A gigante da Bahia

    Corpo franzino, com pouco mais de um metro e meio de altura, pesando em média quarenta quilos, a pequenina Maria Rita Lopes Pontes se tornou a primeira mulher brasileira a galgar os altares das devoções católicas, com direito a ser cultuada e venerada como santa. Neste último treze de maio (data significativa), o Papa Francisco reconheceu um segundo milagre de Maria Rita, a gigante irmã Dulce da Bahia. O milagre, uma cura instantânea da cegueira de um homem cujo nome permanece no anonimato, restaura também a cegueira social daqueles que ainda hesitavam em enxergar nas obras da irmã o gigantismo da ação de Deus entre os pequeninos.

    Basta dizer que a entidade fundada por Dulce nasceu dum galinheiro improvisado. Ocupando esse espaço, a pequenina irmãzinha deu inicio à maior obra social do Brasil, que hoje tornou-se um complexo hospitalar com serviço gratuito capaz de atender 3,5 milhões de pessoas por ano. Um dia lhe perguntaram: se você morrer, quem vai continuar seu trabalho? Sem pestanejar, irmã Dulce respondeu: “É uma questão de fé. Tendo fé em Deus eu não me preocupo com o dia de amanhã. A obra é de Deus e Ele certamente saberá o que fazer”. Fé pura e genuína. Afinal, quem esteve no comando de suas ações, durante toda sua vida, foi Deus. Continuará sendo Ele, nos disse Dulce.

    A docilidade de seu nome não veio por acaso. Filha de um casal exemplar, ele dentista e ela doméstica, a menina Rita perdeu sua mãe aos sete anos. Imaginem a dor dessa criança. Mas da mãe herdou não só a fé, como também o nome que escolheu quando dos votos religiosos. Dulce era a mãe. Dulce tornou-se a mãe dos pobres, a doçura em pessoa que as ruas de Salvador viram nascer e crescer de forma espontânea e miraculosa, pois sua aparente fragilidade enganava a todos com a fortaleza de uma fé sem limites.

    Basta dizer que irmã Dulce não tinha um dos pulmões. O outro tinha uma capacidade respiratória de apenas 35 por cento. Dormia sentada numa espreguiçadeira, no máximo durante quatro horas. Não se deitava, pois poderia morrer asfixiada, já que a falta de ar era lhe uma ameaça constante. Quando questionada pelo médico como tinha passado a noite, respondia sorrindo: “Passei na boate, doutor”. Para quem não sabe, “boate” é o nome irônico que se dá ao aparelho de oxigênio. Pureza e simplicidade própria dos santos! Madre Olívia, que conviveu com a religiosa, bem resumiu sua personalidade: “Era alegre, simples, de muita fé, coragem e entusiasmo pelo bem ao próximo. Todo mundo queria ficar junto dela, parece que a força dela puxava a gente. Eu sentia isso bem” (FSP).

    Santa Dulce dos pobres! Temos agora a quem recorrer nos momentos de carências, tanto materiais quanto espirituais. Sua entronização aos altares da Igreja Católica apenas confirma a elevação que o povo lhe deu em vida, quando sua santidade já era reconhecida por todos. Não é um fato corriqueiro, mas justo e eficaz. Um processo de beatificação leva anos, às vezes séculos. No caso de Dulce, foi o terceiro mais rápido da história, apenas 27 anos. Antes dela, veio o caso de Madre Teresa de Calcutá (19 anos) e João Paulo II, canonizado 9 anos após sua morte.

    Agora nos resta a grand finale, o momento em que será oficialmente marcada sua canonização. Um título apenas. Mas um momento ímpar para o povo da Bahia e para nós brasileiros, que sempre nos perguntamos o que que a baiana tem. Além da fibra, da garra pela vida, da alegria que lhe é própria e da extremada fé que seus cultos e ritos nos mostram, a mulher baiana tem também o rosto santo de uma brasileira nata. A bênção, santa Dulce!

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