De novo o trabalho

     

    No meio da próxima semana, estaremos celebrando o Primeiro de Maio.

    Por mais que tenha perdido sua fisionomia de luta social, o trabalho permanece na ordem do dia. Continuam válidas as palavras da encíclica Laborem Exercens, afirmando que o trabalho é “ uma chave, provavelmente a chave essencial, de toda a questão social”

    A recente onda de “desregulamentação social”  atingiu o trabalho de maneira frontal. Algumas conquistas conseguidas a duras penas, durante décadas de lutas sindicais, se diluem e perdem força social.

    O descanso semanal ficou seriamente comprometido. E´ crescente o número de empresas que nem interrompem suas atividades nos finais de semana. Ou até  fazem dos finais de semana a oportunidade para suas promoções especiais. Desta maneira, é relegado a segundo plano o direito dos trabalhadores ao descanso coletivo.

    Até a programação pastoral ficou comprometida.  É difícil encontrar um horário que seja propício à comunidade, pois a necessidade da sobrevivência pelo trabalho inviabiliza a participação de muitas pessoas nos encontros de pastoral.

    A exploração do trabalho é uma tendência que emerge, sob formas novas, de diversas maneiras. Já acabou o tempo da escravidão. Mas ainda encontramos situações de trabalho escravo, que o poder público procura combater com severidade.

    A provável etimologia da palavra “trabalho” projeta uma luz sobre a complexa realidade que esta palavra procura transmitir.  A palavra viria do latim, do vocábulo “tripalium”, que era instrumento de tortura. O trabalho forçado era meio de tortura dos escravos.

    Pode ser que o subconsciente coletivo da sociedade ainda esteja condicionado à etimologia da palavra “trabalho”.

    O conceito de trabalho passou por uma metamorfose muito grande. De sua idéia negativa, como instrumento de tortura para escravos, chegou-se ao valor do trabalho humano, impregnado de direitos, que precisam ser consignados em legislação adequada.

    Esta visão positiva do trabalho fica confirmada pela teologia,  que vê no trabalho a vocação do ser humano de cuidar da criação, e de ativar suas potencialidades.

    Entre estes dois extremos, encontramos critérios de discernimento, para conferir, por exemplo, se existe, ou não, “trabalho escravo”.

    Não podemos partir do preconceito de que todo trabalho é uma tortura imposta ao trabalhador, como no tempo do império romano. Não podemos continuar com a mentalidade equivocada, de achar que o trabalho é sempre  uma escravidão, da qual devemos nos livrar a qualquer custo.

    Ao mesmo tempo, o trabalho não pode se tornar instrumento de exploração, privando os trabalhadores e trabalhadoras de sua liberdade e de sua dignidade humana. O trabalho, mesmo o assalariado, precisa resguardar todos os direitos que a legislação social já lhe garantiu.

    O direito à sobrevivência precede ao direito de trabalhar. Por isto pode ser justificada uma política voltada a garantir os direitos à vida digna também para as pessoas que não têm, ou não podem ter trabalho. Mas isto não deve se constituir em motivo para  cair na dependência e menosprezar o valor da trabalho humano.

    Um povo que perde o sentido do trabalho está destinado a perder sua identidade, e frustrar seu futuro, fazendo da dependência o caminho de sua verdadeira escravidão.