No nosso espaço Memória Histórica, 50 anos do Concílio Vaticano II, vamos continuar a tratar na edição de hoje da Constituição Dogmática Lumen Gentium sobre a Igreja.
No programa passado, vimos a importância da Constituição Dogmática Lumen Gentium sobre a Igreja, pois pela primeira vez em um Concílio, a Igreja olha para si mesmo, colocando fundamentos, balizas muito importantes, não somente para a Eclesiologia, mas também para a Cristologia. No Programa de hoje, o Padre Gerson Schmidt nos fala da Igreja como Sacramento de salvação:
Deixamos na última quarta-feira aqui uma pergunta no ar: a Igreja está sendo sacramento de salvação ao mundo, como propõe a constituição conciliar Lumen Gentium?
A Igreja é a salvação para o mundo, mas não entendido no sentido jurídico de que todos precisam ser batizados, crismados ou estarem dentro dos átrios da Igreja. A Igreja não é a única tábua de salvação. A frase de São Cipriano, “fora da Igreja não há salvação” tem que ser bem entendida. Toda a salvação vem de Cristo e os méritos de Cristo se operam na sua Igreja, hoje e sempre. Apesar de alguém não pertencer a Igreja, sem culpa sua e por não ter oportunidade, poderá se salvar pelos méritos de Cristo que se operam na sua Igreja, por meio dos sacramentos e sinais. Mas no número 14 da Lumen Gentium aponta para um perigo: “Não podem salvar-se aqueles que, sabendo que a Igreja Católica foi fundada por Deus por meio de Jesus Cristo como instituição necessária, apesar disso não querem entrar ou nela perseverar”(LG,14).
A Lumen Gentium significou uma renovação radical desta mentalidade de que todos deveriam ser batizados à força, de qualquer jeito ou receberem nos hospitais a “unção extrema”, como era entendida antigamente. Se todos deveriam pertencer a Igreja, era justo batizar ou converter as pessoas de qualquer jeito. Voltaríamos a fazer um proselitismo da época da Cristandade. Mas a Igreja deve realmente ser uma luz, um sacramento, um sinal de salvação aos povos. Portanto, ser Igreja não é um privilégio, como se estivéssemos salvos e abrigados estando dentro da Arca, como a de Noé. Ser Igreja é um chamado a responsabilidade de ser luz, de ser fermento, de ser sal da terra. Como o fermento, a luz o sal basta apenas um pouco para salgar, iluminar e fermentar, também o cristão, dentro da Igreja, é chamado ao serviço autentico de cumprir sua missão no mundo, de apontar o Reino dos céus.
Por isso é importante a introdução desse documento que dá o tom dos Padres conciliares. Diz assim o número um desse Documento:
1. A luz dos povos é Cristo: por isso, este sagrado Concílio, reunido no Espírito Santo, deseja ardentemente iluminar com a Sua luz, que resplandece no rosto da Igreja, todos os homens, anunciando o Evangelho a toda a criatura (cfr. Mc. 16,15). Mas porque a Igreja, em Cristo, é como que o sacramento, ou sinal, e o instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o género humano, pretende ela, na sequência dos anteriores Concílios, pôr de manifesto com maior insistência, aos fiéis e a todo o mundo, a sua natureza e missão universal. E as condições do nosso tempo tornam ainda mais urgentes este dever da Igreja, para que deste modo os homens todos, hoje mais estreitamente ligados uns aos outros, pelos diversos laços sociais, técnicos e culturais, alcancem também a plena unidade em Cristo.
Vejam bem… A salvação é Cristo, luz dos povos – A Igreja é sacramento dessa luz que ilumina todo o homem. Por isso, “como Cristo realizou a obra da redenção na pobreza e na perseguição, assim a Igreja é chamada a seguir pelo mesmo caminho para comunicar aos homens os frutos da salvação”(LG, 8). Preparada desde a criação do mundo, a Igreja é, em Cristo, a semente do Reino definitivo. Pela ação dos sacramentos, o Espírito constrói a unidade que o Pai preparou para o gênero humano. Dela a Igreja se faz sinal elevado em meio às nações.
Lumen Gentium abre o seu primeiro capítulo falando da Trindade. A luz torna-se aqui um mistério: o mistério da Igreja, enquanto sacramento da Trindade e sacramento da comunhão dos seres humanos como povo de Deus – que é uma das várias imagens da Igreja, talvez a mais forte que rende um capítulo inteiro dos oito totais.
O primeiro capítulo aborda a Igreja como mistério. Ela é sacramento de Cristo. Realiza a vontade salvífica do Pai na missão e obra do Filho, seu fundamento primeiro e último. É vivificada e santificada pelo Espírito. Torna-se na terra a semente do Reino que vai se realizando em figuras que constituem o Corpo Místico de Cristo, que é uma segunda imagem utilizada pela Lumen Gentium como comparativa da Igreja. Como mistério a Igreja é uma sociedade ao mesmo tempo visível e espiritual. A Igreja é o lugar, o espaço e a comunidade para encontrar o Pai, em Cristo pela santificação do Espírito.
Deixo aqui novamente essa interrogação que exige de todos nós, que fazemos parte do Povo de Deus e da Igreja: Como Igreja que somos todos, estamos sendo sinal e sacramento para o mundo, de que Jesus Cristo é o Salvador, por meio de nosso testemunho e de nossas palavras? Sem dúvida uma pergunta que nos intriga e não cabe uma resposta tão simples”.
Fonte: Rádio Vaticano