Na Semana do Clima da América Latina, Islândia recorda desaparecimento de geleira

No lugar do glaciar que degelou, foi colocada uma placa que pede um maior compromisso contra as mudanças climáticas. Na segunda-feira, 19, foi aberta a Semana do Clima da América Latina e Caribe, a primeira de uma série de cúpulas internacionais que culminarão com a realização da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, prevista para dezembro.

Marco Guerra – Cidade do Vaticano

Na Islândia foi colocada uma placa no sopé da montanha que continha a geleira Okjokull, que após 700 anos derreteu devido ao aquecimento global. “Este monumento testemunha que estamos cientes do que está acontecendo e do que precisa ser feito”, diz a inscrição na placa que foi inaugurada no domingo, 18, em uma cerimônia com a presença da primeira-ministra da Islândia, Katrin Jakobsdottir, da ex-presidente da Irlanda Mary Robinson e de ativistas ambientais.

A mensagem para as futuras gerações

Na placa há uma “Carta para o futuro”, escrita pelo autor islandês Andri Snaer Magnason.  No texto lê-se: “Ok, é a primeira geleira a perder seu status de geleira. Para os próximos 200 anos, prevê-se que todas as nossas principais geleiras terão o mesmo fim.”

A mensagem dirigida às gerações futuras termina com uma cifra: “415ppm CO2”, ou seja, 415 partes por milhão de dióxido de carbono, a quantidade crítica presente na atmosfera terrestre que determina um aumento global da temperatura.

Geleiras da Islândia podem desaparecer

De acordo com a ANSA, o inventário realizado no ano 2000 na Islândia, constatou a existência de 300 grandes e pequenas geleiras em toda a ilha. Em 2017, 56 delas já haviam sido perdidas.  E a situação não é melhor nos Alpes, que viu nos últimos cem anos a diminuição em 50% do tamanho das geleiras.

Semana do Clima da América Latina e Caribe

Chefes de governo e grandes expoentes da economia mundial serão chamados em breve para participar de uma série de cúpulas temáticas sobre o combate às mudanças climáticas. A primeira, em ordem cronológica, é a Semana do Clima da América Latina e do Caribe,  aberta na segunda-feira dia 19 em Salvador, e que se concluirá no dia 23.

Segue em Bangkok a Semana do Clima da Ásia-Pacífico, de 2 a 6 de setembro, e  em 23 de setembro em Nova York a cúpula sobre o clima que culminará com a Conferência das Nações Unidas sobre as mudanças climáticas, a ser realizada de 2 a 13 de dezembro no Chile.

As repercussões na biodiversidade

As mudanças climáticas também tem repercussões sobre a fauna e flora, o que coloca em risco a biodiversidade dos vários habitats terrestres.

A 18ª Conferência das partes da Convenção das Nações Unidas sobre o Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas de Extinção foi aberta em Genebra. Até 28 de agosto, representantes de cerca de 180 nações tratarão sobre a proteção de espécies vulneráveis e de questões como o comércio de marfim.

As medidas a serem adotadas visam tornar sustentável o comércio internacional de espécies selvagens e a combater o comércio ilegal. A União Europeia defende uma aplicação mais eficaz das regras em vigor.

Derretimento das geleiras é fenômeno global

“A desestabilização do Ártico é perigosa, afeta todo o clima global”: entrevistado pelo Vatican News, Fabio Trincardi, diretor do Departamento de Ciências do sistema terrestre da CNR, explica por que o derretimento das geleiras islandesas é um evento que revela o quanto é urgente a reconversão urgente de todo o sistema de desenvolvimento:

R. – Existem muitos sinais regionais, locais, que se fossem específicos somente de uma área restrita, poderiam dizer respeito apenas a um pequeno número de pesquisadores. O problema é que esses sinais são consistentes e generalizados em quase todas as geleiras da Terra. Quando James Cook chegou à Nova Zelândia, os dois glaciares do sul da Nova Zelândia chegavam ao mar; hoje eles se encontram a dezenas de quilômetros da costa, no interior da terra firme. Portanto, há uma retração generalizada de todas as geleiras das áreas temperadas. Este, no entanto, não é o único problema do sistema climático e do gelo terrestre: há a desestabilização da Groenlândia, da Antártida Central e a forte redução do gelo marinho no Ártico, destinado a desaparecer.

