O terrorismo das fofocas

    Não à toa, um dito popular diz que a arma mais perigosa da face da terra é a língua humana. Engole nações inteiras, destrói famílias, aniquila o semelhante com um sorriso nos lábios e veneno no coração. Por trás de uma língua ferina há sempre a bolsa abastecida de um veneno mais mortífero que o das mais peçonhentas serpentes que se arrastam aos nossos pés. A língua mata mais que as armas da imbecilidade humana. Um comentário sem o lastro da verdade, uma observação maldosa, uma ironia gratuita, uma afirmativa preconceituosa, uma anedota racista, uma palavra solta, sem que dela se meçam as consequências, tudo isso destrói vidas.
    Seguindo esse raciocínio, recentemente o papa foi até radical ao expor sua opinião: “Muitas vezes é melhor brigar com um amigo do que falar por trás”. Mas como, um papa aconselhando contendas? Isso mesmo: é melhor colocar às claras eventuais divergências, mesmo que estas custem alguns sopapos mútuos, do que deixar crescer situações de fofocas e diz-que-diz gratuitos, mas devastadores. Foi incisivo seu conselho: “Por favor, que não exista entre vocês o terrorismo das fofocas… Joguem isso fora! Que haja fraternidade! E se você tem algo contra o seu irmão, diga-o na cara… Algumas vezes vai acabar em socos; não é problema. É melhor isso do que o terror das fofocas”, disse Francisco.
    O controverso conselho não difere dos ensinamentos de Cristo. Que seu sim seja sim e seu não, não. “Eu vos digo, no dia do juízo os homens prestarão contas de toda palavra vã que tiverem proferido. É por tuas palavras que serás justificado ou condenado” (Mt 12, 36-37). Quer mais? Então anote: “Pois o que dissestes às escuras será dito à luz; e o que falastes ao ouvido, nos quartos, será publicado de cima dos telhados” (Lc 12,3). Ou então essa: “Dizes isso por ti mesmo, ou foram outros que to disseram de mim?” (Jo 18.34). A fofoca que corria solta no processo de julgamento de Cristo foi um dos fatores que forçaram sua condenação. A fofoca matou Jesus.
    Mesmo assim, o livro dos Provérbios já alertava o povo de Deus quanto ao perigo das fofocas. Das páginas bíblicas é o que mais referencias traz sobre o assunto. “Quem despreza seu próximo demonstra falta de senso, o homem sábio guarda silêncio. O perverso trai os segredos” (11,12-13). “O falador fere com golpes de espada, a língua dos sábios, porém, cura” (12,18). “O perverso excita questões, o detrator separa os amigos” (16,28). “A boca do tolo é a sua ruína, seus lábios são uma armadilha para a sua própria vida. As palavras do delator são como gulodices, penetram até às entranhas” (18, 7-8). “O mexeriqueiro trai os segredos, não te familiarizes com um delator” (20,19). Ou, por fim: “Quem vigia sua boca e sua língua preserva sua vida da angústia” (21,23).
    A milenar sabedoria dos povos faz da prudência ao falar uma virtude. Nada há de mais vil e baixo que o falso testemunho, a língua solta. Palavras são como penas ao vento. Tente ajuntá-las depois de espalhá-las sob brisa qualquer. Da mesma forma nossas calúnias e difamações, nosso afirmar sem provas, nosso dizer por ouvir falar… Freio na língua é, portanto, virtude cristã, que impossibilita a ação da mais devastadora e mortífera das armas humanas, a fofoca.
    Lembrando aos Romanos o perigo da fala sem critérios, Paulo recorreu a trechos das Escrituras, para falar que o pecado da língua é universal, pois que todos nós estamos sujeitos a ele. “A sua garganta é um sepulcro aberto; com as suas línguas enganam; veneno de áspide está debaixo dos seus lábios (Sl 5,10 ;139,4). A sua boca está cheia de maldição e amargor” (Sl 9,28). E concluiu: “Ora, sabemos que tudo o que diz a Lei, diz aos que estão sujeitos a ela, para que toda boca fique fechada”… (Rom 3, 13-19). Porque da Palavra de Deus só exala o perfume da Verdade, a Lei do Amor.