A sabedoria dos idosos

    Dom João Bosco Óliver de Faria

    Arcebispo Emérito de Diamantina

     

    Aproxima-se o mês de julho e nele a festa de São Joaquim e Sant`Ana, no dia 26. Esse mês é uma bela oportunidade para uma reflexão a respeito dos nossos  velhinhos, do Vovô e da Vovó.

     

    Tomemos a Palavra de Deus que é nossa fonte de inspiração. Lemos no livro do Êxodo: Honra o teu pai e a tua mãe, para que vivas longos anos na terra que o Senhor, Teu Deus, te dará (20,12).

    No livro do Eclesiástico, encontramos estas lindas palavras: Os discípulos da Sabedoria são uma assembleia de justos e a sua comunidade é marcada pela obediência e o amor.  Ouvi, ó filhos, a advertência de um pai, e procedei de tal modo que sejais salvos. Deus honra o pai nos filhos e confirma sobre eles a autoridade da mãe (3, 1 – 3).

                   Quem honra seu pai intercederá pelos pecados, evitará cair neles e será ouvido na oração quotidiana. Quem respeita sua mãe é como alguém que ajunta tesouros. Quem honra seu pai terá alegria em seus próprios filhos; e, no dia em que orar, será atendido. Quem honra seu pai terá vida longa, e quem obedece ao pai é o consolo da mãe (3, 4 – 7).

                   Quem teme o Senhor honra seus pais e como a senhores servirá aos que o geraram. Com obras e palavras honra teu pai, para que dele venha sobre ti a bênção. A bênção do pai consolida a casa dos filhos, mas a maldição da mãe destrói até os alicerces. […] Filho, ampara a velhice de teu pai e não lhe causes desgosto enquanto vive (3, 8 – 11 e 14).

                   Mesmo que esteja perdendo a lucidez, sê tolerante com ele e não o humilhes em nenhum dos dias de sua vida. A ajuda prestada a seu pai não será esquecida, mas será plantada em lugar dos teus pecados e contada como justiça para ti; no dia da aflição, serás lembrado e teus pecados se dissolverão como gelo em dia de sol (3, 15 – 17).

                   Como é infame quem desampara seu pai, e é amaldiçoado por Deus quem exaspera sua mãe! (3, 18)

     

    São Paulo nos escreve, na Primeira Carta a Timóteo: A um mais velho não repreendas, mas aconselha como a um pai; aos mais moços, como a irmãos, às idosas, como a mães; às mais jovens, como a tuas irmãs, com toda a castidade (5,  1 – 2).

     

                   Honra as viúvas – as que o são propriamente. Mas se uma viúva tem filhos ou netos que estes aprendam, primeiro, a praticar a piedade para com seus próprios familiares e, portanto, aprendam a retribuir aos pais o que deles receberam. Isto é agradável a Deus (5, 3 – 4) .

     

     

    No dia 28 de setembro de 2014, aconteceu, em Roma, a Jornada dos Idosos. Foi lido o trecho da visita de Maria a sua prima Isabel. Comentou o Papa Francisco: Maria é jovem. Isabel é idosa, mas manifestou-se nela a misericórdia de Deus e há seis meses que ela e o marido Zacarias estão à espera de um filho. Maria, também, nesta circunstância nos indica o caminho: ir encontrar a parente Isabel, estar com ela naturalmente para ajudar, mas também e, sobretudo, para aprender com ela  que é idosa, a sabedoria da vida.

     

    […] às vezes há gerações de jovens que, por complexas razões históricas e culturais, vivem de forma mais intensa a necessidade de se tornar autônomos dos pais, a necessidade quase de < libertar-se > do legado da geração anterior. Parece um momento de adolescência rebelde. Mas, se depois não se recupera o encontro, se não se volta a encontrar um equilíbrio novo, fecundo entre as gerações, o resultado é um grave empobrecimento para o povo, e a liberdade que prevalece na sociedade é uma liberdade falsa, que se transforma quase sempre em autoritarismo.

     

    […] A sabedoria de Isabel e de Zacarias enriqueceu o seu espírito jovem; não eram especialistas em maternidade e de paternidade, porque para eles também era a primeira gravidez, mas eram especialistas da fé, especialistas de Deus, especialistas da esperança que vem d`Ele: é disso que o mundo tem necessidade, em todo o tempo. Maria soube ouvir aqueles pais idosos e cheios de enlevo, aprendeu com a sabedoria deles, e esta revelou-se preciosa para Ela, no seu caminho de mulher, de esposa, de mãe.

     

    Uma pessoa de idade sofre, em geral, cinco dificuldades.

     

    A primeira é a limitação. Gostaria de trabalhar, de fazer as coisas, de ajudar os outros, mas a saúde ou a idade não favorecem e ela fica triste por isso. Há o risco da pessoa se sentir inútil.