Essas mudanças climáticas são, portanto, atribuíveis à ação humana. Há um grande debate nesse sentido, tendo em vista que também ocorreram grandes mudanças climáticas no passado. O que o homem pode fazer para retardar essa ação?

R. – O que vemos hoje é em grande parte culpa do homem, que em uma única palavra deve “renunciar”. Nossa sociedade de consumo exasperado, com a idolatria do crescimento, pode funcionar somente se uma pequena parte do planeta seguir essa situação e a outra parte pagar o preço. Em mérito à primeira parte da sua pergunta: é verdade que o sistema climático sempre se transformou – é um sistema complexo – mas isso não significa que somos irrelevantes, antes pelo contrário! Pior ainda: estamos intervindo sobre um sistema que é complicado. Há um argumento que zera a questão: há núcleos no gelo que contam a história das últimas oito glaciações. Vê-se que há períodos “interglaciais”, como o que estamos vivenciando hoje, isto é, períodos quentes, em meio a dezenas de milhares de anos, que foram predominantemente frios. Os “interglaciais” que são semelhantes aos nossos, têm um conteúdo de CO2 nas bolhas de ar mantidas no gelo, que para em 280, às vezes chega a 300 partes por milhão. Estamos acima de 400 partes por milhão.

Para simplificar, podemos dizer que foi constatado que o aumento do carbono nas várias épocas corresponde a um aumento das temperaturas e a uma diminuição das geleiras. Portanto, se o nível de dióxido de carbono não for abaixado, não se poderá voltar atrás como temperatura?

R. – Exatamente. Esse é o nó principal da questão. Portanto, é preciso recultivar as florestas ou fazer projetos para “sequestrar” o CO2, e sobretudo, garantir que outras partes do sistema climático que estão neste equilíbrio não sejam desestabilizadas. Volto por um momento ao Ártico, porque é ali que as cartas são jogadas. É importante que eles coloquem essa placa na Islândia, porque estamos próximos ao Ártico. O jogo real é o seguinte: a redução do gelo marinho levará a uma diminuição na capacidade da Terra de refletir o calor para o espaço. Assim, o oceano absorve a radiação infravermelha e o gelo a reflete. Se não tivermos mais gelo, o preço que pagamos é mais aquecimento devido à absorção de calor pelo oceano. O outro elemento do Ártico extremamente perigoso, é a desestabilização do permafrost, o solo congelado que contém grandes volumes de metano. O derretimento do gelo do mar e o metano que está sendo liberado, são provavelmente os amplificadores da mudança climática, e no mínimo nos dizem quão urgente é uma reconversão de toda a nossa economia.

Precisamente nestes dias, realiza-se em Genebra a Cities, isto é, a Conferência sobre espécies ameaçadas de extinção. Obviamente, as mudanças climáticas também influenciam a biodiversidade …

R. – Sim, de várias maneiras. Influenciam diretamente a biodiversidade acabando com habitats. Quando queimamos florestas para depois cultivar, estamos destruindo ecossistemas inteiros que levam à extinção das florestas, com repercussões no clima. Depois, há outro aspecto. Por exemplo, no que diz respeito às espécies marinhas, existe o problema relacionado com a chamada fenologia, isto é, o momento em que uma espécie cresce, se desenvolve, se torna adulta. A mudança climática muda os momentos em que essas fases ocorrem. Em outras palavras, existem espécies que efetivamente começam a se desenvolver primeiro. Uma espécie que há algumas décadas era predada por um predador, agora se desenvolve antes de que seu próprio predador. Por exemplo, as medusas com o aquecimento global, são muito menos predadas do que antes, porque se desenvolvem mais cedo. Estamos convertendo o mar, de um mar de peixes em um mar de águas-vivas. Dizemos que há uma forte simplificação de todos os ecossistemas. Depois, há ainda outro problema: o das chamadas espécies invasoras, que são espécies que vêm de outros mares e que nós levamos para outros mares. O problema é que tudo isso está acontecendo globalmente em uma escala extremamente acelerada e em termos de grande perda de biodiversidade.

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