Quando pronunciamos essa verdade em nossa profissão de fé, o juramento que fazemos diante do altar na oração do Creio, não paramos para pensar no que estamos dizendo. Corremos o risco de um falso juramento. Afinal, entendemos plenamente o mistério da ascensão do Cristo? O que significa esse subir aos céus; onde é esse céu? Estaria distante da nossa realidade, do plano metafísico em que vivemos ou seria uma das muitas metáforas que Cristo usou para se referir a uma nova vida?
Como vemos, o assunto extrapola nossa realidade, vai além desta. Pra começar, não devemos imaginar o céu num contexto de lugar, acima de nossas cabeças. Antes, Cristo nos desafiou a “olhar as coisas do alto” com os olhos da fé, o dom do entendimento. Este nos aponta um horizonte maior, um plano existencialista que ultrapassa a realidade física, vai além desta. Este é o “céu”, a vida plena, a plenitude do corpo e da alma que o ensinamento cristão contrapõe à ciência humana. Portanto, não é um lugar determinado, mas um novo estágio, uma nova existência, outra forma de vida que ainda não experimentamos, mas que podemos imaginar com a graça de Deus.
Nosso céu começa aqui. A vida santificada, em sintonia com a Palavra e as Promessas de Deus, em especial aquelas reveladas por Cristo, conduzem-nos a essa experiência celestial ainda dentro de nossa realidade terrena. “Isso é o que vos disse enquanto estava convosco. Mas o defensor, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, ele vos ensinará tudo e vos recordará o que eu vos tenho dito” (Jo 14, 25-26). A confirmação de tudo veio em Pentecostes, a graça que nos foi dada para melhor entender esse mistério. Aos que vivem na escuta da Palavra e observância dos ensinamentos que nos deixou o Mestre, é fácil entender e acreditar nos mistérios da vida celestial, a maior graça que um dia poderemos merecer. Esse é o caminho, a meta que buscamos.
Subir aos céus foi uma primazia de Cristo. Atrás dele seguiram todos os homens e mulheres da antiga aliança, resgatados na graça do Paraíso, que aguardavam a reconciliação humana com seu Criador. Atrás dele seguiremos nós. Nosso Messias foi o agente dessa história, “novo céu e nova terra” recriados com seu ato redentor. O caminho do céu está livre, desde então. Sua ascensão o colocou “à direita do Pai” e deixou-nos uma promessa de retorno “para julgar os vivos e os mortos”. Agora seguimos seus passos, caminhamos também para essa nova realidade de vida, onde todos, fiéis e infiéis, crentes ou não, santos e pecadores, um dia nos colocaremos frente a frente desse trono de luz, diante do Pai, do Filho e do Espírito que “dá a vida e procede do Pai e do Filho”. Quer queira, quer não, todos “subiremos” um dia. Agora, quer queira, quer não, muitos “cairão” e verão quão desgraçados foram em não aceitar o sublime desafio que nos deixou Jesus: “Se me amásseis, ficaríeis alegres”…
Essa alegria é reveladora. Não aquela que o mundo e suas fantasias nos fazem experimentar toscamente, fracamente, ilusoriamente. A alegria de Jesus é princípio de vida celestial, começo do céu em vida. Esta ninguém destrói, nem destruindo nossas existências, condenando nossa fé ou ironizando nossa vida de renúncias e sacrifícios por causa do Cristo. Quem vive a alegria dessa descoberta em suas vidas, no aqui e agora de uma existência atribulada, contraditória com o céu que sonhamos, o mundo que imaginamos mais justo e humano, inicia sua ascensão aos céus. Esse céu que começa aqui, com a alegria das revelações cristãs. Está mais perto do que imaginamos. Basta olhar para o “alto”, acreditar nas promessas daquele que “subiu aos céus” e nos deixou um desafio: “Disse-vos estas coisas para vos preservar de alguma queda” (Jo, 16,1).