A graça da volta

    Dá voltas, também. O privilégio do menino pródigo, por sua experiência de amor e misericórdia, o tornou um menino prodígio. Só quem vive em profundidade uma experiência de retorno às graças paternais está apto a testemunhar com fidelidade a grandeza dessa experiência. Não só pelo inusitado do perdão que não espera ou acha indigno de receber, como também pela alegria do retorno, cujas graças não cabem em simples palavras, mas na amplitude de um coração remido, redimido por amor. A graça da volta é envolvente, dá voltas inesperadas para salientar o perdão num abraço apenas.

    As voltas que o mundo dá, os dias, o tempo, as distâncias que separam… Nada disso importa a um pai paciente, generoso, compreensivo e compassivo, capaz de dias, meses, anos de espera a olhar a estrada vazia e sinuosa que lhe roubou um filho, uma filha… Não importa! Voltará um dia e será um momento de festa, só compreendido e ansiosamente esperado por quem sabe compreender e esperar um gesto de gratidão filial. Um pai verdadeiro sabe disso, espera por isso… Um Pai criador, mais ainda!

    Mas o que esperar dos filhos triturados pela indiferença e incompreensão da cegueira e das ilusões, das feridas de batalhas incertas, das conquistas momentâneas que o tempo engoliu, das glórias e venturas que a sociedade tornou insaciável, intragável pelo mofo das noites mal dormidas, das aspirações de poder que a realidade apagou, de todas as frustrações que a vida lhes jogou na cara? Só mesmo misericórdia e perdão. Só a compaixão de um Pai Amoroso!

    Essa troca não tem troco. Coloca num mesmo patamar irmãos de sangue, mais velhos ou mais novos, cautelosos ou esbanjadores, comportados ou dissimulados… todos, aos olhos do pai, são lhe caros e preciosos, tem suas diferenças, mas se igualam no meticuloso plano de Amor que seu coração lhes dispensa. E os dispersa com igual carinho e meticulosa atenção. Basta a cada um o seu quilate de amor, a sua compreensão, o incentivo de vencer os desafios que a vida – sempre ela – apresenta a qualquer vivente. Exige apenas tolerância, compreensão, apoio mútuo.

    Esse é um dos grandes segredos da misericórdia divina: não faz distinção entre os filhos. Congrega a todos, ao que foge e volta humilhado e ao que reage indignado diante da fraqueza do rebelde. Não basta acolher quem negligencia as graças da casa paterna. É preciso, igualmente, colocar o coração do filho fiel em igualdade de disposição para o amor, o perdão e o acolhimento que o pai bem exemplifica. Talvez seja esta uma das maiores lições que Jesus nos ensina em sua mais generosa parábola: Para bem acolher um irmão é preciso eliminar o ciúme. De nada adiantará a misericórdia do Pai se nossa intolerância for maior que a graça. Atente para isso, povo de Deus! O perdão do Pai não basta, quando em família a incompreensão e o egoísmo barram nosso conceito de fraternidade e nosso espírito de caridade cristã.

    Quando o assunto é reconciliação e perdão, Deus não age sozinho. Conta conosco. Se faz um com a comunidade de fé. É nela que se reproduz a justiça do amor de Deus. É na Igreja que a verdadeira paz, o amor vivo da misericórdia e a porta do perdão se abrem para o abraço da reconciliação entre o céu e a terra; aqui a vida conflituosa de nossas limitações e a graça generosa da bondade de Deus se encontram… e se completam.  Nesta história temos responsabilidades também.

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