A escolha que fazemos

    Uma cena corriqueira do passado me salta aos olhos agora: mamãe, num canto de mesa, escolhendo pacientemente as sementes de arroz ou feijão antes de levá-las ao fogo. Às vezes, também eu me arriscava nessa tarefa. Mas a supervisão do trabalho competia a ela. Escolher as sementes apropriadas ao consumo da família era um ritual diário, quase sagrado!

    Cresci e fui obrigado a fazer minhas próprias escolhas. E longe da supervisão maternal. Aos poucos, aprendi que uma vida saudável depende das escolhas que fazemos. Ou, como nos ensina a Palavra: depende da separação criteriosa do joio no meio do trigo. Isso nós somos obrigados a fazer diuturnamente, se quisermos crescer numa vida saudável, eliminando tudo de nocivo para nosso consumo, alimentando-nos sempre com o que de melhor a natureza nos preparou. É uma questão de sobrevivência. “O estomago recebe toda a espécie de alimentos, mas entre os alimentos um é melhor do que o outro” (Ecle 36,20). A vida nos oferece todo tipo de prazeres, mas, dentre eles só aquele purificado pelo amor é apropriado.

    Não fiquemos apenas com o arroz e o feijão, o trivial. Dentre as escolhas que fazemos, muitas são questões de vida ou morte. Requerem presença de espírito e a graça do discernimento. Tudo que constrói nossa existência, tanto no plano biológico quanto no plano espiritual, depende das escolhas que fizermos. Assim como a má alimentação, drogas e vícios deixam suas marcas no tecido físico, limitando a saúde e trazendo precocemente a morte, assim também nossa alma estará sujeita aos critérios que usamos para preservar sua vitalidade. “Meu filho, experimenta tua alma durante tua vida… Nunca sejas guloso em banquete algum, não te lances sobre tudo o que se serve” (Ecle 37,30;32).  O bom senso dita as regras e a consciência aponta sempre o melhor proceder, a melhor escolha.

    Alimentamo-nos das nossas escolhas. Se boa ou ruim, as consequências virão. Por isso a idade adulta nos dá sempre a responsabilidade de arcar com o peso de nossas decisões. Nunca atribuí-las a outros. Assumir uma responsabilidade é tomar para si também eventuais fracassos e não apenas os louros de uma conquista, uma vitória sem derrotados, sem vencidos. Toda vitória está associada a uma derrota. Toda conquista a um fracasso anterior. Essa é a lei da natureza, da vida, pois vencê-la exige o esforço da superação e superar nada mais é do que ultrapassar, galgar, deixar pra trás, olhar em frente, não perder a meta, o rumo, o ideal… Uma vida sem ideal não é vida. Quem assim conduz sua existência não chega a lugar algum, está morto e esqueceram de velar. Porque, mesmo a morte exige uma escolha nossa: plenitude ou não.

    O princípio da sabedoria humana é a percepção desses dois caminhos. Por isso a fé, nossa crença na possibilidade de escolha, nas opções entre o bem e o mal, o certo e o errado, o que é saudável para o corpo e o que corrói nossa alma, isso tudo é a grande riqueza da vida cristã. Isso tudo nos ensina a mãe-Igreja, a paciente serviçal que alimenta nossa fé diariamente, que nos prepara um banquete, que nos ensina a fazer escolhas. Nunca se envergonhe desse direito que temos de escolher nossos próprios caminhos. Outros não o farão por nós. Mas, nas decisões que tomamos, uma verdade permanece na vida dos que ainda acreditam em Deus: “Não fostes vós que me escolhestes, mas fui eu que vos escolhi primeiro”.  Dessa verdade nasce o conforto para nossas mais radicais decisões e a certeza de um caminho certo. Ainda bem que é assim. Porque a pedra que os construtores rejeitaram, tornou-se a pedra angular, a principal na obra de Deus… O que era imprestável aos olhos humanos, para Deus era o que de mais precioso tinha a nos oferecer: seu Filho, sua Vida. E muitos construtores da sabedoria humana ainda o rejeitam!

     

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