“Nada dá certo para mim”. “Ninguém nunca vai me amar”. “Você não faz nada direito”. Esses são exemplos de ideias limitantes, ou seja, de crenças limitantes que desenvolvemos a partir do nosso convívio em família, da nossa vida em sociedade ou de nossos traumas pessoais
“Éterrível ver como uma única ideia confusa, uma única fórmula sem significado, escondida na cabeça de um jovem, por vezes atuará como obstrução de uma artéria, impedindo a nutrição do cérebro, condenando sua vítima a definhar na abundância de seu vigor e plenitude intelectual.”
A citação é do filósofo francês Charles Sanders Peirce (1839–1914), um dos principais cânones da semiótica mundial, e ela casa perfeitamente com uma expressão em voga na psicologia contemporânea: crenças limitadoras.
O QUE SÃO CRENÇAS LIMITADORAS?
Nada dá certo para mim. Ninguém nunca vai me amar. Você não faz nada direito. Homem que é homem não demonstra emoção. Se eu expor meus sentimentos, serei rejeitado. Se eu mostrar quem eu sou, não serei respeitado como profissional. Seu irmão faz tudo melhor do que você. Você só será feliz se tiver um corpo dentro dos padrões sociais. Todos esses são exemplos de ideias limitantes, ou seja, de crenças limitantes que desenvolvemos a partir do nosso convívio em família, da nossa vida em sociedade ou de nossos traumas pessoais.
Eu mesmo, tendo passado a adolescência assistindo a filmes de Hollywood e me espelhado em ícones como James Dean, cresci com uma noção, ainda que inconsciente, de que o ato de fumar me deixava mais adulto e até mais viril. E só fui entender esse “gatilho” recentemente, mais de 20 anos depois, o que poderia ser tarde tratando-se de tabagismo.
ASSOCIAÇÕES EQUIVOCADAS
Como Peirce aponta com precisão, esse tipo de “ideia confusa” ou “fórmula sem significado” tem o poder de arruinar uma vida, como o cigarro poderia ter arruinado a minha. Quantos jovens não começam a beber pesado por associarem o ato de beber a um ideal (construído) de masculinidade, que tem o poder de arruinar uma ou mais vidas. O mesmo vale para o alcoolismo, para o ato de dirigir embriagado, para brigar na rua ou até mesmo para se alimentar mal.
Todos são comportamentos nocivos, tóxicos, com poder destrutivo, que muitos, sem refletir a respeito, levam para a vida, o que acaba por prejudicá-la. Socialmente, as mulheres são imbuídas de um pacote de crenças que possivelmente mais limitador do que os homens.
COMO LIDAR
O primeiro passo quando se tem o intuito de melhorar é refletir. Entender a natureza de um comportamento não mais desejado e identificar ao que ele está associado. Psicoterapia pode ser uma ferramenta fundamental nesse processo. Para dar mais um exemplo pessoal, tenho muita dificuldade de ler livros que não sejam de literatura, minha área de formação, embora tenha interesse por obras e autoreas de diversos outros campos. Essa trava, por assim dizer, também remete à minha adolescência, quando comecei a estudar bateria e logo mudei para a guitarra. O motivo foi simples: eu não tinha como ter uma bateria em casa e a guitarra é um instrumento muito mais compacto e portátil.
Mas depois de pagar para mim aulas de bateria no conservatório por um ano, meu pai não ficou muito contente. Na época ele falou: “Você não vai até o final em nada que você começa”. Ou seja, me protegendo das críticas do meu pai, passei a me ocupar só com atividades relacionadas à minha área, no caso a literatura, pelo menos até ler todos os romances e coletâneas de contos importantes já escritos e abrindo mão de todo o resto. O que limita não só a mim como o meu conhecimento.
Entender esses mecanismos nas nossas linhas de raciocínio é fundamental para que consigamos superá-los. E assim nos tornarmos melhores, mais maduros e mais felizes.