O Evangelho deste XXV domingo é dramático (Mc 9,30-37), pois revela a solidão de Jesus e a incapacidade nossa de compreender verdadeiramente a proposta do Senhor e caminhar com Ele. “Jesus e seus discípulos atravessavam a Galileia. Ele não queria que ninguém soubesse disso, pois estava ensinando a seus discípulos”. Para onde caminha Jesus? Seu caminho irá terminar em Jerusalém; é para lá que ele, enfim, se dirigirá (cf. Mc 10,1), para enfrentar seu destino final de morte e ressurreição por amor. E o que Jesus ensina, a sós, aos seus discípulos? “O Filho do Homem vai ser entregue nas mãos dos homens, e eles o matarão. Mas, três dias após a sua morte, ele ressuscitará”. Jesus vai preparando seus discípulos para algo que eles de modo algum esperavam: o Messias não será aquele glorioso, como imaginavam, mas passará pela humilhação, pelo fracasso e pela Cruz, como a primeira leitura de hoje (Sb 2,12.17-20) no-lo apresenta: “Os ímpios dizem: ‘Armemos ciladas… sua presença nos incomoda… Vejamos se é verdade o que ele diz. Se é filho de Deus, Deus o defenderá. Vamos pô-lo à prova com ofensas e torturas; vamos condená-lo à morte vergonhosa…”.
Em vários momentos do Antigo Testamento fala-se de uma sorte desastrosa para o Messias, mas nem Israel nem os discípulos prestavam atenção a isso; recordavam-se somente das passagens gloriosas, lembravam-se somente do que interessava… Por isso o Evangelho diz que “os discípulos não compreendiam estas palavras e tinham medo de perguntar”. Parece que Jesus falava para surdos, que não conseguem de modo algum escutar realmente o que ele está dizendo… que não conseguem sintonizar realmente com o Senhor.
É terrível e trágico constatar a distância enorme entre o Mestre e os discípulos, a falta de sintonia, de compreensão: no caminho, no caminho cristão, Jesus fala da Cruz, da vida que ele entregará como serviço de amor (este é o caminho cristão, o caminho do cristão!); os discípulos falam de ser o maior, de glórias, de privilégios! Não é assim, ainda hoje? Não somos assim, no caminho? O caminho de Jesus é o do serviço que dá vida, que se entrega, que encontra, precisamente no servir, a liberdade e a plenitude. Num outro momento do Evangelho, o Senhor nos adverte gravemente: “Sabeis que aqueles que vemos governar as nações as dominam, e os seus grandes as tiranizam. Entre vós não será assim: ao contrário, aquele que dentre vós quiser ser grande, seja o vosso servidor, e aquele que quiser ser o primeiro dentre vós, seja o servo de todos. Pois o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida em resgate por muitos” (Mc 10,42-45).
A segunda leitura é da Epístola de São Tiago – Tg 3,16-4,3 –, revela um quadro desolador: invejas, rivalidades, brigas na comunidade, conflitos interiores no coração dos cristãos… E por quê? Porque, ao invés de realmente abraçarmos o caminho do Senhor, que passa pela cruz como serviço de amor a Deus e aos outros, amor desinteressado, que, dando a vida, encontra vida, seguimos uma lógica perversa e pecaminosa, a lógica do homem velho, com suas paixões e seus desejos de posse, de domínio, de autoafirmação: “Só quereis esbanjar o pedido nos vossos prazeres…” ou seja, buscais somente vossos interesses, totalmente desligados daquele que é o caminho proposto pelo Senhor Jesus. Esqueceis a exortação do Apóstolo São João: “Aquele que diz que permanece nele deve andar como ele andou” (1Jo 2,6).
No fundo, no fundo, o desafio atual para os cristãos é o mesmo de nossas origens, na Igreja primitiva: compreender e levar a sério a linguagem da Cruz, a linguagem do amor que se doa, que acolhe, que não busca seu próprio interesse nem sua própria glória e satisfação, sobretudo se isso é às custas da dignidade e da felicidade do irmão. O desafio é levar a sério o caminho de Jesus.
“A sabedoria que vem do alto é, antes de tudo, pura, depois pacífica, modesta, conciliadora, cheia de misericórdia e de bons frutos, sem parcialidade e sem fingimento…” Esta sabedoria é que deveria nortear nossas relações como cristãos! Esta sabedoria, tão bendita, porque é fruto daquele amor-caridade que Jesus viveu e nos mandou viver: “o amor é paciente, a caridade á prestativo, não é invejoso, não se ostenta, não se incha de orgulho. Nada faz de inconveniente, não procura o seu próprio interesse, não se irrita, não guarda rancor. Não se alegra com a injustiça, mas se regozija com a verdade. Tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta”. Que o Senhor que, tendo nos amado, amou-nos até o extremo (cf. Jo 13,1), no-lo conceda, para que sejamos realmente seus discípulos, com palavras e com a vida. Amém!