    Li que em uma cidade, pediram a uma senhora idosa, que se sentia desvalorizada, sem nada poder fazer, para que ela, por telefone, lembrasse às pessoas de um determinado clube ou associação o dia e a hora de suas reuniões. Ela era uma pessoa de conversa agradável no seu jeitinho de falar e, com seus telefonemas, foi criando muitas e novas amizades e tornando-se conhecida de tantas e tantas pessoas que tinham, também, o carinho de ir visitá-la. Com aquele serviço a vida dela mudou. Ficou alegre e feliz com aquele novo relacionamento.

    Uma das limitações é a de não poder sair de casa para visitar pessoas amigas ou para um passeio. A família é que tem que se antecipar e proporcionar as oportunidades para esse tipo de lazer.

    Minha mãezinha morreu aos 92 anos. Ela gostava muito de viajar. Eu brincava com ela que quando ela estivesse bem mal para morrer que eu iria chegar um vidrinho de gasolina para ela cheirar e que ela sem abrir os olhos iria perguntar: Para onde que vocês vão? E que ela iria melhorar no ato. Fiz lindos e bons passeios com ela e com papai. Foi muito bom e isso hoje me deixa feliz.

     

    Outra dificuldade é a solidão. A correria da vida, os trabalhos de cada um levam as pessoas de idade a permanecerem um pouco isoladas na própria casa, sem ter com quem conversar. As pessoas de idade gostam de lembrar os acontecimentos da própria vida e de contar muitas histórias bonitas que lhe aconteceram. A TV pode ajudar a ocupar o tempo, mas o que lhes agrada é o encontro com pessoas, participar dos acontecimentos e poder expressar seus sentimentos.

    Recordo-me que visitando um senhor doente, ao lhe dizer as notícias de seu interesse, a cada momento ele repetia: mais, mais! Como ficava feliz ao poder saber e partilhar das coisas da vida e do seu antigo trabalho.

    É bonito quando a família e os vizinhos sabem dar valor aos seus velhinhos, buscando sua presença, aproveitando o tempo para aprender com eles as suas longas e interessantes experiências de vida!

    Em algumas paróquias, há um costume de, aos domingos (ou de quinze em quinze dias), ali pelas 14h, promover, em um salão, um encontro com as pessoas de idade. Colocam som, com volume suave, ou música ao vivo – pessoas que tocam e cantam para elas – servem um chá, chocolate ou refresco. Levam para elas bolos e biscoitos. A equipe organizadora se encarrega de encomendar aos paroquianos esses agrados a serem oferecidos. Rifam, também, pequenas utilidades domésticas que são oferecidas pelos paroquianos. Não falta, ainda, outra equipe que vai buscar de carro aquelas pessoas que não têm quem as leve. O encontro dura uma hora e meia, para evitar um cansaço para as pessoas de idade.

    Em outra paróquia, o grupo de jovens programa as visitas durante a semana às pessoas de idade ou que estão acamadas. Cada semana aquelas pessoas experimentam a alegria da visita dos jovens.

     

    A terceira dificuldade que uma pessoa de idade pode passar é a de sofrer a  falta de algo necessário para o seu bem-estar e, por vergonha, não ter coragem de pedir.

    É necessária uma atenção mais cuidadosa no que respeita a saúde, tratamento e remédios.

    A caridade deve começar em casa. As pessoas da família, com sensibilidade, podem se antecipar e providenciar para que nada falte aos seus velhinhos.

     

    Poderíamos falar ainda da incompreensão das mais diversas formas que as pessoas de mais idade sofrem. Elas têm uma grande experiência de vida e nem sempre são valorizadas! A perda parcial da audição traz muito sofrimento para quem a experimenta.

     

    Talvez, um quinto sofrimento seria o da ingratidão que recebem e que é o pano de fundo dos seus outros sofrimentos.

    É muito triste depois de tantos anos de trabalho, sacrificando-se pelos outros, a pessoa sentir-se esquecida pelos parentes, pelos amigos e pela comunidade. Em algum lugar do Brasil, visitei, uma vez, um leprosário. Fui ao quarto de cada um. Dei a mão e conversei com todos. No último quarto, encontrei uma senhora de idade e sua filha adulta. As duas estavam doentes. Com muita mágoa no coração, disse-me aquela senhora:  – Nós estamos aqui há três anos. Nossa família mora perto e nunca ninguém veio nos visitar. Eu fiquei muito triste por ver tanto sofrimento: o sofrimento físico da  doença e o do abandono pelos parentes e amigos.

    A ingratidão dói fundo! Desse sofrimento até o próprio Jesus se queixou ao aparecer a Santa Margarida Maria Alacoque, mostrando Seu coração em chamas e coroado de espinhos, dizendo: Eis o coração que tanto amou os homens e por eles é tão ingratamente correspondido.

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