Nono Domingo do Tempo Comum

    Depois de termos manifestado publicamente nossa adoração Eucarística com a solene e concorrida procissão do Santíssimo Corpo de Cristo na última quinta-feira, temos a graça de celebramos neste final de semana, o nono Domingo do Tempo Comum. A liturgia deste Domingo, fala que Jesus se torna visível a face do Deus criador e libertador, ápice da fé de Israel e da experiência religiosa daquele povo. Essa experiência tão profunda era celebrada e revivida a cada sábado. Mas, com o passar do tempo, o descanso sabático ficou marcado pelo ritualismo e legalismo. Então Jesus veio restaurar o sentido do sábado como celebração da vida em plenitude, da libertação e da liberdade.

    Na primeira leitura deste domingo – Dt 5,12-15 – sábado é dia de descanso e de estar com o Senhor que nos libertou da escravidão do pecado e quer alimentar nossa vida de filhos adotivos de Deus. É Dia de Ação de Graças pela semana que passou! Na leitura, vemos que o sábado é o elo entre eternidade e tempo, porque, voltando-se totalmente para Deus no louvor sabático, o israelita dava um sentido de eternidade a toda ação temporal. No sábado se santificava tudo que estava dentro do tempo. No sábado a humanidade aproximava a criação inteira do seu Criador. O ser humano, consciência da criação, representava todas as obras de Deus e, em nome delas, louvava o Criador. O sábado não era um descanso no sentido de tirar um dia de folga do trabalho. Era muito mais que isso, era uma liberdade para o culto e para um novo modo de relações sociais e ecológicas. No sábado o servo descansava igual ao patrão, o animal igual ao ser humano. E este entrava no repouso de Deus, na intimidade com o Criador-libertador, ambos como sujeitos livres, numa relação de amor, a qual somente é possível entre iguais, entre sujeitos livres. Por isso Deus o libertou, para que pudessem relacionar-se face a face, livremente, dando e recebendo amor.

    Na segunda leitura – 2Cor 4,6-11 – o sofrimento é fruto do pecado, mas Jesus nos quer parceiros de sua Cruz para a salvação do mundo. Pela Cruz, Jesus chegou à glória. Este é o caminho. Sabemos que sem as luzes de Deus vindas por intermédio do Cristo, o ser humano frágil jamais conseguiria suportar semelhante pressão, uma vida como a acima, descrita com termos tão fortes. Por isso o apóstolo reconhece a própria fragilidade, que é uma situação existencial humana da qual todos são partícipes, e ele não é uma exceção.

    Somos vasos de barro, somos frágeis. Mas as luzes de Deus em nós nos tornam capazes de participar da cruz de Cristo para sermos realmente livres como ressuscitados. Livres de toda dor, de todo sofrimento, do pecado e da morte. “Pois para a liberdade Cristo nos libertou” (Gl 5,1).

    No Evangelho – Mc 2,23-3,6 – no sábado, o povo de Israel recordava que Deus havia posto um fim à escravidão do Egito. Era tempo de celebrar a libertação. O povo de Israel havia recebido a liberdade para a renovação social e ecológica, pois todos descansavam (ricos e pobres, escravos e livres, ser humano e natureza). Mas, principalmente, liberdade para o culto. Para Jesus, a libertação e liberdade celebradas no descanso sabático são sinais da ressurreição e do mundo futuro; por isso, ele restaura a saúde e a dignidade das pessoas em dia de sábado.

    O sábado tem sentido de descanso semanal, no qual refazemos nossas forças físicas e espirituais. Moisés reivindica o descanso semanal para um povo escravo e explorado no Egito, invocando a justificativa que Deus criou o mundo em seis dias e descansou no sétimo. O descanso semanal não é apenas descanso físico; é, prioritariamente, um descanso espiritual: agradecer e louvar a Deus que libertou o Povo de Israel da escravidão egípcia e a nós, da escravidão moderna! Sábado (ou Domingo para nós) é “Dia do Senhor e para o Senhor!”.

    O Sábado é para o homem e não o contrário: “O homem escravo do sábado!” Os judeus cercaram o sábado de mil leis protetoras, escravizando o homem que nem podia preparar sua própria refeição sabática ou dominical! E nem mesmo se podia praticar o bem em favor de um necessitado! Jesus, porém, cura em dia de sábado, perdoa em dia de sábado e enche de alegria o coração dos pobres enfermos e paralíticos socorridos em suas enfermidades em dia de sábado!

    Contudo, em algumas das vezes o homem moderno não sabe o que fazer em dia de descanso dominical esquecendo a primeira finalidade de celebrar a ressurreição de Jesus. Quando a fé desaparece, a alma morre à míngua! O pecado escraviza; mas a virtude enriquece e liberta! As comunidades cristãs celebram o dia do Senhor no primeiro dia da semana porque foi neste dia que Jesus se manifestou como ressuscitado.

    Como recordou São João Paulo II na carta “Dies Domini” “Por outro lado, o fato de o sábado ser o sétimo dia da semana fez considerar o dia do Senhor à luz de um simbolismo complementar, muito apreciado pelos Padres: o domingo, além de ser o primeiro dia, é também « o oitavo dia », ou seja, situado, relativamente à sucessão septenária dos dias, numa posição única e transcendente evocadora, não só do início do tempo, mas também do seu fim no « século futuro ». S. Basílio explica que o domingo significa o dia realmente único que virá após o tempo atual, o dia sem fim, que não conhecerá tarde nem manhã, o século imorredouro que não poderá envelhecer; o domingo é o prenúncio incessante da vida sem fim, que reanima a esperança dos cristãos e os estimula no seu caminho. Nesta perspectiva do dia último, que realiza plenamente o simbolismo prefigurativo do sábado, S. Agostinho conclui as Confissões falando do eschaton como « paz tranquila, paz do sábado, que não entardece » A celebração do domingo, dia simultaneamente « primeiro » e « oitavo », orienta o cristão para a meta da vida eterna”.

             E ainda acrescenta ao final dessa carta: “A iminência do Jubileu, queridos Irmãos e Irmãs, convida-nos a aprofundar o nosso compromisso espiritual e pastoral. De facto, é este o seu verdadeiro objectivo. No ano em que aquele vai ser celebrado, muitas iniciativas o caracterizarão, dando-lhe aquele timbre singular que não pode deixar de ter a conclusão do segundo e o início do terceiro Milénio da Encarnação do Verbo de Deus. Mas este ano e este tempo especial passarão, dando lugar à expectativa de outros jubileus e de outras datas solenes. O domingo, com a sua ordinária « solenidade », permanecerá a ritmar o tempo da peregrinação da Igreja até ao domingo sem ocaso.

    Exorto-vos, portanto, amados Irmãos no episcopado e no sacerdócio, a trabalhar incansavelmente, unidos com os fiéis, para que o valor deste dia sagrado seja reconhecido e vivido cada vez melhor. Isto produzirá frutos nas comunidades cristãs, e não deixará de exercer uma benéfica influência sobre toda a sociedade civil.

    Os homens e as mulheres do terceiro Milénio, ao encontrarem a Igreja que cada domingo celebra alegremente o mistério donde lhe vem toda a sua vida, possam encontrar o próprio Cristo ressuscitado. E os seus discípulos, renovando-se constantemente no memorial semanal da Páscoa, tornem-se anunciadores cada vez mais credíveis do Evangelho que salva e construtores ativos da civilização do amor”.

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