“Escutem o que eu o meu filho amado diz”

    Na primeira parte do Evangelho de Marcos, Jesus é incompreendido pelos “de fora”, acusado de blasfemar, de ser um possesso, louco e impuro. E os discípulos, o que pensam dele? Pedro, representando todos os que pretendem se unir ao Mestre, afirma que Jesus é o Messias. Mas Jesus proíbe severamente aos discípulos de falar alguma coisa a respeito dele. Marcos insere aqui o primeiro anúncio da paixão. E Pedro, representando mais uma vez os discípulos, se torna “Satanás” porque pretende que o messianismo de Jesus se baseie nos moldes tradicionais. Jesus é incompreendido também pelos “de dentro”.
    Será que a proposta messiânica de Jesus vai vencer? A transfiguração responde afirmativamente. Jesus vai vencer. Seu projeto será vitorioso porque é garantido pelo Pai, que o declara seu Filho amado, pedindo que todos escutem o que Ele diz.
    Jesus sobe a uma alta montanha, com Pedro, Tiago e João.
    O Evangelista Marcos afirma que “as roupas de Jesus ficaram brilhantes e tão brancas como nenhuma lavadeira sobre a terra poderia alvejar”. Essa transformação aponta para a realidade da ressurreição de Jesus. Ninguém, nem mesmo a morte, poderá deter o projeto do Reino, pois o Mestre vai ressuscitar depois de três dias.
    Moisés e Elias – que representam, respectivamente, a Lei e os Profetas, isto é, todo o Antigo Testamento – se fazem presentes e conversam com Jesus. O comparecimento deles vem dar testemunho de Jesus: Ele é o libertador definitivo, prometido e prefigurado nos líderes do passado. O Antigo Testamento testemunha que Jesus veio para libertar mediante a entrega total de sua vida.
    Nuvem, esplendor, personagens e, sobretudo, a voz que sai da nuvem são modos de indicar a presença de Deus no acontecimento. O próprio Pai garante que Jesus é seu Filho amado, ao qual é preciso dar adesão. Aqui temos um dos pontos altos do Evangelho de Marcos. Desde o início, afirma-se que Jesus é Filho de Deus e, ao ser batizado, o Pai diz: “Tu és meu Filho amado, em ti encontro o meu agrado”. O termo “filho” recorda o Salmo 2,7, onde um rei é declarado filho de Deus. Jesus é esse Rei, mas seu messianismo passa pela entrega da vida.
    Pedro representa nós todos, quando pretendemos viver a alegria da ressurreição    sem passar pela entrega e pela morte.
    É impossível saber quem é Jesus sem ir com Ele até a cruz, sem passar pela morte, sem voltar à Galileia, para anunciar aí, por meio de uma prática libertadora, que o Mestre está vivo. Pedro – e todos nós com ele – sofremos de ignorância crônica em relação a quem é Jesus.
    Por isso é que “escutar o que Ele diz” significa ir com Ele até o fim. E não nos assustemos: no Evangelho de Marcos, quem confessa Jesus como “Filho de Deus” é justamente um pagão, alguém que jamais estivera com o Mestre nas suas andanças pela Galileia.
    “E, de repente, olhando em volta, os discípulos não viram mais ninguém, a não ser somente Jesus com eles.”. Jesus é a única autoridade credenciada pelo Pai. Ele está conosco para nos ajudar a descer do monte e a vencer o medo e a perplexidade.