O servo bom e fiel

    Através da parábola dos talentos Jesus retrata o servo bom e fiel que bem administra os dons recebidos de Deus e aquele que os não faz frutificar. O primeiro entrará na posse do reino dos céus, o segundo estará fora, nas trevas. O Mestre divino deixa claro que Deus, o doador de todas as graças, julgará o desempenho de cada um de acordo com suas capacidades. É que Ele nem superestima cada um, nem o subestima. Ele conhece bem as possibilidades dos que recebem suas dádivas as quais devem ser bem usufruídas. O senhor da parábola saiu para uma longa viagem e isto simboliza bem o aparente silêncio de Deus na vida dos seres racionais aos quais confia os seus bens. Ele não gerencia as vidas de suas criaturas, mas deposita nelas confiança e as faz, de certo modo, co-gestoras de sua criação. Daí a responsabilidade de cada um. Cumpre total seriedade em encarar a existência nesta terra, pois, um dia, haverá um acerto de contas. Deus, contudo, não espera que se ultrapassem os limites humanos e receberá no juízo final os grandes santos como também os que não atingiram, devido suas limitações, um grau maior de perfeição. Já nesta terra um herói é tão amado de Deus como um fiel simples, mas cuidadoso em cumprir os seus deveres. Deus exige de todos, isto sim, bondade, sinceridade e fidelidade. Ele não quer que o cristão se refugie em projeções de uma perfeição imaginária e impossível de ser alcançada. A pedagogia divina deseja que cada um faça o que estiver a seu alcance e isto sem indolência e numa luta corajosa contra qualquer desprezo dos mandamentos. Espera sempre o arrependimento das falhas cometidas e segurança total na sua misericórdia, aliada à fuga corajosa das ocasiões de pecado. O servo mau e preguiçoso da parábola é aquele que por negligência, mediocridade não desenvolve as qualidades recebidas e se torna infiel. Não é capaz de fazer o mínimo esforço para crescer espiritualmente e assim se torna um autêntico paralítico que não desenvolve o que recebeu de seu Senhor. Age levado pelo medo e, deste modo, não produz nada. Não tem a mínima consciência criadora do ser humano na história. Os outros servidores da Parábola agiram conforme a imagem do senhor que tinham em seu coração, ou seja, como alguém que era bom e fiel. Daí o esforço que fizeram para reduplicar os talentos recebidos. O servo preguiçoso tinha uma imagem bem triste do senhor e isto influenciou sua atitude. Esta o levou a enterrar o talento recebido. Portanto, a imagem que cada um tem de Deus, o doador de todos os bens, condiciona o modo como administra estes bens. São Gregório Magno acentua que ou se age por amor ou por medo. Os que estão impregnados de amor multiplicam os talentos e no dia do julgamento receberão ainda mais e os que agem pelo temor perderão até o mínimo que lhes fora dado. Eis porque esta Parábola é um alerta para que se esteja sempre vigilante, porque um dia se deverá dar conta da gestão do que se recebeu em vida da parte de Deus. Um fato é certo: o Senhor virá. Não sabemos, porém, quando ele chegará. Eis porque toda inércia deve ser combatida. Toda inação é logicamente indesculpável. A vida foi dada para que cada um desenvolva suas qualidades. Progresso espiritual, cultural e, até, material, eis a vocação do ser racional. O esforço faz parte da natureza humana. Ninguém pode tirar férias o ano inteiro, mas continuamente é preciso colaborar com a obra de Deus. Elisabeth Leseur advertiu: “Uma alma que se eleva, eleva o mundo inteiro”. O aprimoramento individual é importantíssimo para que haja mais bondade, santidade, progresso neste mundo. O inverso é também verdadeiro, ou seja, todo mal praticado ou todo bem que não é praticado torna o mundo pior. De todas estas considerações se deve concluir como é importante o aproveitamento contínuo do tempo. Compreender a própria temporalidade leva à multiplicação dos talentos, O tempo de vida que é dado a cada um deve ser o espelho no qual se vê a eternidade. Porque o tempo flui sem cessar, valorizar o momento presente é a atitude sábia de quem se prepara para o dia das contas com Deus. Eis porque o tempo tem em seu poder refletir a eternidade e nela uma recompensa no Reino de Deus ou o estar para sempre nas trevas. Portanto esta Parábola dos talentos convida a todos para examinar como tem vivido sua vida nesta trajetória terrena e o quanto então tem valorizado os dons recebidos de Deus. Muitas vezes a preocupação com o futuro leva à precipitação, a um ativismo precipitado. Muitas vezes se esquece que há um futuro além do futuro terreno que é a eternidade. Para ela vale render cinco por cinco, dois por dois talentos e não querer fazer mais do que se pode ou, o que seria pior, não fazer nada que se deveria fazer, tornando-se um servo inútil e infiel. Cumpre captar o valor do tempo, pois nele nos determinamos e somos determinados para obter a recompensa eterna.

    * Professor no Seminário de Mariana durante 40anos.