Comunicação e encontro

    No ano passado, no dia 4 de dezembro, comemoramos o cinquentenário dos dois primeiros documentos do Concílio Vaticano II. Um deles, o “Inter Mirifica”, abriu o aprofundamento de um tema que seria crucial nos anos seguintes, que é sobre a Comunicação. Em um momento inspirado, em pequeno documento que abriu as portas para outros mais profundos e importantes, os padres conciliares, movidos pela ação do Espírito Santo, colocaram a Igreja num dinamismo importantíssimo. Nesse documento se criou o “Dia Mundial das Comunicações Sociais”, e já estamos vivendo a sua 48ª edição. O Papa escolhe o tema anual e emite uma mensagem à Igreja e ao mundo para nortear a reflexão. Essa mensagem, neste ano, foi tornada pública à véspera do Dia do Jornalista Católico, que é o dia de São Francisco de Salles, 24 de janeiro de cada ano. Neste ano o tema é: “Comunicação a serviço de uma autêntica cultura do encontro” que será celebrado no dia 01 de junho de 2014, data em que se celebra o Dia Mundial das Comunicações Sociais, Dia Nacional da Imprensa, Início da Semana de Orações pela Unidade Cristã, dentro da novena em preparação a Pentecostes, no dia da Festa da Ascensão do Senhor.
    O Santo Padre Francisco inicia a mensagem recordando a velocidade do desenvolvimento tecnológico e progresso científicos, que tem evoluído de tal forma a tornar o mundo como que num planeta na palma de nossas mãos. Tudo parece estar muito perto e acessível demais, atendendo aparentemente a [quase] todos, conforme as demandas econômicas de cada camada social. Graças à inteligência humana, dom de Deus, o progresso tecnológico e científico vai criando e recriando novos produtos que alimentam o mercado de consumo para satisfazer respostas às necessidades que também nós vamos inventando em nossos empreendimentos.
    Mas o Papa vai mais além. Tudo o que vem em avalanche no mercado físico ou virtual a cada segundo está colaborando no verdadeiro encontro interpessoal? É uma boa provocação. Nota-se que a internet é “algo verdadeiramente bom, um dom de Deus”, afirma o Papa, lembrando que é “importante a presença da Igreja no mundo da comunicação para dialogar com o homem de hoje e levá-lo ao encontro com Cristo: uma igreja companheira de estrada sabe pôr-se a caminho com todos”.
    A rapidez das mudanças de tecnologias cada vez mais exige atualizações. E o ser humano? E o próximo? E o outro? Quanto tempo dura minha relação com as pessoas? As redes sociais estão aí para congregar a todos como que numa única nação global. Com essas tecnologias estamos conectados 24 horas, basta ligar nosso computador ou puxar o smartphone do bolso e veremos um universo que não dorme. Uma verdadeira aldeia global compartilhando informações em tempo real, sem limites geográficos. Porém, podemos até estar bem informados sobre os principais acontecimentos do mundo da política, da economia, do esporte, das artes, da ciência etc., mas será que sabemos o que está acontecendo com o nosso próximo? É aí que mora o “vírus” do isolamento, que impede uma pessoa de encontrar-se com a outra, de viver profundamente a maravilha da experiência do encontro presencial com o outro.
    O Papa Francisco dialoga a maravilha da modernidade com o encontro do homem com o próprio homem na figura do Samaritano. Assim como as máquinas são infectadas pelos vírus que atacam os sistemas destruindo programas e conteúdos, assim o ser humano é infectado pelo isolamento. Mas a exemplo do encontro com o outro e no gesto da gratuidade [compadecer-se com o samaritano], é possível fazer a varredura com o antivírus da unidade que fortalece as relações humanas e dignifica o homem. É a alegria do encontro! Uma conexão de pessoas que não se interrompe e que não deve ser descartada como um smartphone que após 36 meses de uso se torna obsoleto. O encontro com o outro não é consequência do marketing pessoal e, portanto, não está na categoria da cultura do descartável.
    O Santo Padre nos recorda a importância do diálogo diante da carga de informações que nos chegam. Cada fonte deve transmitir de forma imparcial, porém, é de conhecimento que interesses econômicos e políticos governam o direcionamento das informações. Assim sendo, é necessário apurar uma profunda leitura crítica da comunicação, ou como salienta o papa “Não tenhais medo de vos fazerdes cidadãos do ambiente digital”.
    A preocupação com o social está muito presente nessa mensagem, que fala da “distância escandalosa que existe entre o luxo dos mais ricos e a miséria dos mais pobres”. Ainda: “frequentemente, basta passar pelas ruas duma cidade para ver o contraste entre os que vivem nas calçadas e as luzes brilhantes das lojas”. “Estamos já tão habituados a tudo isso que nem nos impressiona”. Por isso, recorda: “é preciso saber-se inserir no diálogo com os homens e mulheres de hoje para compreender os seus anseios, dúvidas, esperanças, e oferecer-lhes o Evangelho, isto é, Jesus Cristo, Deus feito homem, que morreu e ressuscitou para nos libertar do pecado e da morte”.
    “Como pode a comunicação estar ao serviço de uma autêntica cultura do encontro?” pergunta o Santo Padre. “O que significa encontrar uma pessoa? É a famosa pergunta do “quem é meu próximo”? E para isso a mensagem propõe que a “rede digital pode ser um lugar rico de humanidade: não uma rede de fios, mas de pessoas humanas”. Recorda que “graças à rede, pode a mensagem cristã viajar “até aos confins do mundo”. “Somos chamados a testemunhar uma Igreja que seja a casa de todos”.
    Neste sentido, a Igreja já tem realizado muito nestas últimas décadas e continuará fazendo sempre mais para aproximar os homens e mulheres de forma virtual e/ou presencial uns dos outros, a fim de que “todos sejam um”, como ordenou Nosso Senhor Jesus Cristo. A internet é um novo púlpito, os meios de comunicação de massa são também os novos templos, o mundo inteiro é uma só paróquia? A Igreja, no contexto da comunicação, precisa levar calor, inflamar o coração. O “testemunho cristão se faz com a vontade de se doar aos outros através da disponibilidade para se deixar envolver, pacientemente e com respeito, nas suas questões e nas suas dúvidas, no caminho da busca da verdade e do sentido da existência humana”.
    Diante de um mundo fragmentado e cada vez mais dependente da comunicação, a Igreja quer colaborar para que a “cultura do encontro” entre pessoas construa um mundo mais fraterno e humano. Um profundo apelo do Santo Padre para os nossos tempos!