladrão” teve coragem de expressar nitidamente o desejo do seu coração: “Jesus, lembra-te de mim, quando tiveres entrado no teu Reino!” (Lc 23,42). Não devemos temer as revoltas humanas contra Deus. Temos a esperança de que, um dia, essas pessoas possam dizer como esse pecador que, como era um bom ladrão, soube “roubar” o céu nos últimos minutos de vida. Tenhamos por certo: a verdade de Cristo é que o que todos os homens e mulheres desejam, sabendo ou não. Temos muitos exemplos históricos de pessoas que passaram a vida negando Cristo e que depois o encontraram na alegria da misericórdia.
A Liturgia desta festa coloca como antífona de entrada do Missal romano uma frase do Apocalipse que é surpreendente: “O Cordeiro que foi imolado é digno de receber o poder, a divindade, a sabedoria, a força e a honra. A ele a glória e poder através dos séculos!” Frase surpreendente, sim! Quem é Aquele que proclamamos Rei? O Cordeiro; e Cordeiro imolado. Cordeiro evoca mansidão, paz, fragilidade… Nosso Rei não é aquele que faz e acontece, aquele que passa por cima feito trator… Nosso Rei é o Cordeiro que foi esmagado na Cruz, Aquele que foi imolado pelo Pecado do mundo. O mundo passou e passa por cima do nosso Rei, refuta seu Evangelho, desdenha de sua Palavra, ridiculariza seus preceitos, calunia sua Igreja… Esse Rei é Aquele que foi crucificado, que foi derrotado e terminou sozinho, é o homem de dores prenunciado por Isaías. No Evangelho escutamos que zombaram e zombam dele: “A outros ele salvou. Salve-se a si mesmo, se de fato é o Cristo de Deus, o Escolhido! Tu não és o Cristo? Salva-te a ti mesmo e a nós!” (Lc 23,35.39).
Jesus não é Rei nos moldes dos reis da terra. O reinado de Cristo somente pode ser compreendido a partir da lógica do próprio Cristo: “O Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida em resgate por muitos” (Mc 10,45). Eis o modo que Cristo tem de reinar: servindo, dando vida e entregando a própria vida. Tão diferente dos reis da terra, dos políticos e líderes de ontem de hoje: “Sabeis que aqueles que vemos governar as nações as dominam, e os seus grandes as tiranizam. Entre vós não será assim…” (Mc 10,42s). Cristo é Rei porque se fez solidário conosco ao fazer-se um de nós, é Rei porque tomou nossa vida sobre seus ombros, é Rei porque passou entre nós servindo, até o maior serviço: entregar-se totalmente na Cruz.
Vivamos intensamente este tempo. Na próxima quinta-feira cantemos com todos no Brasil o nosso Te Deum reconhecendo a presença do Senhor em nossas vidas e agradecendo pelo ano litúrgico que se conclui. Aceitemos com alegria a nova caminhada a partir do próximo final de semana celebrando na história a presença do Senhor.