É de todos conhecida a divisão norte e sul que polariza nosso mundo. Ao norte os países ricos, que ditam regras, impõem seu poderio econômico e bélico. Ao sul os pobres. O Brasil conseguiu inverter essa tese, mostrando um país dividido entre ricos e pobres, porém inversamente contrário à tese globalizada: ao sul os Estados ricos, ao norte os pobres. Nenhum preconceito nesta constatação, mas o resultado político de uma polarização federativa e tradicionalmente unida na sua definição patriótica é, no mínimo, algo que traz preocupações. Como governar uma nação nitidamente dividida?
De antemão, a leitura que se faz é que o novo mandato presidencial tem pela frente o desafio de reconstruir a unidade. Uma tarefa que exigirá tato e sensibilidade, deixando de lado ideologias e quimeras partidárias, se o que interessa ao país é a manutenção da ordem democrática e a coesão de um povo que sempre se mostrou amante de sua unidade na diversidade. É fato que a questão social pesou sobremaneira no resultado das urnas. É fato que algo novo deve surgir nos meios políticos para restabelecer o que temos de preciosidade como nação, ou seja, o sentimento patriótico de um povo que sempre primou pelo amor à bandeira, às riquezas naturais, ao jeito de ser de sua gente, heterogênea na raça, mas homogênea na eterna esperança de um país de futuro. As urnas nos dividiram, mas a esperança ainda é a mesma.
O que assusta é a possibilidade dessa divisão ganhar proporções além do que ela possa ter representado politicamente. Não queremos uma nação dividida. Nem entre classes sociais, nem entre conceitos partidários, nem mesmo por questões raciais ou religiosas que sejam. Nossa maior riqueza sempre foi e sempre será o amor à pátria. Se hoje o que se nos afigura é um racha político, disso temos que nos orgulhar, pois prova ao mundo uma democracia amadurecida e exemplar, um sistema político que respeita a voz do povo, mesmo que essa voz se fracione quase que igualitariamente, dentro da famosa margem do empate técnico. A verdade é que ambos os lados saem vitoriosos desse embate, numa manifestação cívica sem precedentes na nossa história. Importa agora buscar o consenso e manter nossos ideais de uma sociedade mais justa e fraterna.
Como povo de fé, vamos continuar dando “a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”. A continuidade de um sistema político oferece poucas mudanças. Mas uma nação “cujo Deus é o Senhor” há de continuar exercitando sua fé e alimentando sua esperança de construção de um mundo melhor, sem divisões norte-sul, pobres e ricos, crentes e ateus, mas filhos de uma mesma família, portadores de um ideal comum. A divisão humana é sempre uma chaga social. Jesus, ao penetrar o pensamento sectário que dividia seus discípulos, cunhou um conselho bem a propósito: “Todo reino dividido contra si mesmo será destruído. Toda cidade, toda casa dividida contra si mesma não pode subsistir. Se Satanás expele Satanás, está dividido contra si mesmo. Como, pois, subsistirá o seu reino?” (Mt 12,25). Paulo, zeloso com a questão da unidade, foi sucinto em seu conselho; “Rogo-vos, irmãos, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo, que todos estejais de pleno acordo e que não haja entre vós divisões. Vivei em boa harmonia, no mesmo espírito, e no mesmo sentimento” (1Cor 1,10). Em Ezequiel encontramos a promessa de unificação do Povo de Deus, como princípio de bênçãos celestiais: “Farei que, em sua terra… não formem mais que uma nação, que não possuam mais que um rei. Não mais existirá a divisão em dois povos e em dois reinos” (Ez 37, 22).
Pra frente, Brasil! Se é verdade que cada povo tem o governo que merece, também é verdade que cada governo conhece o povo que tem. Nossas necessidades e nossos méritos, sonhos e esperanças, alegrias e decepções não tem cores, nem bandeiras. São nosso bem comum, cuja realização depende de nós, não de um grupo político, de uma classe social ou pensamento religioso. Depende de você.